Inquérito sobre orientação sexual “excede a dignidade humana”, diz psicóloga

Inquérito sobre orientação sexual “excede a dignidade humana”, diz psicóloga


Ministério da Educação já está a investigar inquérito sobre orientação sexual que foi feito a alunos de 9 anos numa escola no Porto 


“Namoras atualmente?”, “já namoraste anteriormente?”, “sinto-me atraído por: homens, mulheres ou ambos”. Estas foram algumas das questões colocadas a alunos do 5.º ano – que têm 9 anos – da Escola Francisco Torrinha, no Porto, no âmbito da disciplina Cidadania, e que estão a causar polémica.

Ao i, Carlos Farate, psicanalista e psiquiatra da infância e adolescência, disse que este inquérito “é inadequado (…) porque nesta idade as crianças não têm ainda a noção das coisas ligadas à sexualidade”.

Segundo explicou o especialista, este tipo de inquéritos, antes de chegarem à mão dos inquiridos são “avaliados no plano ético” e quando há crianças envolvidas, normalmente os pais têm de autorizar a realização dos mesmos.  

Apesar da polémica que se tem gerado, Carlos Farate, disse ao i que as perguntas não terão um efeito traumático nas crianças. E, apesar de desconhecer o que a escola pretendia com este inquérito, tendo em conta o público alvo, considerou que o questionário é “disparatado e não tem a mínima credibilidade no plano científico nem no plano social”.

Ana Vasconcelos, pedopsiquiatra, em declarações ao i disse que, apesar de não saber em que contornos é que as questões foram feitas, estas são de “uma indignidade imensa” e que “excede a dignidade humana”. “Em princípio não é uma pergunta que se possa fazer” a ninguém, “muito menos a uma criança”, completou.

Os pais, segundo a pedopsiquiatra, devem ser os primeiros a ter conhecimento deste tipo de questões, antes de estas chegarem aos seus filhos.

Quanto a possíveis traumas, Ana Vasconcelos diz que esta situação não terá um grande impacto nas crianças.

Agora é necessário “pedir explicações à escola” para “se tentar compreender” o porquê daquele questionário, referiu a especialista.

Ontem, o Ministério da Educação (ME) fez saber que, apesar de desconhecer a situação, já pediu explicações à escola para averiguar o caso. Questionada pelo i sobre o assunto, a escola disse que não presta quaisquer declarações sobre o assunto. Já a associação de pais da escola Francisco Torrinha, revelou ao i que “confia bastante na escola” e que este caso se trata de um “caso isolado”, estando o assunto a ser “devidamente tratado”.

Ao “Diário de Notícias”, a associação de pais revelou que o professor apenas tomou conhecimento do conteúdo do documento quando o entregou, porque este foi realizado “por uma associação externa à escola”.

A associação também confirmou que foi pedida uma autorização prévia aos pais para que os alunos frequentassem esta disciplina, mas que estes não sabiam da existência e conteúdo deste inquérito.

Rui Martins, presidente da Confederação Independente de Pais e Encarregados de Educação (Cnipe), lamentou o sucedido: “Lamento como pai que estas coisas sejam levadas de ânimo leve e que não sejam pensadas previamente para evitar este tipo de inquéritos”. Ao i disse ainda que a Cnipe não recebeu queixas semelhantes de outras escolas, acreditando que se trata de um assunto isolado. 

Jorge Ascensão, presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap), também revelou ao i que não receberam denuncias de outros casos, mas que esta situação “levantou alguma preocupação” aos pais. Perante as reações que têm recebido, o responsável diz que tudo indica que este inquérito tenha sido feito “sem conhecimento parental”, afirmando que não compreende como isso aconteceu.

 

Inquéritos polémicos

Este não é o primeiro inquérito escolar a causar polémica. Em setembro os pais de vários alunos de escolas de Lisboa e Porto foram confrontados com um questionário sobre a sua origem étnica – as opções de resposta eram: “portuguesa, cigana, chinesa, africana, Europa de Leste, indiana, brasileira ou outra”. O caso foi denunciado ao Alto Comissariado para as Migrações, à Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial e à secretária de Estado da Cidadania e Igualdade por ter sido considerado racista.