1. Às 23 horas de Londres e de Lisboa e 24 de Bruxelas desta sexta-feira, depois de amanhã, o Reino Unido sai da União Europeia, onde esteve sempre com um pé dentro e outro fora. Teria sido melhor para todos que nunca tivesse entrado, como defendia De Gaulle. No entanto, uma vez que foi acolhido, teria sido certamente positivo que o reino tivesse ficado. O período de transição vai ser longo e negociado, como nos divórcios de gente com bens a partilhar. Porém, no que a Portugal diz respeito, não sabemos rigorosamente nada quanto ao que está a ser negociado e às medidas que foram tomadas para manter um fluxo económico próximo do normal e proteger os cidadãos portugueses (cerca de 300 mil) que vivem no Reino Unido. Para eles há aspetos altamente sensíveis como os direitos de residência, a aquisição de nacionalidade, a segurança social e pensões. A mesma coisa se passa com os britânicos que residem em Portugal mas, em regra, os problemas são bem menores. Desde logo porque, cá, os britânicos são bem acolhidos. Lá, nem sempre é o caso dos portugueses, sobretudo dos que chegaram mais recentemente à procura de trabalho. A saída do Reino Unido da UE não é a maior fatalidade que poderia acontecer, mas é um rombo enorme. No campo económico, a Alemanha ganha ainda mais predominância e obviamente vai usá-la, perante uma França em crise, uma Itália anárquica, uma Espanha dividida e instável e pequenos países que não têm sequer a pujança de muitos dos estados federais alemães. No campo da defesa, os britânicos vão manter os compromissos da NATO, mas é a França que passa a potência dominante no espaço comum. Quanto a Portugal, é essencial aproveitar o momento para alertar para que não se repita o caso das negociações com a troika, em que até hoje ninguém sabe exatamente quem propôs e acordou o quê nos cortes e ajustamentos. Isto porque não houve e não parece haver agora atas da negociação. Quando muito poderão aparecer uns emails e umas pastas que, inevitavelmente, também serão esquecidas nalgum recanto de ministério, até ao dia em que alguém as leve para a Marmeleira, onde finalmente serão consultadas por um Pacheco Pereira já muito velhinho. É assim quase sempre connosco. A transparência reclama-se, proclama-se, mas quanto a praticá-la é mais “‘tá quieto”. Sabemos tudo de Harry, Meghan, da tristeza da rainha, da vida de Kate e William e dos passos de Carlos e Camila. Mas do Brexit e da forma como ele vai interferir connosco não sabemos praticamente nada. E é já depois de amanhã.
2. Rui Pinto assumiu a paternidade do Luanda Leaks, como, aliás, se suspeitava, depois do Football Leaks que ele tornou público, o que o levou à cadeia por suspeita de tentativa de extorsão. No caso Luanda Leaks, Rui Pinto é herói e diz nada ter exigido em troca da entrega a um grupo de jornalistas. Já no Football Leaks, é vilão. Afinal, que diferença existe e em que ficamos? A revelação desta paternidade angolana de Rui Pinto traumatizou, entretanto, alguns jornalistas que, aparentemente, pouco investigaram.
3. O CDS tem nova liderança depois de um congresso à antiga portuguesa, ou seja, com emoções, traições e reviravoltas. O número gigantesco de delegados foi esmagador para um partido que tem cinco deputados em 230 no total do Parlamento. Se a proporção fosse equivalente, por exemplo, no PC da China seriam para aí 150 mil delegados. Francisco Rodrigues dos Santos é um jota, mas envelhece o CDS. Coloca-o mais à direita, no aspeto de costumes e práticas que hoje são legalmente aceites e, objetivamente, dizem apenas respeito à consciência de cada um, e não a valores de política pura. O que está por se saber é se (no espaço deste novo CDS) já chega o Chega e se o CDS ainda lá cabe? Uma radicalização à direita associada a uma outra à esquerda pode tendencialmente favorecer a estratégia de Rui Rio, que entende ser ao centro que se deve travar o combate político. Segue-se o congresso do PSD e a respetiva concretização desta estratégia. A partir daí, todos os partidos terão as suas opções definidas para os tempos imediatos. Faltará ainda o Bloco, mas dali só vem mais do mesmo: pancada pública e toque de pernas debaixo da mesa com o PS.
4. Manda quem pode e obedece quem deve. Não há que ver! Assim sendo, o aeroporto do Montijo vai mesmo para a frente, depois da luz verde da Agência Portuguesa do Ambiente (APA). Ninguém no seu pleno juízo acreditaria que uma luz vermelha alguma vez se acendesse. A Vinci é a dona de todos os aeroportos do país e põe e dispõe, contando ainda com uma teia de influência a todos os níveis que faz inveja a qualquer lóbi americano. Veremos o que dá e quando é que a unidade fica operacional. Talvez lá para 2025, na melhor das hipóteses. Isto se não ficar debaixo de água antes disso por causa do degelo fulminante a que assistimos, na sequência das alterações climáticas que alguns persistem em negar.
Escreve à quarta-feira