Nesta segunda parte de uma longa entrevista, o arquiteto diz que o seu mais icónico projeto está ultrapassado e que gostaria de fazer algo ainda mais arrojado no local. Sobre o interior do centro comercial diz que lhe faz lembrar um bordel chinês.
Disse que considera Siza um grande arquiteto. Mas a arquitetura dele está nos antípodas da sua, ou não?
Sim. Não tem nada a ver com a minha. Os arquitetos não têm que fazer uma arquitetura igual uns aos outros, embora atualmente a tendência seja 90% dos arquitetos fazerem uma arquitetura… minimalista. O minimalismo tem uma raiz no neo-brutalismo, que surge a seguir à II Guerra Mundial, e porquê? Porque as indústrias estavam todas destruídas, e o que se podia fazer era uma arquitetura mais simples, com menos exuberância. O Siza, segundo creio – não tenho a certeza, mas quase -, ficou ligado a uma arquitetura do Norte da Europa onde pontificava o Gunnar Asplund e o Alvar Aalto. A melhor obra do Siza, eventualmente, são as piscinas de Leça, que são uma obra neo-brutalista pura, independentemente de serem muito bonitas. Para mim, o Siza é um grande arquiteto porque tem uma raiz filosófica por trás, tem uma ética, tem uma relação com o mundo da arquitetura, com o mundo das formas, não faz por fazer. Esta relação com a história da arte e da arquitetura é condição sine qua non para ser considerado um grande arquiteto. Pode-se inspirar num projeto ou noutro deste ou daquele arquiteto, e inventa. Nunca é uma cópia.
Trabalhou como desenhador para outros arquitetos. Quando é que começa a desenvolver a sua linguagem, e essa ousadia que se nota nas suas obras?
No quarto ano da escola. Fui convidado para ir trabalhar no ateliê do Conceição Silva e do Maurício de Vasconcelos, que de repente obteve uma encomenda de 70 ou 80 trabalhos. Foi quando começou a falar-se do turismo do Algarve. E portanto eles tiveram necessidade de recrutar arquitetos, de preferência arquitetos jovens, e quem é que andava a recrutá-los? Eram já arquitetos que estavam a trabalhar com eles. Eu fui recrutado por um colega que era o Jorge Soares de Oliveira, eu estava no quarto ano e ele estava no quinto, mas conhecia bem a minha arquitetura, a minha maneira de pensar, e levou-me ao ateliê deles. O Maurício ia caindo, porque ele não me via há seis ou sete anos, e a última vez que me viu foi como moço de recados dele e agora estava-me a ver como um dos melhores alunos da faculdade, naquela altura a Escola de Belas Artes. No dia 1 de maio de 1964 o ateliê abriu. Como? Abriu uma porta, mas a porta dava para uma escada que estava cheia de arquitetos, entrámos pelo menos 15 ao mesmo tempo. Eles tinham uma mesa comprida semelhante a esta, o Conceição Silva sentou-se à cabeceira, o Maurício ao lado, e todos nos distribuímos à volta da mesa. O Conceição Silva tinha um molho de dossiês, que eram programas para trabalhos. “Você como é que se chama?”. “Chamo-me não sei quê”. “Pronto, vai fazer um aparthotel em Quarteira”. Chegou à minha vez. “Como se chama?”. “Tomás Taveira”. “Vai fazer um hotel na Balaia”. Foi assim que começou a minha profissão a sério como arquiteto. Eles davam-nos liberdade total, embora às vezes houvesse uns diálogos mais crispados, mas nada de especial.
Não havia uma linha do ateliê?
Não. Cada um fazia o que lhe apetecia, de acordo com aquilo que imaginava que era mais adaptado. O hotel da Balaia foi a minha primeira obra, as moradias da Balaia, que eram inspiradas nas casas algarvias, embora olhando para elas não se veja lá Algarve nenhum, foram a segunda. Depois acabei uns apartamentos que tinham sido começados por um arquiteto que já faleceu, e que era talvez o mais talentoso arquiteto da nossa geração, o Manuel Sheppard, que cantava fado como pouca gente. O Manuel Sheppard influenciou-me muito porque estava culturalmente ligado à arquitetura inglesa, que estava a fazer a viagem do neo-brutalismo para uma arquitetura mais… Não é pós-moderna, mas uma arquitetura mais libertária, com elementos icónicos extremamente retóricos. Por exemplo há uma obra do James Stirling, os laboratórios de engenharia da universidade de Leicester, que tem um auditório saliente do edifício apoiado num tubo de vidro (risos).
Uma arquitetura com sentido de humor, portanto.
Nem mais. Aí começa a viragem que mais tarde fundou o pós-moderno. O James Stirling foi inicialmente, e praticamente até à morte, um arquiteto profundamente ligado à antropologia cultural, mas com estes laivos de brincadeira. Tive a sorte de o ter conhecido na Bienal de Veneza. Lá vem mais uma história para vocês contarem aos vossos netos. O James Stirling teve uma doença qualquer – ele era um tipo enorme, corpulento, e a certa altura estava um palito, e toda a gente ficou muito preocupada com ele. Quando chega à Bienal de Veneza já estava outra vez gordíssimo, e então o meu editor, um grego com graça, perguntou-lhe: “Então James, o que aconteceu, já estavas todo elegante, todo fininho…” E o Stirling: “Eu olhava para o espelho e não me via a mim, via outro, então tive que voltar ao que era antigamente”. Na altura a Bienal de Arquitetura de Veneza não era comercial, como é hoje, que serve para os países irem lá vender o produto ou os arquitetos que acham melhores. Era muito desportivo, as pessoas todas encontravam-se, alegremente, assim num ambiente muito descontraído mas culto. Não se falava de futebol – ou se se falasse de futebol era eu (risos). Acho que também foi nessa bienal que um jornalista jovem se volta para o James Stirling e diz assim: “Achas que para ser bom arquiteto é preciso ser bom desenhador?”. O James fica a pensar. “Não sei se para se ser bom arquiteto é preciso ser bom desenhador, mas há uma coisa que eu sei: todos os bons arquitetos que conheço desenham muito bem”. O que é verdade. Porque o primeiro estado da criação arquitetónica é muitas vezes o desenho à mão de uma ideia, e vice-versa, às vezes sai da mão também para a cabeça.
Conheceu outros arquitetos célebres?
Muitos. Quando fui para os EUA com uma bolsa do governo de lá fiz um PhD [doutoramento] no MIT, que durou dois anos. Depois fui convidado a dar aulas no MIT, no departamento de estudos urbanos e territoriais, e eu não aceitei porque não queria ser urbanista, queria ser arquiteto, então vim-me embora.
Isso em que ano, mais ou menos?
Em 1976/77. Mais tarde é que fui convidado para fazer uns seminários em Pasadena, na Califórnia, andei por ali naqueles circuitos esquisitos. E acontece-me uma coisa engraçada. Algum de vocês conhece a Lili Caneças?
Não.
A Lili Caneças era uma mulher linda, um estrondo. Um dia estava eu a dar aulas em Pasadena e vêm-me chamar porque estava uma senhora portuguesa a perguntar por mim. Era a Lili Caneças. “Oh Lili, o que é que se passa contigo, enlouqueceste?”. Fomos almoçar na cantina da universidade e a Lili ficou logo rainha daquilo tudo. O que é que a Lili ia lá fazer? Era para me pedir para ajudar o filho dela a fazer um portefólio decente para entrar numa escola de arquitetura em Los Angeles. E eu ajudei, mandei-o para San Diego, onde tinha dois amigos que o ajudaram a fazer o portefólio. Ele tirou o curso em Los Angeles e depois voou pelos seus próprios meios, fez trabalhos muito bons. Mas isto vem a propósito de…
Se conheceu grandes arquitetos…
Conheci a nata da arquitetura e do design. Los Angeles era a pátria do design. Conheci o Frank Gehry, o Peter Eisenman, que ainda está vivo, o Michael Graves, que fez o célebre Portland Building, que é, para mim, o nascimento do pós-moderno. O Michael Graves esteve cá em Portugal a convite meu num seminário que organizei na Faculdade de Arquitetura. Vieram cá pessoas fabulosas. Além do Michael Graves, o Peter Eisenman, o Mário Botta, o Franco Purini, italiano… O impacto desta gente na minha arquitetura foi muito grande e de alguma maneira houve também uma passagem do nosso espírito para eles. Porque alguns deles nunca tinham ouvido falar no Bernini, por exemplo. E depois eu puxava as conversas sempre para o meu lado, para o sentido histórico, para o sentido de articular aquilo que se fazia com o barroco. No fundo eu sou um arquiteto barroco. Mais do que pós-moderno, embora tenha rompido com muitos dos mitos da arquitetura moderna. E então ultimamente os projetos que estou a fazer são perfeitamente barrocos.
O sentido de escala também se alterou com a sua passagem pelos Estados Unidos? Quando a gente olha para as Amoreiras, não é uma escala que existisse na arquitetura portuguesa.
Essa escala eu apanhei-a nos EUA. Aprendi muito nos EUA, até situações pseudo-ridículas. Por exemplo, parti a mão aos murros em cima desta mesa numa reunião com os patrões das Amoreiras, para eles não venderem o shopping. Tinha aprendido isso com um senhor que era gerente de um shopping em Houston: nunca se vende um shopping. A malta abre um shopping, depois vem um outlet e as lojas vão à falência. Melhor! Os que vêm a seguir pagam mais caro. E então os preços foram subindo. Não é assim? Eles queriam vender o shopping, mas com o dinheiro que ganharam, que eu saiba, já fizeram dez ou mais.
O segredo é arrendar as lojas.
O segredo é fazê-los falir para alugar depois mais caro (risos).
Andou a visitar shoppings lá fora antes de desenhar as Amoreiras?
Sim, sim. Para preparar a minha tese de doutoramento fiz uma viagem muito grande nos EUA, andei um mês ali entre uma costa e a outra. A tese de doutoramento era uma coisa muito complicada – complicada por mim, não é que a faculdade de arquitetura fosse uma coisa muito complicada, pelo contrário, era um passador. Mas eu queria fazer uma coisa a sério. A minha tese tinha uma parte sobre o James Stirling, tinha uma parte que era puramente teoria, onde pontificava o Roland Barthes, o Umberto Eco, o Luigi Paresso, que era um papa da filosofia da escola de Turim. Depois vou para o MIT, depois vou dar aulas, de repente penso: ‘É preciso fazer umas torres para romper com este clima de ruralismo de Lisboa’.
Era um marasmo?
Não, era rural. Agora está a ficar um rural sofisticado. Um IKEA mais bem pintadinho. Vai à Baixa, o Cristiano Ronaldo – conhecem?
Já ouvimos falar.
Sabem que é rico, não é? Fez um hotel.
O CR7 Corner.
Do ponto de vista da cultura é zero. Não faz sentido, ou faz? Faz, porque ele está integrado neste mainstream em que os fundos absorveram a arquitetura. O importante é engraxar as fachadas e lá dentro põem uma cama com mais sofisticação, uma cadeira mais bonita, um sofá mais assim ou mais assado, uns LEDs. Uma saloiice total.
O que é que o arquiteto Taveira teria feito naquela esquina?
O mesmo que fiz em Mértola. Tudo em aço.
Quando chegou lá imaginou logo outro cenário?
É tão fácil. Não é preciso ser um génio para perceber que este tipo de arquitetura está a matar Lisboa. Eu já não vou estar cá. Os vossos netos é que vão perguntar: ‘O que é que fizeram nesta cidade?’.
Não vê edifícios de que gosta? Por exemplo o museu da Fundação EDP.
O museu, do ponto de vista icónico, é muito bonito. Internamente é fraco.
E o Museu dos Coches, o que lhe parece?
Tire-me isso da frente. Um pavor!
Disse que teria feito uma coisa diferente onde hoje está o hotel CR7 Corner. O facto de a Baixa estar assente sobre estacas não condiciona o que se pode ou não fazer?
Não. Pode fazer o que quiser. Quando queriam construir o Grand Central Terminal em Nova Iorque, havia lá uma torre enorme. Sabe o que é que fizeram? Levantaram a torre com macacos, construíram a estação e depois baixaram a torre. As técnicas construtivas têm segredos que permitem tudo. Mas custam dinheiro.
Quem viu as obras do Metro no Cais do Sodré não ficou com essa sensação. Estava sempre a entrar água…
Quando as obras não são bem organizadas tudo pode acontecer. Mas das estações de metro só conheço a das Olaias… Vou contar outra história. Uma vez fui convidado para ir fazer uma conferência à escola de arquitetura de Estocolmo. Um anfiteatro à vontade com 800 a mil pessoas. Cheio para ver o herói. Ao fim de cinco minutos de eu estar a mostrar os slides começaram a sair. Acabei sozinho com a embaixadora. E depois disse: ‘A senhora não se quer ir embora?’. E ela diz-me: ‘De facto estou um bocadinho atrasada…’ Fiquei sozinho! (risos)
Percebeu o porquê dessa debandada?
Percebi. Naquela altura já o pós-modernismo estava a ser ‘afogado’ pelo realismo crítico, que é uma coisa inventada por um senhor chamado Kenneth Frampton, um indivíduo poderoso que tem feito muito mal à arquitetura. Tivemos uma discussão de morte em Los Angeles, ele nunca mais me perdoou. Aquela geração que estava ali nem sonhava que existia o pós-moderno. Aparece-lhes aquilo cheio de cores e eles pensam: ‘Vamo-nos mas é embora’. Acho isto delicioso.
Mas na altura não deve ter achado muita graça…
Eu?! Sou a pessoa com o maior sentido de humor que possa imaginar. O que queria que eu fizesse? Que desatasse aos tiros? ‘Não sai daqui ninguém!’ (risos) Eu percebo a sensibilidade de uma assistência. Tenho muita prática, são quarenta e tal anos de aulas em várias partes do mundo. Ainda na semana passada fui fazer uma conferência à Gulbenkian sobre a cor. Estava 60/70% do auditório ocupado. A média das idades devia ser 70 anos. Ninguém percebeu nada do que eu disse, não foram capazes de fazer uma pergunta. Acabei e saiu toda a gente.
E isso não o desgosta?
Só me desgostou ter apanhado uma boleia que me obrigou a andar dois quilómetros ao sol quando podia ter apanhado um táxi direto para o ateliê.
A propósito de ter falado na cor: disse um dia que foi com as Amoreiras que “tanto as pessoas comuns como pessoas com uma certa responsabilidade no Estado – e até uma certa intelligentsia – descobriram que não eram daltónicas”.
Sim, sim…
Hoje já somos um país menos daltónico?
Vocês veem cor em algum lado? Há algum edifício com cor? Eu não vejo. Desde o meu BNU, ou a Malha J de Chelas, que não vejo cor.
Então ainda somos um país daltónico.
É verdade. Enquanto o Siza não usar cor, ninguém usa.
Ou enquanto não apostarem mais nos seus projetos…
Já não há tempo. Esta nova geração [de arquitetos] é uma geração forte, larga – há mais de 40 mil arquitetos. Esta enormíssima massa de criadores vai continuar a fazer arquitetura sem cor.
Mas houve uma altura em que havia duas correntes – uma mais minimalista, outra mais pós-modernista. Chegou a ter seguidores. Via-se moradias, prédios que eram claramente influenciados pelo seu trabalho.
Mas não eram seguidores cultos. Eram imitadores, que é uma coisa diferente.
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Acha que isso fez mal ao seu legado?
Não. Não tem importância nenhuma. Algumas pessoas irritaram-se mais, só isso. ‘Lá andam estes gajos…’
… a fazer ‘taveiradas’.
Nem mais. Eram umas coisas, digamos… mais fadistas. Atenção que não tenho nada contra o fado.
Nos últimos anos vimos que houve alterações no interior do shopping das Amoreiras, no sentido de tornar o ambiente mais escuro, uma coisa mais sóbria. Como viu isso?
Aquilo sempre me fez lembrar um bordel chinês.
Não vê vantagem, portanto…
Vejo vantagens nos bordeis chineses, naquilo não.
Já esteve nalgum?
Num bordel chinês? Nunca estive. Mas vejo nos filmes. Eu aprendo muito com os filmes. É nojento!
Deixou de ir ao shopping?
Eu nunca frequentei o shopping das Amoreiras, porque não faço compras.
Quando olha hoje para as Amoreiras o que é que sente?
Não olho.
Nunca pensa: ‘Como é que eu fiz isto?’
Pelo contrário, o que me apetecia era deitar aquilo abaixo e fazer ali outra coisa. Hoje fazia uma coisa ainda mais retórica, ainda mais cidade.
Não gosta do que vê?
Está ultrapassado. É um objeto icónico e que do ponto de vista da cidade teoricamente vai ser eterno, mas do ponto de vista da minha arquitetura está ultrapassado. Hoje a grande tendência são edifícios híbridos, que têm parque de estacionamento, shopping, escritórios, habitação e hotel.
Todos os edifícios ficam ultrapassados se o arquiteto evoluir. O Partenon também está ultrapassado…
Eu não me importava nada de o reconstruir (risos). A propósito, uma vez fui entrevistado na RTP pelo Miguel Sousa Tavares…
De quem já disse que não gosta…
Não gosto porque é muito arrogante. Nessa entrevista começou com a coisa das cores, a dizer que Portugal é um país branco. Eu disse docemente: ‘Você vai ao Alentejo e vê as ombreiras das portas e as barras são azuis, cor de rosa, amarelas’. E ele: ‘Não senhor, é tudo branco’. Eu pensei: ‘Não vais sair daqui vivo’. E disse-lhe: ‘De que cor é que era o Partenon?’. Ele disse logo: ‘Branco!’. Respondi-lhe: ‘Era banhado a ouro, azul, tinha trinta mil cores’. Acabou ali a entrevista. Levou com o Partenon em cima – e o Partenon é pesado…
Mas voltando às Amoreiras, o que diz é que não se revê no que lá está?
Não é bem isso, está a ver… Se perguntasse ao Picasso no período azul o que ele achava do período anterior… As coisas mudam.
Não tem um carinho especial por aquele projeto?
É um sentimento estranho, porque fico a pensar: ‘Como é que foi possível?’ Em circunstâncias normais isto não seria possível, só que o grupo que construiu as Amoreiras era o Alves Ribeiro, os irmãos Gonçalves, que eram donos do Diário de Notícias, o dr. Henrique Borges, que era dono de metade da Madeira, o Zezinho Gonçalves, grande amigo meu, o dr. Luis Gallego, que era secretário-geral do CDS, o dr. Afonso Patrício Gouveia, o Carlos Eduardo Rodrigues, que naquela altura era um grande construtor, depois foi à falência. Este grupo juntava-se todas as quintas-feiras numa moradia que havia aqui na esquina da Fontes Pereira de Melo com a António Augusto Aguiar. Eu, que era um puto que não tinha nada a ver com aqueles magnatas, tinha direito a estar nesses almoços porque era amigo do Zezinho. No meio daquelas confusões, um dia pus em cima da mesa a hipótese da compra do terreno das Amoreiras.
Que era da Carris.
O dr. Afonso Patrício Gouveia pergunta-me: ‘Quem é que lhe disse que o terreno está à venda?’ Eu sabia porque um amigo meu que já faleceu queria comprar o terreno mas não tinha capacidade. Foi todo este conjunto de poder que tornou as Amoreiras possível.
Hoje não seria possível?
Hoje não há força na sociedade portuguesa para construir um objeto daqueles, não há investidores, não há energia, não há cultura, não há nada. Eles eram todos homens de cultura. O Alves Ribeiro era e é eventualmente um dos maiores construtores portugueses, o Carlos Eduardo Rodrigues também. Eram indivíduos, como se costuma dizer, que cheiravam a poeira. Hoje estes gajos da banca e dos fundos nem sabem o que é um tijolo.
A terceira e última parte desta entrevista será publicada na edição do próximo sábado do semanário “Sol”