1 minuto e 30 segundos de utilidade


Qualquer verdadeiro democrata tem de ser contra o “cortar da palavra” a que assistimos por iniciativa de quatro partidos políticos: PS, BE, PCP e PEV.


A democracia deve ser usada segundo a segundo. Deve ser útil. Não é preciso 3 horas para se passar uma mensagem ou uma ideia. Bastam, seguramente, 90 segundos.

E, sobre isso mesmo, ao longo das últimas semanas vivemos no debate irrisório e que nem devia existir. Os partidos de um só deputado podem ou não podem falar em iniciativas legislativas?

Não quero dizer que concordo com as posições do Iniciativa Liberal (IL), do Chega ou do Livre. Posso inclusive vir a não concordar uma única vez na vida com uma qualquer proposta desses três partidos políticos. Mas, como se diz que disse o filósofo Voltaire: “Eu discordo do que você diz, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-lo”

Devem falar todos porque representam muita cidadã portuguesa e muito cidadão português. A democracia exige que assim seja.

Qualquer verdadeiro democrata tem de ser contra o “cortar da palavra” a que assistimos por iniciativa de quatro partidos políticos: PS, BE, PCP e PEV.

Assumiram em primeira altura, aqueles partidos que se sentam à esquerda do hemiciclo, que até haver um novo regimento que já enquadrasse esta situação dos partidos com deputados únicos – precisamente o IL, Chega e Livre – não pudessem intervir nos debates. Isto apesar de essa mesma exceção ter sido aplicada ao caso do PAN na última legislatura…

Felizmente o paradigma mudou rapidamente mas, seguramente, não deveria ser necessário qualquer boa vontade de um Presidente da Assembleia da República ou ter entrado um qualquer requerimento para que estes três deputados, dos três partidos referidos e até novo regimento entrar em vigor, pudessem falar durante 90 segundos quando se discutirem iniciativas legislativas.

Para o bem da democracia, os deputados João Cotrim de Figueiredo, Joacine Moreira e André Ventura falaram e dessa forma representaram os cerca de 193 mil portugueses que votaram nos seus três projetos políticos. Merecem o mesmo respeito face a quem optou por votar no PS, PSD, BE, PCP, CDS ou PAN.

Mas pensemos no minuto e meio que estes deputados à Assembleia da República têm para expor ideias e preocupações.

Lanço um desafio simples: Este tempo de 90 segundos é suficiente para se apresentar preocupações portuguesas?

Pegue no cronómetro e veja se não conseguia transmitir um conjunto de ideias em minuto e meio de exposição.

Até poderemos contar com os cumprimentos típicos e formais da sessão, mas vamos testar o relógio.

“Senhor Presidente, Senhor Primeiro-Ministro, Senhores Membros do Governo e Senhores Deputados,

Várias questões que os Portugueses querem saber neste final de 2019.

Sobre o estado do nosso SNS, como se compromete o Governo a inverter o rumo de termos cada vez menos saúde para os portugueses? Como irá o Ministério da Saúde em articulação com o Ministério das Finanças e as suas cativações colmatar falhas que o país vive e vê em vários Hospitais, com serviços de urgência a fechar ou até face a notórias falhas de aporte de medicamentos aos portugueses?

Sobre a falta de investimento público que Portugal assiste, mesmo com conhecimento do aumento previsto através do esboço orçamental enviado à Comissão Europeia que prevê um crescimento de 10% este ano e 16% no próximo, ou seja, mesmo com mais 600 milhões de euros em investimento público que nos mantém na cauda da europa, como irá o Governo responder às mesmas carências e encontrar melhorias para os nossos transportes públicos?

Como pode, ainda na mesma matéria, e sabendo a decadência da estrutura ferroviária nacional, o Governo ver canceladas e adiadas 18 obras consideradas prioritárias pelo Programa Ferrovia 2020 que previa um investimento de dois mil milhões de euros na renovação das estruturas ferroviárias portuguesas?

Sobre a enormíssima carga fiscal que vivemos, fixada em 35,4% do PIB em 2018 que é o valor mais alto desde pelo menos 1995 e quando Bruxelas já prevê que vá aos 35,5% em 2020, como irá o Governo dar uma resposta positiva a milhares de famílias que vivem sufocadas em impostos? Como mudará este paradigma?

Na Educação, como irá o Governo responder até ao início de 2020, quando ocorre o início do processo de transferência de competências para Municípios portugueses nesta matéria, sabendo que já hoje há escolas secundárias que são obrigadas a fechar portas por não terem condições de segurança e operacionalidade em virtude de não cumprirem o rácio (do próprio Ministério da Educação) ao nível de Assistentes Operacionais? Como irão subsistir ou sobreviver tantas escolas estes meses todos?

Ao nível da Habitação, e inclusive sabendo das alterações à Lei do Arrendamento que têm melhorias significativas para os proprietários e para os arrendatários, como fará o Governo frente à positiva realidade imposta pelo Turismo no nosso País? Como haverá espaço para os jovens terem as suas casas e fixarem as suas famílias? Como irão os estudantes arrendar casas ao preço deste mercado quando o Governo não acautelou esta necessidade? Como irá aproveitar o Governo a real gentrificação das nossas grandes cidades? Como irá exponenciar a glocalização que as maiores cidades portuguesas vivem com os expatriados que bem temos recebido?

Na política de salários, e salientado o impacto positivo no aumento do salário mínimo para os cerca de 760 mil portugueses que o auferem, como irá o Governo implementar um programa de reformas que olhe para o aumento da nossa competitividade e que zele pela evolução competente dos salários em função da produtividade e assim distancie o salário médio, por cima, do salário mínimo mesmo em crescendo?”

1 minuto e 30 segundos e até pode ler em ritmo calmo e pausado.

Neste tempo, e se não houver ginástica demagógica, Portugal poderia ter respostas pertinentes sobre Saúde, Habitação, Educação, Investimento Público, Política salarial e Carga Fiscal.

Certamente haveria milhares de outras – talvez melhores – formas de abordar tantas outras importantes matérias e propostas em 90 segundos numa sessão parlamentar de debate quinzenal com o Governo.

Mas, acima de tudo, é possível fazer-se política e questionar-se em minuto e meio. O que é impossível é aceitar-se que se tente silenciar, sob que forma seja, qualquer eleito que foi votado por milhares de portugueses democraticamente.

A democracia serve para ter e dar voz a quem não a tem, e a principal função de quem é eleito, aos olhos de quem o elege, é representar. Dar a cara e falar. Construir e emitir opinião sem silêncios ensurdecedores.

Que, com 90 ou 900 segundos, não se permita o silêncio porque qualquer segundo deve ser importante para se tentar melhorar Portugal.

Carlos Gouveia Martins

1 minuto e 30 segundos de utilidade


Qualquer verdadeiro democrata tem de ser contra o “cortar da palavra” a que assistimos por iniciativa de quatro partidos políticos: PS, BE, PCP e PEV.


A democracia deve ser usada segundo a segundo. Deve ser útil. Não é preciso 3 horas para se passar uma mensagem ou uma ideia. Bastam, seguramente, 90 segundos.

E, sobre isso mesmo, ao longo das últimas semanas vivemos no debate irrisório e que nem devia existir. Os partidos de um só deputado podem ou não podem falar em iniciativas legislativas?

Não quero dizer que concordo com as posições do Iniciativa Liberal (IL), do Chega ou do Livre. Posso inclusive vir a não concordar uma única vez na vida com uma qualquer proposta desses três partidos políticos. Mas, como se diz que disse o filósofo Voltaire: “Eu discordo do que você diz, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-lo”

Devem falar todos porque representam muita cidadã portuguesa e muito cidadão português. A democracia exige que assim seja.

Qualquer verdadeiro democrata tem de ser contra o “cortar da palavra” a que assistimos por iniciativa de quatro partidos políticos: PS, BE, PCP e PEV.

Assumiram em primeira altura, aqueles partidos que se sentam à esquerda do hemiciclo, que até haver um novo regimento que já enquadrasse esta situação dos partidos com deputados únicos – precisamente o IL, Chega e Livre – não pudessem intervir nos debates. Isto apesar de essa mesma exceção ter sido aplicada ao caso do PAN na última legislatura…

Felizmente o paradigma mudou rapidamente mas, seguramente, não deveria ser necessário qualquer boa vontade de um Presidente da Assembleia da República ou ter entrado um qualquer requerimento para que estes três deputados, dos três partidos referidos e até novo regimento entrar em vigor, pudessem falar durante 90 segundos quando se discutirem iniciativas legislativas.

Para o bem da democracia, os deputados João Cotrim de Figueiredo, Joacine Moreira e André Ventura falaram e dessa forma representaram os cerca de 193 mil portugueses que votaram nos seus três projetos políticos. Merecem o mesmo respeito face a quem optou por votar no PS, PSD, BE, PCP, CDS ou PAN.

Mas pensemos no minuto e meio que estes deputados à Assembleia da República têm para expor ideias e preocupações.

Lanço um desafio simples: Este tempo de 90 segundos é suficiente para se apresentar preocupações portuguesas?

Pegue no cronómetro e veja se não conseguia transmitir um conjunto de ideias em minuto e meio de exposição.

Até poderemos contar com os cumprimentos típicos e formais da sessão, mas vamos testar o relógio.

“Senhor Presidente, Senhor Primeiro-Ministro, Senhores Membros do Governo e Senhores Deputados,

Várias questões que os Portugueses querem saber neste final de 2019.

Sobre o estado do nosso SNS, como se compromete o Governo a inverter o rumo de termos cada vez menos saúde para os portugueses? Como irá o Ministério da Saúde em articulação com o Ministério das Finanças e as suas cativações colmatar falhas que o país vive e vê em vários Hospitais, com serviços de urgência a fechar ou até face a notórias falhas de aporte de medicamentos aos portugueses?

Sobre a falta de investimento público que Portugal assiste, mesmo com conhecimento do aumento previsto através do esboço orçamental enviado à Comissão Europeia que prevê um crescimento de 10% este ano e 16% no próximo, ou seja, mesmo com mais 600 milhões de euros em investimento público que nos mantém na cauda da europa, como irá o Governo responder às mesmas carências e encontrar melhorias para os nossos transportes públicos?

Como pode, ainda na mesma matéria, e sabendo a decadência da estrutura ferroviária nacional, o Governo ver canceladas e adiadas 18 obras consideradas prioritárias pelo Programa Ferrovia 2020 que previa um investimento de dois mil milhões de euros na renovação das estruturas ferroviárias portuguesas?

Sobre a enormíssima carga fiscal que vivemos, fixada em 35,4% do PIB em 2018 que é o valor mais alto desde pelo menos 1995 e quando Bruxelas já prevê que vá aos 35,5% em 2020, como irá o Governo dar uma resposta positiva a milhares de famílias que vivem sufocadas em impostos? Como mudará este paradigma?

Na Educação, como irá o Governo responder até ao início de 2020, quando ocorre o início do processo de transferência de competências para Municípios portugueses nesta matéria, sabendo que já hoje há escolas secundárias que são obrigadas a fechar portas por não terem condições de segurança e operacionalidade em virtude de não cumprirem o rácio (do próprio Ministério da Educação) ao nível de Assistentes Operacionais? Como irão subsistir ou sobreviver tantas escolas estes meses todos?

Ao nível da Habitação, e inclusive sabendo das alterações à Lei do Arrendamento que têm melhorias significativas para os proprietários e para os arrendatários, como fará o Governo frente à positiva realidade imposta pelo Turismo no nosso País? Como haverá espaço para os jovens terem as suas casas e fixarem as suas famílias? Como irão os estudantes arrendar casas ao preço deste mercado quando o Governo não acautelou esta necessidade? Como irá aproveitar o Governo a real gentrificação das nossas grandes cidades? Como irá exponenciar a glocalização que as maiores cidades portuguesas vivem com os expatriados que bem temos recebido?

Na política de salários, e salientado o impacto positivo no aumento do salário mínimo para os cerca de 760 mil portugueses que o auferem, como irá o Governo implementar um programa de reformas que olhe para o aumento da nossa competitividade e que zele pela evolução competente dos salários em função da produtividade e assim distancie o salário médio, por cima, do salário mínimo mesmo em crescendo?”

1 minuto e 30 segundos e até pode ler em ritmo calmo e pausado.

Neste tempo, e se não houver ginástica demagógica, Portugal poderia ter respostas pertinentes sobre Saúde, Habitação, Educação, Investimento Público, Política salarial e Carga Fiscal.

Certamente haveria milhares de outras – talvez melhores – formas de abordar tantas outras importantes matérias e propostas em 90 segundos numa sessão parlamentar de debate quinzenal com o Governo.

Mas, acima de tudo, é possível fazer-se política e questionar-se em minuto e meio. O que é impossível é aceitar-se que se tente silenciar, sob que forma seja, qualquer eleito que foi votado por milhares de portugueses democraticamente.

A democracia serve para ter e dar voz a quem não a tem, e a principal função de quem é eleito, aos olhos de quem o elege, é representar. Dar a cara e falar. Construir e emitir opinião sem silêncios ensurdecedores.

Que, com 90 ou 900 segundos, não se permita o silêncio porque qualquer segundo deve ser importante para se tentar melhorar Portugal.

Carlos Gouveia Martins