1. Há uma coisa em que Donald Trump estava cheio de razão: o vírus que devasta o planeta é chinês. Lá nisso, fosse autocrata, doido ou não, Trump não embarcava em nomes mais ou menos técnicos como SARS-CoV-2, covid-19 ou novo coronavírus. É essa comunicação assética que depois estigmatiza os países onde surgiram mutações, transferindo um anátema que não sucede com a China. Fala-se e noticia-se sobre as variantes brasileira (o que prejudicou logo Portugal nos voos para a Europa), sul-africana e inglesa. São variantes, é verdade! Mas do vírus chinês! C.H.I.N.Ê.S!!!!!
2. Cumpriu-se a demissão de Francisco Ramos da liderança da task force de vacinação solicitada aqui na semana passada. Está agora o vice-almirante Gouveia e Melo à frente da operação, da qual era o número dois, tendo, portanto, corresponsabilidades num processo cheio de falhas. É essencial que as corrija e dê conta pública, regularmente e não apenas pontualmente, da evolução da campanha, da logística, dos critérios, das falhas, das listas de prioridades definidas e das infrações detetadas e comunicadas a quem de direito. Não se pode passar de uma comunicação permanente e massacrante para um mutismo completo, como se está a ver, por exemplo, relativamente a Graça Freitas, que parece ter sido amordaçada e trancada num armário.
3. Lia-se o seguinte num documento do Governo de Portugal, lavrado em Lisboa a 21/07/20 e publicado na net pelas 9h45 dessa terça-feira: “A Visão Estratégica para o Plano de Recuperação Económica de Portugal 2020-2030, elaborada pelo Professor António Costa Silva, constitui um documento enquadrador das opções e prioridades que deverão nortear a recuperação dos efeitos económicos adversos causados pela atual pandemia”. Belas e insuperáveis palavras! Não propriamente as de Costa Silva, a quem se reconhece o mérito de ter feito pro bono um plano, mesmo que, pontualmente, pareça um catálogo de opções. O que vem ao caso agora é saber em que ponto de execução estamos. Quem o dirige? Quem o aplica? Ou em que gaveta burocrática jaz? Será que lhe vai acontecer o mesmo que ao celebrado Relatório Porter, que está esquecido no gigantesco arquivo morto do Estado português?
4. Francisco Rodrigues dos Santos sobreviveu a um assalto ao CDS, promovido por Adolfo Mesquita Nunes. Depois de muitos gritos e apitos, sobretudo sobre a forma de votar, Mesquita perdeu e prometeu participar nas autárquicas disciplinadamente. Os analistas dividem-se sobre quem ganhou e quem perdeu, mas a verdade é que as ondas de choque do fim de semana perduram. O CDS já não é propriamente um castelo estratégico, é mais um T1 bem situado, com vista para o poder, ao qual só pode aceder através do PSD se o Chega de Ventura ou a Iniciativa Liberal não crescerem. O próximo episódio melodramático da luta interna está, obviamente, previsto para o pós-autárquicas, tal como, eventualmente no PSD. Só que, enquanto nos sociais-democratas há duas figuras que parecem mais interessadas em espreitar o lugar de Rio (Passos e Rangel), no CDS há muitos mais. Ele é Cecília, ele é Adolfo, ele é D’Ávila, ele é Melo, ele é Telmo, ele é Monteiro versão comeback, mas também João Almeida e mais uns quantos. São muitos para tão poucos eleitores e militantes. Se o partido durar mais uns anos, calhará a vez a todos numa espécie de rotatividade, o que deveria acalmar os ânimos. Alguns dos seus mais bem-sucedidos militantes (Lobo Xavier, Nobre Guedes, Pires de Lima, Paulo Portas e o patriarca Adriano Moreira) bem poderiam fazer um esforço coletivo para redinamizar o partido e evitar o colapso. É estranho um partido fundador da democracia dar-se à morte assim. Faz lembrar as baleias e golfinhos que misteriosamente se suicidam coletivamente atirando-se para as praias.
5. Nas hostes sociais-democratas, o tempo político não é a pandemia. Essa é matéria para o Parlamento e para umas declarações pontuais com críticas não disruptivas. O PSD, salvo Batista Leite, aceita a estratégia do Governo com reparos de forma. Sob o manto do “é melhor não juntar uma crise política à pandemia e ao descalabro económico”, o país vai soçobrando ao desnorte de um Governo que, por junto, conta com um primeiro-ministro resiliente e hábil, rodeado de muitas nulidades. A demissão da oposição ficou mais patente com o fim dos debates quinzenais. É, consequentemente, em termos autárquicos que no PSD se terçam armas. Há gente a posicionar-se em todo o lado, menos no Porto e em Lisboa. No Porto porque, se a justiça não o assassinar, Rui Moreira ganha tranquilamente. Em Lisboa, porque não se destaca um candidato óbvio, como Santana Lopes, mesmo na qualidade de independente. Assim sendo, era patriótico ver alguns mostrarem disponibilidade para dar o peito aos votos. Nuno Morais Sarmento, por exemplo, daria um excelente candidato na capital. É, na prática, o número dois ou três do PSD. É ele que salta para as televisões em momentos de grande aperto para o líder. É ele que define parte das estratégias. É lisboeta. É bem visto pelo CDS e por toda a direita, da chique à cacique. Já provou ser capaz de fazer reformas. Tem vida autónoma em relação à política. É um peso pesado que ajudaria muito Rui Rio e o PSD se, finalmente, aparecesse num combate eleitoral fundamental para o partido, e não num congresso à hora do telejornal. Claro que há outros nomes para Lisboa, como Poiares Maduro. Mas, além de ter eventuais limitações contratuais resultantes da sua atividade de docente, é uma figura desconhecida (por muito que a televisão pública se esforce) e cuja passagem pela vida governativa só acrescentou imbróglios em setores que tutelou. No futebol em geral e no seu Sporting também não há nota de contributos positivos. O dossiê autárquico, sobretudo na grande área urbana de Lisboa, é crucial para o PSD. Consta que uma das figuras inspiradoras da estratégia é Isaltino Morais, o que é uma garantia de assertividade pragmática. Por muito que alguns não gostem dele, é um vencedor e um grande autarca.
Escreve à quarta-feira