Toca a malhar no Governo!


Só quando a direita regressar ao poder – e oxalá que ainda leve algum tempo – é que os partidos e a imprensa de direita hão-de dizer: “Olhem que não é bonito aproveitarem-se das desgraças!” 


O mais nefasto dos contributos deste Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, para a instabilidade da vida política foi por ocasião dos terríveis incêndios de 2017, quando deu o dito por não dito – atitude nada original, aliás, na sua vida de comentador político e de dirigente e militante do PPD-PSD. 

De facto, convém não esquecer o que Sua Excelência começou por afirmar, categoricamente, numa deslocação a Pedrógão durante o terrível incêndio. Disse ele, em público, bastante condoído: “Foi feito tudo o que podia ser feito!” (sic) Mas depressa percebeu que estava ali um óptimo pretexto para mostrar à direita que o elegeu Presidente que continuava a contar com ela. E foi então que começou a reclamar um apuramento urgente de responsabilidades pelas consequências dos incêndios, mas sugerindo habilidosamente – para gáudio de uma comunicação social quase toda nas mãos da plutocracia e, portanto, da direita – que essas responsabilidades apontavam já, muito direitinhas, para este Governo sustentado pelas esquerdas e chefiado pelo seu ex-aluno António Costa, um socialista “irritantemente optimista”. 

Claro que a partir daí começaram logo a despontar, como cogumelos, atiça-fogos sedentos de “sangue na política” e ansiosos por primeiras páginas e aberturas de telejornais com as orelhas do Governo politicamente a arder e a somar-se aos incêndios que, infelizmente, grassam neste país há décadas, todos os anos pelo Verão, pelo menos desde o tempo da outra senhora, vários com vítimas mortais, mas sem que alguma vez tenha sido responsabilizado qualquer Governo. E agora, pela primeira vez, aparece alguém, e logo um Presidente da República, como que a legitimar acusações contra um Governo, não por acaso, de esquerda e apoiado ou sustentado no Parlamento por todas as esquerdas – um escândalo!

Começou então um autêntico concurso de tiro ao alvo entre muitas e desvairadas gentes da direita – jornalistas, comentadores, vira-casacas, vários políticos outrora de extrema-direita, outros tantos outrora de extrema-esquerda, além de arrivistas medíocres e sem ideias de partidos anémicos e impotentes – todos a querer fazer a folha e malhar neste Governo e todos ansiosos por apresentar o pretexto para Marcelo PR dissolver a Assembleia da República e, assim, dar cabo do Governo e do “esquerdalho”. Mas, além de faltar ao PR coragem para tal aventura, era mister que os resultados das novas legislativas não se virassem contra ele.

Seja como for – e para além de várias e duvidosamente independentes comissões e/ou observatórios constituídos por técnicos e/ou peritos de alto gabarito, com os rabos sentados nos seus gabinetes de estudos -, voluntariaram-se logo jornalistas, comentadores e “comendadores”, dilectos do PR, multiplicando argumentos sobre os fogos florestais e a responsabilidade inequívoca do Governo, obviamente deste Governo do PS sustentado pelas esquerdas, que horror! Dei-me, pois, ao trabalho de seleccionar os argumentos mais absurdos e de caricaturá-los assim:

– O ordenamento do território, por mais desordenado que seja, e a temperatura do ar, por mais alta que seja, apesar de irresponsavelmente citados por quase toda a gente, terão uma importância bastante relativa (se é que a têm!) na ignição e nas dimensões dos incêndios florestais – pois a culpa só pode ser do Governo;

– A trovoada seca ou a mão criminosa, se é que porventura existem, não passam de um pormenor com as costas largas e nem sequer deviam ser invocadas – até porque já se sabe que a culpa é sempre deste Governo, que é de esquerda;

– Falar da responsabilidade da EDP por eventuais descargas eléctricas só pode ser brincadeira de mau gosto ou desculpa de maus pagadores ao António Mexia e aos accionistas chineses daquela empresa – porque a culpa é só do Governo;

– Os proprietários, absentistas ou não, de terras com árvores e mato de que não cuidam devidamente, é claro que não são culpados pelos incêndios que afectam essas terras – porque o culpado é só um, este Governo e mais nenhum;

– As autarquias locais, nomeadamente as câmaras municipais – pobres coitadas! -, apesar de serem, nos termos da lei, as “principais responsáveis pela protecção civil nos respectivos concelhos”, “eh pá, tu ‘tá mas é quieto, ó mau, nem penses, não querias mais nada?” – o único culpado é este Governo centralizador;

– Os bombeiros e respectivos comandantes – que andam para ali de um lado para o outro ao deus-dará, coitaditos! – são sempre vítimas desse punhado de filhos da mãe da Protecção Civil, que não percebem nada do que se está a passar e o que deviam era andar à mangueirada em vez dos bombeiros! Porque só os bombeiros e seus heróicos comandantes – e viva o Jaime Marta Soares! – é que deviam estar ali a supervisionar. Patrocinados por S. Exa. o PR e apoiados pelos comentadores e “comendadores” amigos dele, mas também pelos peritos de alto gabarito e rabo sentado nas comissões e observatórios técnicos independentes, e ainda, last but not least, pelos jornalistas de direita mais fanáticos e sabichões, que nunca se enganam e raramente têm dúvidas, pois o culpado é só este Governo!

Ora bem, no meio de toda esta mixórdia de incêndios do caraças e das injustas e falsas acusações, regresso ao tempo da outra senhora e ao estilo da propaganda contra quem ouvia a Rádio Moscovo, e efabulo: “A verdade é só uma, o primeiro-ministro António Costa não fala verdade! A culpa é deste Governo de esquerda e de quem o apoiar! Governo que nunca mais morre nem a direita almoça!” 

E atenção! Olhem que isto aqui não é a Catalunha, ou a Califórnia, ou a Austrália, com aqueles incêndios gigantescos, duradouros, mortíferos e devastadores, nos quais a esquerda, como é óbvio, não meteu prego nem estopa, pois só quando ela os mete é que um seu Governo responde pelos incêndios! A direita, coitadita, por mais gigantesco, devastador e mortífero que seja um incêndio, claro que não é responsável – mas não é mesmo nunca por nunca ser, perceberam?!

Bem tenho eu avisado que esta história entretecida por S. Exa. o PR – e apoiada pelos seus “comendadores” e comentadores dilectos, pelos partidos e pelos jornais de direita – está sempre pronta a recomeçar enquanto a esquerda mais ou menos moderada estiver no poder! E agora que estamos à beira das eleições legislativas nem seria preciso que o dr. Pardal do Maserati e seus camionistas, o bastonário Miguel Guimarães e seus médicos, e a muito inefável bastonária Ana Rita Cavaco e seus enfermeiros “laranjinhas” viessem proclamar urbi et orbi que é tempo de malhar forte e feio neste Governo enquanto o Verão ainda está quente…

Só quando a direita regressar ao poder – e oxalá que ainda leve algum tempo a lá chegar! – é que os partidos e a imprensa de direita hão-de dizer: “Olhem que não é bonito aproveitarem-se das desgraças! Todos os partidos devem unir-se e rezar para que os heróicos soldados da paz vençam o combate contra o fogo!! Aos 74 anos, já vi muito disto e sei muito bem como eles e elas nos mordem…

Escreve sem adopção das regras do acordo ortográfico de 1990

Toca a malhar no Governo!


Só quando a direita regressar ao poder - e oxalá que ainda leve algum tempo - é que os partidos e a imprensa de direita hão-de dizer: “Olhem que não é bonito aproveitarem-se das desgraças!” 


O mais nefasto dos contributos deste Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, para a instabilidade da vida política foi por ocasião dos terríveis incêndios de 2017, quando deu o dito por não dito – atitude nada original, aliás, na sua vida de comentador político e de dirigente e militante do PPD-PSD. 

De facto, convém não esquecer o que Sua Excelência começou por afirmar, categoricamente, numa deslocação a Pedrógão durante o terrível incêndio. Disse ele, em público, bastante condoído: “Foi feito tudo o que podia ser feito!” (sic) Mas depressa percebeu que estava ali um óptimo pretexto para mostrar à direita que o elegeu Presidente que continuava a contar com ela. E foi então que começou a reclamar um apuramento urgente de responsabilidades pelas consequências dos incêndios, mas sugerindo habilidosamente – para gáudio de uma comunicação social quase toda nas mãos da plutocracia e, portanto, da direita – que essas responsabilidades apontavam já, muito direitinhas, para este Governo sustentado pelas esquerdas e chefiado pelo seu ex-aluno António Costa, um socialista “irritantemente optimista”. 

Claro que a partir daí começaram logo a despontar, como cogumelos, atiça-fogos sedentos de “sangue na política” e ansiosos por primeiras páginas e aberturas de telejornais com as orelhas do Governo politicamente a arder e a somar-se aos incêndios que, infelizmente, grassam neste país há décadas, todos os anos pelo Verão, pelo menos desde o tempo da outra senhora, vários com vítimas mortais, mas sem que alguma vez tenha sido responsabilizado qualquer Governo. E agora, pela primeira vez, aparece alguém, e logo um Presidente da República, como que a legitimar acusações contra um Governo, não por acaso, de esquerda e apoiado ou sustentado no Parlamento por todas as esquerdas – um escândalo!

Começou então um autêntico concurso de tiro ao alvo entre muitas e desvairadas gentes da direita – jornalistas, comentadores, vira-casacas, vários políticos outrora de extrema-direita, outros tantos outrora de extrema-esquerda, além de arrivistas medíocres e sem ideias de partidos anémicos e impotentes – todos a querer fazer a folha e malhar neste Governo e todos ansiosos por apresentar o pretexto para Marcelo PR dissolver a Assembleia da República e, assim, dar cabo do Governo e do “esquerdalho”. Mas, além de faltar ao PR coragem para tal aventura, era mister que os resultados das novas legislativas não se virassem contra ele.

Seja como for – e para além de várias e duvidosamente independentes comissões e/ou observatórios constituídos por técnicos e/ou peritos de alto gabarito, com os rabos sentados nos seus gabinetes de estudos -, voluntariaram-se logo jornalistas, comentadores e “comendadores”, dilectos do PR, multiplicando argumentos sobre os fogos florestais e a responsabilidade inequívoca do Governo, obviamente deste Governo do PS sustentado pelas esquerdas, que horror! Dei-me, pois, ao trabalho de seleccionar os argumentos mais absurdos e de caricaturá-los assim:

– O ordenamento do território, por mais desordenado que seja, e a temperatura do ar, por mais alta que seja, apesar de irresponsavelmente citados por quase toda a gente, terão uma importância bastante relativa (se é que a têm!) na ignição e nas dimensões dos incêndios florestais – pois a culpa só pode ser do Governo;

– A trovoada seca ou a mão criminosa, se é que porventura existem, não passam de um pormenor com as costas largas e nem sequer deviam ser invocadas – até porque já se sabe que a culpa é sempre deste Governo, que é de esquerda;

– Falar da responsabilidade da EDP por eventuais descargas eléctricas só pode ser brincadeira de mau gosto ou desculpa de maus pagadores ao António Mexia e aos accionistas chineses daquela empresa – porque a culpa é só do Governo;

– Os proprietários, absentistas ou não, de terras com árvores e mato de que não cuidam devidamente, é claro que não são culpados pelos incêndios que afectam essas terras – porque o culpado é só um, este Governo e mais nenhum;

– As autarquias locais, nomeadamente as câmaras municipais – pobres coitadas! -, apesar de serem, nos termos da lei, as “principais responsáveis pela protecção civil nos respectivos concelhos”, “eh pá, tu ‘tá mas é quieto, ó mau, nem penses, não querias mais nada?” – o único culpado é este Governo centralizador;

– Os bombeiros e respectivos comandantes – que andam para ali de um lado para o outro ao deus-dará, coitaditos! – são sempre vítimas desse punhado de filhos da mãe da Protecção Civil, que não percebem nada do que se está a passar e o que deviam era andar à mangueirada em vez dos bombeiros! Porque só os bombeiros e seus heróicos comandantes – e viva o Jaime Marta Soares! – é que deviam estar ali a supervisionar. Patrocinados por S. Exa. o PR e apoiados pelos comentadores e “comendadores” amigos dele, mas também pelos peritos de alto gabarito e rabo sentado nas comissões e observatórios técnicos independentes, e ainda, last but not least, pelos jornalistas de direita mais fanáticos e sabichões, que nunca se enganam e raramente têm dúvidas, pois o culpado é só este Governo!

Ora bem, no meio de toda esta mixórdia de incêndios do caraças e das injustas e falsas acusações, regresso ao tempo da outra senhora e ao estilo da propaganda contra quem ouvia a Rádio Moscovo, e efabulo: “A verdade é só uma, o primeiro-ministro António Costa não fala verdade! A culpa é deste Governo de esquerda e de quem o apoiar! Governo que nunca mais morre nem a direita almoça!” 

E atenção! Olhem que isto aqui não é a Catalunha, ou a Califórnia, ou a Austrália, com aqueles incêndios gigantescos, duradouros, mortíferos e devastadores, nos quais a esquerda, como é óbvio, não meteu prego nem estopa, pois só quando ela os mete é que um seu Governo responde pelos incêndios! A direita, coitadita, por mais gigantesco, devastador e mortífero que seja um incêndio, claro que não é responsável – mas não é mesmo nunca por nunca ser, perceberam?!

Bem tenho eu avisado que esta história entretecida por S. Exa. o PR – e apoiada pelos seus “comendadores” e comentadores dilectos, pelos partidos e pelos jornais de direita – está sempre pronta a recomeçar enquanto a esquerda mais ou menos moderada estiver no poder! E agora que estamos à beira das eleições legislativas nem seria preciso que o dr. Pardal do Maserati e seus camionistas, o bastonário Miguel Guimarães e seus médicos, e a muito inefável bastonária Ana Rita Cavaco e seus enfermeiros “laranjinhas” viessem proclamar urbi et orbi que é tempo de malhar forte e feio neste Governo enquanto o Verão ainda está quente…

Só quando a direita regressar ao poder – e oxalá que ainda leve algum tempo a lá chegar! – é que os partidos e a imprensa de direita hão-de dizer: “Olhem que não é bonito aproveitarem-se das desgraças! Todos os partidos devem unir-se e rezar para que os heróicos soldados da paz vençam o combate contra o fogo!! Aos 74 anos, já vi muito disto e sei muito bem como eles e elas nos mordem…

Escreve sem adopção das regras do acordo ortográfico de 1990