O cérebro procura o que lhe é familiar, seja isso bom ou mau.
Um estudo publicado no Scientific Reports, levado a cabo por investigadores da University of New South Wales, Austrália, aponta para que as escolhas que fazemos – das mais corriqueiras às que exigem maior ponderação – estão condicionadas por actividades cerebrais pré-existentes. Quer isto dizer que o nosso cérebro já escolheu, antes mesmo que tenhamos consciência disso, mais concretamente cerca de 11 segundos antes da tomada de consciência acontecer.
Joel Pearson, professor de Psicologia nesta Universidade, diz-se – enquanto cientista – interessado tanto pelas provas como pelas possibilidades e afirma que as perguntas assumem um carácter mais premente que as eventuais respostas. Explica que a nossa capacidade de fazermos escolhas de forma consciente está localizada nas áreas executivas do cérebro – onde ocorre o processo de tomada de decisão consciente – e aí se encontram também as estruturas visuais e subcorticais, o lugar onde o pensamento se forma.
Enquanto ponderamos sobre algo para tomar uma decisão, as tais zonas executivas escolhem o pensamento, por ser mais forte. Posto de outra forma, segundo Pearson, o cérebro tende a seguir um padrão devido à actividade cerebral pré-existente, embora o estudo não possa garantir que este processo ocorra com todas as nossas escolhas.
O poder subjectivo de pensamentos futuros está também condicionado por actividade alojada no córtex visual primário, a área do cérebro responsável pela captação de informação visual do mundo exterior, tendo assim uma grande influência nas escolhas que fazemos.
Aquilo que pensamos sobre nós mesmos, o respeito que temos, ou não, por nós, o cuidado que temos, ou não, connosco, o facto de nos valorizarmos ou não, encontra – na maioria dos casos – resposta no período da infância.
Tenham sido pais, avós, tios, ou outras pessoas, o grau de parentesco nem sempre diz muito sobre a proximidade, como se sabe e por vezes, até nem diz nada. Uma criança que cresça no seio de uma família equilibrada emocionalmente, onde há lugar ao diálogo, à manifestação de afectos, ao respeito, à empatia, a regras que são estabelecidas mas devidamente explicadas tendo por base a idade da criança, à partida, tornar-se-á num adulto capaz de dialogar, de defender os seus pontos de vista sem o recurso à violência, à imposição, à chantagem psicológica, bem como será capaz de manifestar afecto perfeitamente consciente de que não constitui uma fraqueza, antes pelo contrário. Será um indivíduo capaz de ouvir, respeitar e procurar entender os outros
ainda que discorde deles.
Claro que existem pessoas que mesmo criadas com estes valores por base, não os adoptam na sua vida adulta e é por isto que digo que muitas vezes bebemos de influências fora de portas; por uma questão de aceitação por exemplo, o que acontece muito na adolescência devido à necessidade do sentimento de pertença e inserção social.
Por outro lado, uma criança que cresça num ambiente hostil, rodeada de gritos ou de silêncios que ignoram a sua presença, de críticas destrutivas, de humilhações e muitas vezes agressões, tem fortes probabilidades de vir a adoptar o mesmo padrão comportamental. E porquê? O nosso cérebro é como uma folha em branco quando nascemos. Essa folha vai sendo escrita pelas experiências e pessoas que nos acontecem e um cérebro jovem absorve muito mais e mais depressa.
Outro dos motivos é que uma das primeiras formas de aprendizagem das crianças é por imitação. Qual é o pai/mãe que ainda não teve o seu petiz a apontar-lhe um dedo rechonchudo enquanto repete expressões que ouviu algures?
Enquanto adultos, somos os maiores responsáveis por aquilo que estas esponjas vão absorver e isto vale para o bom e o mau.
Crianças cuja infância tenha sido marcada por cenas de violência, entre os cuidadores ou para com os próprios menores, que tenham testemunhado o consumo de álcool, drogas e que tenham sido negligenciadas sob que forma for – sendo que nem sempre isso inclui violência física – terão uma maior propensão para perpetuar esse comportamento e isto acontece de duas formas: futura submissão a um parceiro/a que a irá negligenciar ou imitação do comportamento que absorveu durante o seu crescimento.
Tal ocorre porque é o exemplo que lhes foi dado e ainda que, num plano consciente, na grande maioria dos casos, estes indivíduos não concordem com os comportamentos mencionados e até os reneguem, o seu cérebro tende a escolher aquilo que lhes é familiar.
Tenham sido boas ou más experiências, o cérebro tende a buscar padrões, porque é a sua zona de conforto, aquilo que conhece, por mais distorcido que possa parecer, o seu lugar seguro, ainda que o mais perigoso de todos.
Não é por acaso que a maioria de nós, mulheres, tende a procurar, ainda que de forma inconsciente, homens com características dos nossos pais e o mesmo acontece com os homens em relação a mulheres que partilhem características das mães.
A forma como tratamos os nossos filhos é a maneira como vão sempre sentir que merecem ser tratados e é isso que a sua mente vai procurar na vida adulta.
Crianças que cresçam num contexto de negligência, tendem a transformar-se em adultos com uma autoestima muito baixa, para quem o amor é algo condicionado por atitudes que agradem aos outros. Isto porque estão formatadas para pensar que não são dignas de receber amor e que o amor é, muitas vezes, agressivo, e mais, que a culpa é sua, porque provavelmente foi-lhes dito isso lá atrás. São também pessoas que vivem numa busca constante pela aprovação do outro, porque em crianças foi-lhes incutido que não eram suficientes.
É extremamente difícil e leva anos a mudar o chip destas crenças limitantes e os profissionais de saúde mental têm um papel fundamental na identificação da origem destes padrões, bem como no moroso processo de desconstrução dos mesmos, para que novos possam ser criados. Para que a criança seja quem é e não quem lhe disseram ser.
Porque quando as crianças são maltratadas, não é de quem as maltrata que não vão gostar, é de si mesmas.
Por Cláudia Cecílio
Tradutora