Muitos dos acontecimentos mais importantes da história contemporânea ficaram imortalizados em fotografias que se tornaram célebres. A queda do muro de Berlim pela imagem de um homem empoleirado, a fome em África na foto do abutre que espera a morte da criança faminta, a crise dos refugiados no corpo da criança que dá à praia, o fim da Segunda Guerra Mundial na fotografia da bandeira soviética sobre os destroços de Berlim, o 25 de abril pelo retrato de Salgueiro Maia, de Eduardo Gageiro.
No que toca às grandes decisões políticas, escolher em que fotografia queremos aparecer, onde e com quem, coloca-nos para sempre de um dos lados da História. Veja-se o retrato de família que Durão Barroso, Aznar, Bush e Blair tiraram na Cimeira das Lajes, nos Açores, e que servirá para sempre como prova da cumplicidade de Portugal na guerra ilegal contra o Iraque.
Atrás daquela imagem de quatro homens engravatados e sorridentes há dezenas de milhares de mortos, centenas de milhares de feridos e milhões de refugiados iraquianos. Essa é uma lição que todos devíamos ter aprendido em 2003: há fotografias em que não queremos aparecer.
Do encontro anunciado para hoje, quinta-feira, entre Mike Pompeo e Benjamin Netanyahu pode sair uma dessas fotografias tenebrosas que precedem a tragédia.
Comecemos pelos seus protagonistas, que não são flor que se cheire. Pompeo é Secretário de Estado norte-americano de Donald Trump, o maior incendiário da paz mundial nos dias que correm. Ex-Diretor da CIA foi escolhido pelo Presidente dos EUA pelas disposições islamofóbicas, pela defesa da prisão de tortura de Guantánamo e das leis antiterroristas que atentam contra as liberdades e direitos humanos em todo o mundo.
Netanyahu é primeiro ministro israelita, o cão de guarda de Trump no Médio Oriente, um dos líderes do clube de extrema direita mundial em que participa também Bolsonaro. É o primeiro chefe de Governo acusado formalmente por corrupção, ainda por cima com a legitimidade posta em causa por estar a caminho da terceira eleição sem conseguir formar governo. É um criminoso de Estado cujas ações militares e contra os Direitos Humanos violam constantemente as leis internacionais e as resoluções da ONU.
A agenda do encontro é o apoio dos ultraconservadores norte-americanos à campanha de Netanyahu para as próximas eleições legislativas israelitas. Preocupado em manter a sua impunidade nos casos de corrupção, Bibi quer ganhar as eleições à custa de promessas de ocupação ilegal dos territórios palestinianos, da anexação ilegal do Vale Jordão, de agressões ao povo palestiniano e da instauração do apartheid dentro de Israel e dos territórios ocupados.
Da última vez que Pompeo e Netanyahu estiveram juntos, os Estados Unidos reconheceram a soberania de Israel sobre os Montes Golã, ocupados e anexados na sequência da Guerra dos Seis Dias, deitando ao lixo décadas de resoluções e convenções internacionais e qualquer sonho de solução de paz com dois estados.
Resumindo: dois escroques da política internacional encontram-se para o que não se prevê que seja um acordo sobre a paz mundial. O cenário? Lisboa, cortesia de António Costa e do seu governo.
O último primeiro-ministro israelita a ser recebido em Portugal foi Isaac Rabin, um trabalhista apoiado pela maioria árabe para impulsionar os Acordos de Oslo. Visitou o nosso país em 1994, o mesmo ano em que recebeu o Nobel da Paz com Shimon Peres e Yasser Arafat.
António Costa vai rasgar essa fotografia para receber Benjamin Netanyahu? Não em meu nome, Sr. Primeiro Ministro.