Quem já tirou um curso superior ou quem acabou de entrar na universidade e nunca ouviu a típica expressão “vão ser os melhores três anos da tua vida” que atire a primeira pedra. Apesar das vozes que surgem e falam em humilhação, as praxes académicas entram na rotina de qualquer estudante e, polémicas à parte, são vistas por muitos como uma atividade que promove o bem-estar do aluno dentro da academia – uma questão que ganha maior relevo se estivermos a falar de estudantes que mudam de cidade ou daqueles que entram pela primeira vez nesta nova etapa.
Apesar da hierarquia que se estabelece entre os alunos mais velhos e os mais novos, o reitor da Universidade de Aveiro afirmou que a melhor maneira de receber os alunos foi abrir “os braços e sermos informais”, no primeiro dia de acolhimento aos caloiros, com um megapiquenique com toda a comunidade.
Já o ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Manuel Heitor, relembrou, no arranque do presente ano letivo, que a integração dos novos alunos deve ser algo que se constrói num espaço onde deve estar presente a “tolerância” e o “diálogo aberto”.
O facto de cada instituição do ensino superior ter o seu próprio código de praxe faz com que as práticas das tradicionais flexões, cantar o mais alto possível as músicas da faculdade ou as praxes sujas sejam cada vez mais afastadas. A criatividade toma conta dos rituais académicos e surgem ideias como: medir a universidade com palitos; simular concursos de talentos; fazer declarações de amor utilizando determinadas palavras, ao invés de outras; ou conhecer a cidade da instituição de pijama.
Raquel Ferreira, licenciada em Bioengenharia pela Universidade da Beira Interior (UBI), declara que participou em todas as praxes e nunca se sentiu humilhada. A ex-aluna da UBI conta que “isso depende muito da personalidade de cada um, temos de saber descomplicar as situações e ter noção de que há certas características nossas que são alvo fácil para certas brincadeiras”. A recém-licenciada explica que, por ser do Norte, brincavam muito com o seu sotaque, mas isso nunca a fez sentir-se inferior.
De acordo com o código de praxe da UBI, no segundo ano do curso não é permitido realizar qualquer atividade praxista. Para a ex-aluna do curso de Bioengenharia, “isso faz uma diferença enorme na postura enquanto grão-mestres (veteranos ou doutores de três matrículas nas outras faculdades) porque, durante o meu segundo ano, assisti de fora à praxe e percebi qual queria que fosse a minha postura no último ano”. Porque “a praxe também ensina valores que acho muito importantes estarem presentes na altura de praxar”, remata.
Jogos didáticos
Dália Magalhães, aluna do Instituto Politécnico de Viseu (IPV), afirma que, na cidade de Viriato, “geralmente a praxe é feita por atividades e jogos didáticos”. A estudante de Comunicação Social confessa que “há sempre a parte da história da cidade, para dar a conhecer um pouco sobre o lugar onde as pessoas estão a estudar” e que “essas atividades acabavam por permitir interagir com pessoas, o que de outra forma não aconteceria”. Também há praxes diferentes das de esforço físico em que, por exemplo, os caloiros têm de construir uma peça de teatro ou fazer uma maquilhagem a outra pessoa de olhos vendados.
Para a aluna do IPV, o melhor momento enquanto foi praxada foi a latada. Conta que aí defendeu o curso com “garra e alma” e que ver todo o espírito académico acabou por ser um sentimento “muito bom” e “diferente de tudo aquilo que tinha vivido até à altura”.
Já em Coimbra, “as praxes acontecem de forma pacífica e cada um é livre de ir até onde quiser”, afirma Tomás Barreto, aluno da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. O aluno de Estudos Artísticos reconhece o peso que a sua universidade tem no que diz respeito à temática da praxe, mas confessa não existir sentimento de exclusão de quem não participa nas atividades.
As tradicionais flexões ou outra tarefa que exija esforço físico continuam a acontecer na cidade de Coimbra, mas também há “jogos nas escadas monumentais ou no Parque da Sereia”. “Muitas vezes, as praxes passam por contar histórias engraçadas e isso acaba por ser divertido tanto para os caloiros como para os superiores”, ou existem também atividades em que “os alunos têm de desvendar enigmas criados pelos superiores, no centro da cidade.”