Depois de uma greve de três dias que colocou os portugueses em filas intermináveis para conseguirem abastecer os carros, surge agora a hipótese de uma nova paralisação.
Ontem, o Sindicato Nacional dos Motoristas de Matérias Perigosas (SNMMP), a Associação Nacional de Transportes Públicos Rodoviários de Mercadorias (ANTRAM) e o Governo sentaram-se à mesa para dar início às negociações, mas a deceção foi grande. Quem o disse foi Pedro Pardal Henriques, vice-presidente do sindicato, acusando a ANTRAM de não querer negociar. “Lamento ter passado este prazo [para a ANTRAM estudar o acordo coletivo proposto pelo sindicato] e que não se chegasse aqui com uma conclusão”.
Do lado da ANTRAM, o presidente da entidade, Pedro Apolónia, garantiu que a proposta formal do novo acordo coletivo foi apenas entregue ontem durante a reunião. “Não consigo perceber”, disse Pedro Apolónia aos jornalistas em relação à hipótese de uma nova greve, dizendo ainda que a avaliação das propostas “não é sim ou não”.
Ao i, Pedro Pardal Henriques garantiu que “isso não é verdade” – a proposta não foi apenas entregue ontem. “Ao contrário daquilo que a ANTRAM fez, que andou a brincar durante este tempo em que nós interrompemos a greve por confiar nas pessoas, nós estivemos a trabalhar”, disse o vice do SNMMP.
As propostas, diz o sindicato que defende os motoristas de matérias perigosas, “são do conhecimento público” e, por isso, além da hipótese de nova greve, uma das formas de reivindicação que o SNMMP agora perspetiva passa também “por responsabilizar as declarações da própria ANTRAM, que cada vez que presta declarações diz inverdades”.
Antes do encontro, as expetativas dos intervenientes eram distintas. Se, do lado do sindicato, se esperava que logo na primeira reunião ficasse fechada a criação de uma categoria profissional para os trabalhadores, do lado da ANTRAM apenas se previa a organização das reuniões futuras, já que as negociações vão durar até ao final do ano.
Durante a reunião, a surpresa foi grande e o SNMMP garante não querer “perder tempo a fazer viagens ao ministério”. Por esta razão, a vontade do sindicato era parar por ali as negociações, não fosse o Governo a fazer o seu papel de mediador, conseguindo uma nova reunião no próximo dia 7 de maio. Se, nessa data, a ANTRAM continuar com a mesma postura – sem uma resposta concreta –, o sindicato vai “parar as negociações e avaliar as formas de reivindicação”, garantiu Pedro Pardal Henriques.
O acordo assinado no final da greve dos combustíveis é claro: ambas as partes comprometeram-se a um clima de paz social “abstraindo-se de formas de pressão, nomeadamente greves ou outras formas que possam pôr em causa a satisfação de necessidades sociais impreteríveis”. No entanto, como Pedro Pardal Henriques disse em entrevista ao Sol, “caso tal não aconteça [uma abertura para negociação], não nos restará outra opção senão a de continuar a nossa reivindicação, ainda que para tal seja necessário recorrer novamente a um pré-aviso de greve”. E disse mais: “O exercício do direito à greve é consagrado constitucionalmente e não pode ser afastado pelas partes, mesmo que o declarem”, disse o vice–presidente do SNMMP.
O que está em cima da mesa? Os trabalhadores que fizeram greve há cerca de duas semanas pedem agora uma remuneração bem acima da atual – pretendem passar dos 630 euros para os 1200 euros mensais. Além disso, a redução da idade para pedir a reforma e o subsídio de operação de matérias perigosas, de 240 euros, estão também em cima da mesa. São estes os pedidos que constam na proposta de acordo coletivo apresentada ontem à ANTRAM.
E, recorde-se, alcançar um novo acordo coletivo surge na sequência da insatisfação dos trabalhadores face ao acordo coletivo assinado em setembro entre a Federação dos Sindicatos de Transporte e Comunicação (FECTRANS) e a ANTRAM – motivo que acelerou a concretização da greve.
Outro sindicato que promete parar o país A par das reivindicações dos motoristas de matérias perigosas estão também os restantes motoristas de mercadorias – os dois sindicatos não concordam com o contrato coletivo assinado em setembro do ano passado entre a FECTRANS e a ANTRAM que, segundo defendem, prejudica os trabalhadores.
Depois da greve que levou os postos de abastecimento ao limite, o Sindicato Independente dos Motoristas de Mercadorias (SIMM) decidiu convocar uma paralisação que decorreu na semana passada. Ainda que com pouca adesão – a incluir apenas duas empresas de transporte –, este sindicato promete que não vai parar, sobretudo porque continua a não ser ouvido pela ANTRAM. Ao i, Anacleto Rodrigues, presidente do SIMM, explicou que nada tem contra os motoristas de matérias perigosas, mas é urgente que a ANTRAM ouça todas as partes. O SIMM não concorda com o facto de a ANTRAM “iniciar negociações com um sindicato só porque o sindicato fez greve e teve as consequências que teve”, disse Anacleto Rodrigues, adiantando que a ANTRAM deixou “o SIMM para trás”.
A última greve do sindicato que engloba todos os motoristas é, diz o presidente da organização, “uma chamada de atenção”. “Se ficarmos para trás, vão ter de enfrentar uma greve nacional em toda a tipologia dos transportes e, aí, as consequências serão muito maiores”, avisa Anacleto Rodrigues, uma vez que os profissionais em causa são responsáveis por transportar mercadorias para os supermercados, por exemplo.