Ó Evaristo, tens cá disto?


Quase em véspera de Santos Populares, o irritante do merceeiro Evaristo da Canção de Lisboa, pode muito bem ser invocado a propósito das vivências que vamos percorrendo em Portugal, na Europa e no Mundo. É como se andássemos de porta em porta, de tema em tema a desafiar o Evaristo a tomar uma atitude proativa…


Escrever antes que se saibam os resultados das eleições para o Parlamento Europeu, para ser publicado quando já se sabem os resultados eleitorais, é um desafio.

Destes dias de campanha tolhidos por muitas distrações, resulta evidente que a liderança do PS quis nacionalizar os temas, o tom e os resultados das eleições, num esforço evidente de procurar mitigar as ondas de choque das opções materializadas na escolha dos candidatos e o fogo cruzado em que o PS esteve colocado, numa antevisão do que serão as dinâmicas das legislativas. Ataques despudorados de quem esteve contra e de quem apoiou a solução governativa do PS nos últimos anos. No guião de combate, o PS assumiu uma atitude agressiva com a direita e moderada com a esquerda, mesmo que o sentido de pudor com o tempo comum vivido não suscite da contraparte uma aquiescência similar. Efervescentes divergências nunca relevantes para serem incontornáveis no suporte da solução de Governo, jorram agora no discurso, também apimentado com posições sobre a construção europeia, a soberania nacional e o posicionamento de Portugal no mundo que são o inverso do que a ideologia propalada e os exemplos históricos da sua aplicação fizeram e fazem, sejam quais forem as latitudes e os tempos, da antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas à atual Coreia do Norte ou Venezuela.

O “Ó Evaristo, tens cá disto?”, em Portugal, significa que vamos ter um verão pontuado por casos de ruturas dos serviços públicos, sublinhados no terreno por aqueles que viabilizaram as opções políticas de governo que deram espaço às cativações e aos desinvestimentos e pelos que ambicionam que o Estado desampare a loja ou se mantenha em letargia para gerar oportunidades de negócio para os privados. A cada “Evaristo, tens cá disto nos transportes, na Saúde, na Educação, nos serviços públicos básicos, da emissão de documentos oficiais ao cumprimento de missões do Estado, sempre em profunda situação de indigência e consequente mediatismo, surgirá uma qualquer mitigação que, de forma efetiva ou simbólica, responde com as mesmas latas com que Evaristo respondia a Vasco Santana. Convínhamos que por muito encantadora que seja a narrativa, não é forma de manter uma relação comercial, quanto mais de governar um país. Se não há, explique-se. Se há, aplique-se antes da gritaria e dos impactos na vida das pessoas e dos territórios. Era só o que faltava termos um ministro das Finanças que, por regra, mais parece um Evaristo a arremessar latas perante os problemas a cada esboço de realidade.

O “Ó Evaristo, tens cá disto?, nas Europeias, a ter em conta as sondagens, significará que a abstenção se manterá em níveis intoleráveis, que a fragmentação da vida política não concorre para a mobilização dos cidadãos, que os modelos de campanha eleitoral estão mais do que esgotados, que a inabilidade política da direita e o oportunismo da esquerda à esquerda do PS genericamente é um modelo de fuga das responsabilidades do que fizeram nos verões passados e que a atual liderança do PS ganhou em moldes similares à vitória de 2014. De pouco valerão os malabarismos já ensaiados, ainda os votos não tinham caído nas urnas. Em 2014, o PS enfrentou uma coligação do PSD com o CDS, depois de ter subscrito o memorando da Troika. Em 2019, qualquer avaliação dos resultados eleitorais terá de ter em conta o mesmo PS comparado com a soma do PSD e CDS. Tudo o resto será conversa para entreter, com a anuência de um jornalismo preguiçoso, exaurido de exigência ou demasiado comprometido com a situação. Mas, sobre as europeias, com os resultados apurados, em Portugal e nos estados membros da União escreverei na próxima semana.

Sem prejuízo, questiona-se, Ó Evaristo, foi mesmo bom ou foi menos que poucochinho para quem ambicionou uma maioria absoluta?

NOTAS FINAIS

ENGRAÇADINHOS. O Marquês como as praças e ruas de muitos pontos do país, da Europa e do mundo, encheram-se de festejos pela conquista do campeonato de futebol pelo Sport Lisboa e Benfica. Há engraçadinhos, que se pavoneiam por onde querem, dizem o que querem e persistem na cultura do ódio, que acham que a liberdade é um exclusivo seu, não ao alcance de outros. Sim, o Benfica é campeão, deu profusos sinais de elevação nos festejos, nas entrevistas e no que defendeu para o futebol e para a sociedade, que contrastam com a pequenez de sempre, dos de sempre. Podia ser tempo perdido, se agíssemos em função dos outros, mas não, também aqui agimos em função dos valores, do património, das conquistas e do caminho que está a ser construído no maior de Portugal. No entanto, é bom que quem tem responsabilidades pelo todo, como é o caso da Liga e da Federação Portuguesa de Futebol, se soltem das amarras, deixem de fingir que não veem a realidade e comecem a fazer qualquer coisinha pelo espetáculo e por uma atividade com uma importante relevância económica. Sem cartas marcadas, dualidade de critérios e atitudes persecutórias em relação a uns e um pachorrento conformismo com outros.

PONTINHOS. Uns a somar, outros a subtrair. A centralidade de Mário Nogueira nestas eleições europeias mede-se pelos impactos da crise dos professores na conjuntura política, num grande serviço prestado aos partidos da solução de governo: reforçou o primeiro-ministro, deu alento a BE e PCP para o mercado do descontentamento, acicatou os cidadãos contra os professores e vergastou a liderança do PSD, também ela enleada no labirinto das explicações da convergência negativa. Só os professores não somaram pontos, até ver.

Escreve à segunda-feira