Há mais de duas décadas que o Midwest não enfrentava um frio assim, com as temperaturas no norte da região a caírem cerca de 28 graus abaixo do normal, e sensações térmicas de 51 graus negativos. Foram quebrados recordes históricos em várias localidades. Milwaukee bateu o seu recorde absoluto de temperaturas baixas, em vigor desde 1899, por seis graus. As temperaturas chegaram aos 48,8 graus negativos, na quinta-feira passada, em Cotton, no Minesota.
Noventa milhões de pessoas, um terço da população dos EUA, estiveram perante temperaturas de 17 graus negativos. O frio causou mais de 20 mortos, devido à exposição aos elementos e a acidentes relacionados com as condições climatéricas. O Serviço Nacional Meteorológico dos EUA avisou que a baixa temperatura pode facilmente “congelar a carne sobre os ossos”. Recomendou que se “evite respirar fundo ou caminhar”.
No estado de Illinois, pelo menos 144 pessoas foram tratadas nas urgências por ferimentos relacionados com as condições climatéricas. “Esta é apenas a ponta do iceberg” considera Stathis Poulakidas, médico do hospital John H. Stroger Jr, em Chicago, acrescentando: “Vamos estar a amputar dedos e membros nas próximas duas ou três semanas”. Muitos destes doentes estavam a entrar em hipotermia, que ocorre quando a temperatura corporal desce dos 36,5 graus normais para menos de 35. “A temperatura desce ao ponto de o sangue parar de fluir e morre-se de hipotermia severa”, diz Poulakidas.
Estas condições extremas foram causadas pelo vórtex polar, um conjunto de ventos fortes que mantém o ar frio a grandes altitudes sobre o Ártico, e pode ser alterado por correntes quentes, desviando massas de ar frio para o sul. Os cientistas consideram que a vaga de frio que afetou os EUA foi causada por um corrente quente oriunda de Marrocos, que aumentou a temperatura no Ártico e “partiu o vórtex aos pedaços, que se começaram a mover”, disse Judah Cohen, especialista em tempestades do Instituto de Investigação Ambiental. O crescente degelo no círculo polar Ártico é outra causa apontada: sem essa barreira, aumenta a temperatura, o que interfere com o fenómeno do vórtex.
Um boletim da Associação Meteorológica Americana avisara há um ano que o vórtex polar está a ficar cada vez mais fragilizado. “Esta é uma história complicada, que envolve uma boa dose de caos e uma interação entre múltiplas influências, mas é um sinal claro de que o papel do sistema Ártico está a mudar”, explicou Jennifer Francis, uma cientista climática do Woods Hole Research Center.
“Os sintomas do aquecimento global são contraintuitivos para quem é apanhado no meio destas vagas de frio” considerou ainda a investigadora, apontando um lado positivo: “estes eventos são uma excelente oportunidade de ajudar o público a compreender alguns dos efeitos das alterações climáticas”. A tarefa não é facilitada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, firmemente cético das evidências científicas e do consenso dos cientistas quanto às alterações climáticas. Trump escreveu no Twitter acerca do vórtex polar: “O que raio se passa com o aquecimento global? Por favor volta depressa, precisamos de ti!”.
Apesar das recentes temperaturas extremamente baixas, este foi um janeiro mais quente do que a média nos EUA e a temperatura subiu rapidamente no fim de semana. “As vagas de frio do passado não se dissipavam tão rápido. Estamos a ir diretos para temperaturas de primavera”, notou Jeff Masters, da empresa Weather Underground.