Tecnologia, inovação, startups, investimento. A terceira edição do Web Summit pode resumir-se a estas palavras. Durante quatro dias cerca de 70 mil pessoas concentraram-se no Parque das Nações para discutir o futuro e talvez decidir parte dele. Desde o primeiro minuto as conferências com os gigantes da tecnologia focaram-se em temas chave como a Inteligência Artificial, a privacidade e, sobretudo, os riscos da velocidade do futuro. No final, Paddy Cosgrave, o fundador do Web Summit, decidiu que o nosso país é ideal para viver e vai mesmo mudar-se para Lisboa. Desde António Guterres, passando por Luisão, Atenas, Tinder, até ao robot Sophia, foram muitos os pontos altos da edição.
Qual é o rumo da inovação? Estamos mesmo cientes dos perigos? António Guterres esclareceu logo no primeiro dia da edição que não estamos preparados. “Hoje vemos muitos trabalhos a serem criados e muitos a serem destruídos. E claro, não estamos preparados para isto”, disse o secretário-geral das Nações Unidas, que além disso ainda deixou um aviso: “Máquinas com poder para tirar vidas humanas são politicamente e moralmente inaceitáveis e devem ser banidas pela lei internacional”.
Fotografia de Carlos Álvares
Lei foi também o mote para a subida ao palco da comissária europeia para a Concorrência. “Este é o sítio onde se molda o futuro, um futuro que evolui tão rapidamente que ninguém consegue dizer que tipo de tecnologia vamos ter daqui a 20 anos”, disse Margrethe Vestager no início do seu discurso dominado pela importância da privacidade. A comissária pode não saber onde nos levarão as tecnologias nos próximos anos, mas uma certeza tem: vão mudar as nossas vidas. A evolução também tem o poder de fazer o bem, mas “com grandes poderes, vêm grandes riscos”. Depois do escândalo com a gigante Google este ano, marcado pela multa recorde de 4.340 milhões de euros aplicada pela Comissão Europeia em julho, Margrethe deixou o recado à empresa: “Porque é que todos os dados têm de estar na mão de uma só empresa? Não interessa o que a Google já fez para os avanços da internet. Não podemos olhar para o lado quando mete em risco a concorrência”.
O tema da privacidade não ficou por aí. Christopher Wylie, o ex-funcionário da Cambridge Analytica que denunciou a utilização não autorizada dos dados de milhões de utilizadores do Facebook para a definição de mensagens dirigidas, falou sobre os perigos a que a privacidade dos cidadãos está sujeita e o que fazer para combater esses riscos. “O Facebook está a criar um clone digital da nossa sociedade”, disse Wylie, acrescentando que “quando começamos a pôr toda a informação em sistema de inteligência artificial, começamos a criar armas”.
Desporto tecnológico Luisão esteve presente e falou sempre em português e de que forma a tecnologia o apoiou a manter-se nos relvados até aos 37 anos. O desportista afirmou que qualquer jogador tem de aceitar a tecnologia e que esta o ajudou a responder a três perguntas fundamentais: “Onde preciso de melhorar? Porque preciso de melhorar? E como posso melhorar?”. Também o CEO do Grupo Benfica, Domingos Soares de Oliveira, concordou com o jogador e deu exemplos. “Hoje conseguimos analisar o sono dos nossos jogadores através de um relógio”, disse.
Jorge Mendes foi também um dos protagonistas. Recebeu o prémio de inovação no desporto e destacou Cristiano Ronaldo e José Mourinho como as peças fundamentais no nosso país, afirmando ainda que Ronaldo “é o melhor jogador do mundo” e “merece a Bola de Ouro”. Quanto ao futuro de Portugal nas competições mundiais, Jorge Mendes garantiu que temos atletas para vencer o próximo campeonato europeu.
Fotografia de Carlos Álvares
A cidade inovadora Atenas foi considerada a cidade mais inovadora da Europa e levou para casa o prémio de um milhão de euros, entregue pelas mãos de Carlos Moedas, Comissário Europeu para a Investigação, Ciência e Inovação. A capital grega, marcada pela crise económica e social dos últimos anos revelou que não se deixou influenciar pelas contas negativas e foi capaz de dar a volta. “Através de inovação, Atenas encontrou um novo rumo para dar a volta. É a prova de que não são as dificuldades, mas sim a maneira como se cresce a partir delas que interessa”, disse o comissário europeu. Além da criação de startups, Atenas foi escolhida como a capital de Inovação por “assegurar que as ideias provenientes da sociedade civil são tidas em conta pelo poder político”. A criação do Polis é um exemplo claro. Um projeto de revitalização de edifícios abandonados que são transformados em pequenas empresas, comunidades criativas ou residências. Lisboa era uma das cidades nomeadas, mas acabou por não passar à fase final.
Inteligência artificial com sentimentos? A dominar o terceiro dia do evento esteve a inteligência artificial e no centro do palco principal esteve o robô Sophia, acompanhado pelo amigo Han, também criado pela SingularityNET. Ben Goertz, o cérebro dos dois robôs, explicou que ao longo do último ano tentou desenvolver a capacidade de os robôs poderem expressar emoções e de olhar para um humano e detetar qual o estado de espírito. Na exemplificação, Sophia manifestou tristeza, felicidade e raiva, comportamentos que levaram dezenas de pessoas a correr para junto do palco. A questão da cidadania nos humanoides não ficou esquecida e Ben pediu aos robôs para darem a sua opinião. Sophia disse logo que concordava e Han acha que “é uma questão de tempo”.
Fotografia de Carlos Álvares
Até ao próximo ano “Cá estamos nós quase a dizer adeus”. Tal como no ano passado, Marcelo Rebelo de Sousa encerrou o evento e, desta vez, com conselhos sobre paz e multiculturalismo: “Temos de lutar pelos princípios da liberdade, do multilateralismo, da paz, para algo que seja bom de viver no mundo inteiro. Essa é a mensagem. Levem-na para o resto do mundo. Não deixem as vossas mensagens só para vocês”.