EUA. “Os centros de detenção não são lugar para uma criança”

EUA. “Os centros de detenção não são lugar para uma criança”


Uma segunda criança em custódia das autoridades norte-americanas morreu no Natal. Chamava-se Felipe Alonso Gómez e tinha oito anos


Uma segunda criança morreu sob custódia da agência norte-americana de Alfândega e Proteção de Fronteiras. Chamava-se Felipe Alonso Gómez, era guatemalteca, tinha oito anos e faleceu no dia de Natal, depois de ter recebido alta do hospital em Alamogordo, no Texas, onde lhe foi diagnosticada uma “simples constipação” e febre. Os profissionais de saúde receitaram-lhe medicamentos e entregaram-no, com o pai, novamente às autoridades norte-americanas. Horas depois, o rapaz começou a ter náuseas e a vomitar, sendo de imediato levado para as urgências do mesmo hospital. Morreu nas primeiras horas de segunda-feira, sem que as causas tenham sido ainda apuradas. Uma semana antes tinha atravessado a fronteira entre o México e os EUA sem autorização, acabando detida com o seu pai a 18 de dezembro. 

O caso poderia ser uma exceção, mas vem levantar renovadas suspeitas sobre as condições em que vivem os imigrantes – principalmente as crianças – nos centros de detenção norte-americanos. A sua morte juntou-se à de uma outra menina guatemalteca de sete anos, Jakelin Caal, quase dois dias depois de ser detida. Após ter atravessado a fronteira com o seu pai, Jakelin faleceu por desidratação e choque – e padeceu dos mesmos sintomas de Felipe Alonso Gómez. A agência de Alfândega e Proteção de Fronteiras argumentou que a criança tinha passado vários dias sem comer e beber  antes de ser detida pelas autoridades, mas a família contesta a versão oficial, afirmando que estava bem de saúde quando chegou aos EUA. O pai, Nery Caal, de 29 anos, chegou inclusive a assinar um documento em que atestou a boa saúde de Jakelin aquando da sua detenção. 

“Ele foi muito claro, muito consistente de que a sua filha estava bem de saúde e que queria muito ir com ele [para os EUA]”, garantiu Ruben García, fundador e diretor-executivo da Annunciation House, organização que ajuda imigrantes, ao “Washington Post”. 

As mortes poderão estar relacionadas com as condições em que as crianças foram mantidas – milhares dormem em tendas e em celas. Os tribunais norte-americanos impedem que a agência federal detenha as crianças por mais de 72 horas. Para contornar a lei, as autoridades mudam-nas de local para não ultrapassarem esse limite. Felipe Alonso Gómez estava detido há mais de 130 horas quando morreu. “Há  falta de responsabilização pelos detidos por pensarem que não ficarão muito tempo nas suas mãos, estando sempre a movê-los para um próximo local. E é aí que a falta de cuidados pode acontecer”, explicou Ruby Powers, advogada e membro da Associação Americana de Advogados de Imigração. “Sei que é suposto estar chocada, mas sabendo tudo o que sei, não estou”. 

“A realidade é que os centros de detenção não são lugar para uma criança, particularmente para uma doente”, acrescentou a congressista republicana Lucille Roybal-Allard ao “Washington Post”. Mais de 14 mil crianças e adolescentes imigrantes sem documentos estão detidos pelas autoridades de imigração dos EUA, entre as quais milhares separadas dos pais. 

No entanto, o Departamento de Segurança Interna recusa as acusações de negligência e condições desumanas como possíveis causas de morte, garantindo que dão comida e água aos detidos. No entanto, os sintomas da rapariga guatemalteca não se coadunam com essa garantia. Ontem, a Alfândega e Proteção de Fronteiras ordenou check-ups a todas as crianças nos seus centros de detenção. 

O governo guatemalteco já foi notificado da morte da rapariga e exigiu uma investigação “de acordo com o devido processo”. Jakelin foi enterrada no dia de Natal na sua terra, na Guatemala.