Como se desenvolve uma pneumonia? Pneumologista esclarece as dúvidas da época

Como se desenvolve uma pneumonia? Pneumologista esclarece as dúvidas da época


Com o frio a apertar, o vice-presidente da Fundação Portuguesa do Pulmão, Jaime Pina, debruça-se sobre as diferenças entre constipação, gripe e infeções respiratórias e explica ao i os cuidados a ter


Qual a diferença entre constipação e gripe?

Em Portugal temos o hábito de dizer que estamos engripados quando estamos constipados. E confundimos duas doenças completamente diferentes, mas que são ambas viroses: a constipação e a gripe. A constipação é uma doença benigna, provocada por um vírus chamado rinovirus e que afeta exclusivamente a parte alta do aparelho respiratório. O nariz fica congestionado, com pingo, e pode arder um bocadinho a garganta porque também se faz acompanhar muitas vezes de faringite, mas é uma doença que se resolve por si mesma e que tem pouco impacto na saúde – as pessoas constipadas podem continuar a trabalhar, não se acompanha de febre e ninguém morre de uma constipação.

E a gripe?

Na gripe, é tudo ao contrário. É uma doença séria, severa, com muita febre e com sintomas gerais – dói o corpo, doem as articulações, doem os músculos. Também tem os mesmos sintomas da constipação no que diz respeito à parte alta do aparelho respiratório, mas é uma doença que mata. Por exemplo, todos os anos, na Europa, morrem em média 38500 pessoas com gripe. Em Portugal, a média é 2400. E no mundo inteiro, todos os anos, chegam a morrer entre 250 mil a 500 mil pessoas com gripe. A gripe é provocada por vírus da família influenza, que são vírus que matam, ao contrário do da constipação.

As infeções respiratórias têm aumentado? 

Sim. Há mais infeções respiratórias, sobretudo por três motivos. Em primeiro lugar, cada vez mais temos uma população mais idosa e essa população tem as suas defesas diminuídas, como é natural. E portanto, à medida que a nossa sociedade for uma sociedade que vai envelhecendo – Portugal é o segundo país da Europa com mais idosos -, é evidente que vêm mais ao de cima essas infeções respiratórias. Outro motivo é os nossos modelos de vida. Nós há uma ou duas gerações vivíamos muito ao ar livre e aos fins de semana íamos passear. Agora o que é que fazemos aos fins de semana? Vamos para os centros comerciais, para os cinemas. E portanto, como vivemos todos em maiores concentrações de pessoas e em circuitos fechados, isso também é um bom motivo para termos mais infeções respiratórias, porque elas transmitem-se de pessoa para pessoa. Ao ar livre é muito difícil, dentro de uma divisão é muito fácil. A terceira causa são os ares condicionados, que espalham as bactérias e transmitem as infeções.

Que tipo de infeções respiratórias existem? Há alguma mais prevalente? 

As infeções mais frequentes são as rinofaríngeas, do nariz e da faringe. Em termos de maior gravidade, temos as bronquites e as pneumonias. Na televisão, sempre que há um acidente de automóvel mortal, a notícia abre o telejornal ou está lá no meio, e todos os dias em Portugal morrem menos de duas pessoas nesse tipo de acidentes. E temos todos os dias nos meios de comunicação, e muito bem, campanhas de prevenção rodoviária. Pois de pneumonia? Morrem 25 pessoas por dia, que é muitíssimo mais.

Como se desenvolve uma pneumonia? Pode ser a partir de uma gripe? 

Pode. E voltando à gripe, a gripe mata sobretudo por dois motivos. O primeiro, porque descompensa doenças que já existem: as cardíacas, as renais, a diabetes. A pessoa morre por descompensação dessas doenças. A outra forma, tem que ver com as próprias complicações da gripe, quando a infeção se realiza ao nível de órgãos vitais: do cérebro – a chamada encefalite -, do coração – a chamada miocardite -, mas sobretudo do pulmão. Ou seja, o vírus da gripe pode infetar o próprio pulmão, dando origem a uma pneumonia que é talvez a principal causa de mortalidade da gripe.

Há quem diga que na base da pneumonia pode estar uma gripe mal curada. É uma ideia errada? 

As gripes mal curadas são aquelas gripes em que a pessoa não teve cuidado. Por exemplo, quando nós temos uma gripe, temos uma doença febril, com febre alta. Ora, quando se tem uma febre alta, a pessoa não deve sair de casa. Não deve ir trabalhar por vários motivos: um deles é para não contagiar outras pessoas. Mas, por outro lado, é também para não favorecer o aparecimento destas complicações de que estamos a falar. Portanto, muitas vezes os problemas das gripes mal curadas não advêm de gripes mal curadas. Advêm de gripes em que a pessoa não teve os procedimentos corretos durante a doença e então a doença complica-se. Existem outras situações, também, em relação às infeções respiratórias: a pessoa pode curar-se do problema, mas ficar com sequelas respiratórias. Ou seja, quando a pessoa tem uma pneumonia ou uma bronquite, nem sempre depois de fazer o tratamento fica completamente bem: pode ficar com cicatrizes nos pulmões, e como qualquer outra cicatriz é para o resto da vida.

Que tipo de cuidados podemos ter nesta altura em que o frio está mais acentuado para evitar gripes, infeções respiratórias, etc..? 

Há dois cuidados que são fundamentais. O primeiro é a pessoa estar vacinada contra as infeções respiratórias, e nós temos três vacinas respiratórias: a da gripe, que se deve fazer todos os anos porque o vírus muda todos os anos, a da pneumonia e existe ainda um conjunto de remédios que normalmente se administram por via oral que estimulam as defesas do organismo. E portanto um organismo que esteja mais estimulado do ponto de vista da imunidade resiste melhor às infeções respiratórias. Depois, existem duas situações que diminuem a possibilidade se ter infeções respiratórias. Ter o cuidado de estar o menos possível ao pé de gente doente é uma delas. Em Portugal não temos o hábito de usar mascara, mas se formos à Ásia vemos muita gente a usar e é extremamente eficaz para que a pessoa não transmita vírus e bactérias e não os receba. Além disso, é preciso não estar muito tempo exposto ao frio, porque o frio provoca uma inflamação no aparelho respiratório que favorece a ação dos vírus e das bactérias.