Aventais há muitos…

Aventais há muitos…


Está na hora de entender que na utilidade está a perfeição. A coisa é perfeita quando cumpre a função para a qual foi concebida.


O avental é uma peça de vestuário cuja tradição remonta aos tempos antigos. De grande utilidade para homens e mulheres, pode ser feito de pele, tecido ou outro material qualquer, desde que seja maleável.

Quando abordamos alguém que está a usar avental pedimos desculpa, supondo estar a interromper o seu trabalho.

Não nos passeamos na rua de avental; não recorremos ao avental como adereço para uma festa, porque na sua natureza está a utilidade de servir de proteção para quem trabalha e opera diretamente com as próprias mãos, correndo o risco de se sujar ou magoar.

Envolvidas na ideia de avental recordamos as nossas mães, tias ou avós… recordamos a infância. Ver a avó de avental era sinal de que estava ocupada com os seus afazeres. O mesmo avental que lhe servia para colher as maçãs no regaço e levá-las até à mesa servia-lhe de pega quando a panela estava quente e servia-lhe igualmente para secar as mãos antes de abraçar. Por incrível que pareça, bastava-lhe tirá-lo e, depois de ajeitar o cabelo, estava “arranjada” para sair de casa. O avental era mágico: podia desaparecer num piscar de olhos ou fazer desaparecer alguma lágrima perante uma presença inesperada. Servia para sacudir o pó e ainda escondia pequenos objetos como se fosse o manto da invisibilidade. Contudo, provavelmente não nos recordamos das nódoas de cada avental mesmo depois de nele terem sido transportados lenha, legumes ou cascas de fruta. Servindo para sujar, a verdade é que a avó o mantinha sempre limpo e imaculado. Para muitas avós, o avental era uma extensão de si, era sinal de identidade e, por isso, tinham orgulho nele do mesmo modo que tinham orgulho em tudo o que faziam.

Enquanto crianças, sempre que tentávamos usá-lo, achávamo-lo muito comprido e largo, mas, por isso mesmo, o avental fazia-nos sentir adultos e responsáveis. Hoje somos nós os adultos, mas pouco ligamos aos aventais. Vendem-se por aí alguns exemplares cuja natureza é meramente decorativa, não oferecendo, por exemplo, segurança nem funcionalidade, frutos de uma sociedade plástica, fútil e superficial que já não valoriza a essência do trabalho.

Neste ponto reside o fundamental que a todos aproxima – a possibilidade de transformar o mundo através das nossas próprias mãos. Não importa que seja usado por um homem ou por uma mulher, importa a sua eficácia. Está na hora de entender que na utilidade está a perfeição. A coisa é perfeita quando cumpre a função para a qual foi concebida e, por isso, sim, devemos procurar a perfeição em todos os passos que damos acolhendo a palavra – sede perfeitos como o vosso Pai celeste o é.

Deste modo, um dia mais tarde, quando os que estão para vir vierem a recordar-se dos aventais, talvez se recordem de nós, com o mesmo amor e ternura com que nos recordamos dos nossos que, por nos terem sido úteis, foram perfeitos.

 

Professor e investigador