Um Governo com 70 membros não lembra ao careca


Era difícil arranjar um Executivo mais complexo na sua organização e capacidade operacional. A governação começará lá para junho.


1. Há uma expressão na caça segundo a qual atrás de uma má moita pode saltar um bom coelho. É uma raridade, mas acontece. Seria surpreendente que tal ocorresse com o Governo que António Costa apresentou e no qual o ministro das Finanças, até aqui a coqueluche do firmamento socialista, se apaga, o que mostra claramente que está já a cumprir serviços mínimos até ir para uma qualquer cadeira de sonho. Adiante. O Governo tem uma estrutura estranha e pesada, com 70 membros e áreas encavalitadas umas nas outras, não tendo sequer figuras de relevo da política nem da vida empresarial. É uma turma fraquinha. Os seus protagonistas são, em regra, funcionários públicos. Era difícil arranjar um Governo mais complexo na sua organização e potencialidade operacional. Alguns dos seus elementos arrastam problemas complexos, como o estranho caso do lítio (Litiogate?), que envolve João Galamba, o secretário de Estado da Energia. Dado o calendário que temos e a estrutura do Executivo, o que vai acontecer é, mais ou menos, a governação efetiva da pátria começar lá para junho, quando for posta cá fora a lei de execução orçamental. Até lá há muitas etapas a passar: discutir o programa do Governo, aprovar o Orçamento do Estado, elaborar novas leis orgânicas dos ministérios, o que leva meses. Além disso, haverá ainda que contar com o tempo necessário para os ministros conhecerem os cantos à casa e se articularem entre si, evitando entrar nos terrenos uns dos outros. O valor político do Governo está no primeiro-ministro e na mão da nova líder parlamentar do PS, Ana Catarina Mendes, que terá de usar a sua reconhecida capacidade política para defender o Executivo numa Assembleia da República cuja importância está agora redobrada e de onde partirão e chegarão todas as crises políticas, mesmo que de curta duração. Estas preveem-se sucessivas e inesperadas.

2. Nuno Artur Silva é o novo secretário de Estado da comunicação social e de mais umas coisas que lhe dão jeito. Segundo disse, vendeu as Produções Fictícias e o Canal Q, cuja propriedade o obrigou a sair da RTP depois de uma posição intransigente do CGI, o órgão máximo da empresa. Resta saber a quem vendeu, o que não é despiciendo, pois há muitas maneiras de fazer as coisas. Desde que Nuno Artur Silva deixou a RTP, a empresa melhorou e recuperou em audiências e qualidade pela mão de José Fragoso e Maria Flor Pedroso, na programação e informação de televisão, respetivamente. Já a rádio vive abandonada como sempre desde a fusão. Nuno Silva tem uma camarilha que nunca mais acaba. A ministra Graça Fonseca que esteja atenta.

3. Depressa e bem, não há quem. A ideia de queimar etapas para que houvesse Governo e plenário da Assembleia da República o mais depressa possível não era razoável. Induziu inclusivamente o Presidente Marcelo em erro. Manuela Ferreira Leite foi das poucas personalidades que alertaram e perceberam o imbróglio, além de chamar a atenção para a desconsideração para com os portugueses que vivem no estrangeiro que significava uma posse sem se terem contado os seus votos.

4. Enquanto o país está em pousio interno verifica-se a manutenção de uma absoluta inexistência externa, o que se tornou habitual com Augusto Santos Silva. É notável a forma como não se lhe ouve uma palavra sobre a chacina dos curdos, a traição repugnante de Trump àquele povo, a fuga dos radicais do Daesh, a política expansionista de Israel, a situação na Venezuela e a guerra das tarifas que afeta Portugal, ou seja, sobre os assuntos internacionais. Silêncios percebem-se quanto ao Brasil, Brexit e Espanha, mas noutros casos são indecorosos…

5. No Jornal das 8 da TVI deu-se, na segunda-feira, a situação surrealista de a embaixadora de Espanha ser entrevistada durante 15 minutos e responder em castelhano. Uma situação de completa subserviência e certamente impossível de suceder inversamente em qualquer televisão espanhola. Se falasse em catalão ou galego, sempre se entendia melhor, embora também fosse inaceitável.

6. Procura-se líder para pequeno partido. Aceitam-se candidaturas mediante apresentação de CV e guarda-roupa adequado, constituído, nomeadamente, por blazer, calça cinzenta e gravata com símbolos tradicionais. Camisa branca ou azul e sapatos mocassim, com berloque, são fatores preferenciais. Sólidos conhecimentos de teologia são essenciais. Dá-se prioridade a candidatos com família numerosa e cão golden retriever ou labrador. Resposta com foto tipo passe para Largo do Caldas, em Lisboa.

7. Há pouco tempo houve uma ação de sensibilização junto ao Padrão dos Descobrimentos para que as bicicletas, trotinetas e skates deixassem de lá passar, estragando a Rosa dos Ventos, que indica os caminhos marítimos feitos pelos navegadores portugueses. A iniciativa teve honras de telejornais, rádio e imprensa. Compareceram autoridades de todo o tipo. Resultou muito bem: está tudo na mesma! Rigorosamente!

 

Escreve à quarta-feira