A construção civil em Portugal viveu os últimos dois meses e meio a ritmos diferentes: se, por um lado, as obras em curso nunca foram suspensas, por outro, os processos de licenciamento de novas obras de construção e reabilitação de edifícios habitacionais tiveram uma significativa redução – uma quebra de 5,6% no primeiro trimestre de 2020, face ao mesmo período do ano passado, para a qual contribuiu a descida homóloga de 19,2% em março (mês em que teve início o estado de emergência).
À falta de novos projetos, o impacto foi sentido sobretudo nos gabinetes de projeto. Arquitetos e engenheiros viram, neste período, o mercado contrair-se como não acontecia desde a crise de 2008 (e que se arrastou em busca da retoma até, pelo menos, 2015).
Contactado pelo i, o presidente da Ordem dos Arquitetos, José Manuel Pedreirinho, admite que recebeu, “desde o início do confinamento, várias queixas de membros [da ordem] por causa de processos que, na falta de diálogo com os técnicos das autarquias, tinham sido recusados” pelas câmaras municipais. “Chamámos, nessa altura, a atenção de todos os municípios do país e da Associação Nacional de Municípios”, diz. A partir daí, garante, várias situações pendentes foram resolvidas em diversas regiões do país.
Embora seja inegável o impacto da pandemia para o setor, José Manuel Pedreirinho acredita que se poderá aprender e até tirar benefícios para o futuro com a crise. O presidente da Ordem dos Arquitetos adianta que “haverá, certamente, reajustamentos nos objetivos, nos programas e nas calendarizações”, mas este “novo recomeço” pode ser a oportunidade de se filtrarem as obras, dividindo-as entre essenciais e supérfluas, a serem realizadas no país, com mais critério e qualidade.
“Precisamos sobretudo de diversificar a grande maioria das obras necessárias que construímos (sejam habitações, lares, hospitais, escolas ou outras), adequando-as à nossa realidade, em vez de continuarmos a caminhar na concentração de um pequeno número de obras de grande qualidade num oceano de banalidades”, refere.
Solução: obras públicas José Manuel Pedreirinho olha, para já, com cautela para o futuro da construção civil em Portugal, considerando que a recuperação do ritmo da construção para níveis pré-covid-19 estará sempre “diretamente ligada à recuperação económica que venha a verificar-se”.
A solução para o setor poderá chegar, porém, mais cedo (e mais facilmente) caso se concretizem os grandes projetos públicos que, antes da pandemia, estavam prontos a chegar ao terreno – como é o caso do novo aeroporto do Montijo.
“Por aquilo que temos acompanhado junto do Governo, sabemos que existe a intenção de ser incrementado um programa de obras públicas que poderá ser o motor para parte desta recuperação”, diz o arquiteto. O presidente da ordem não nega que, “juntamente com uma grande quantidade de pequenos projetos para dar resposta a necessidades locais, privados ou municipais, acreditamos que esta solução possa ser o motor de uma revitalização que, todos sabemos, é essencial pela multiplicidade de áreas que estão diretamente envolvidas”.
José Manuel Pedreirinho acredita que é necessária “uma aposta pela qualidade”, garantindo que “os arquitetos portugueses estão certos de que irão ter um papel determinante” nesta fase de retoma.