Beach House. “Não queremos ficar agarrados  ao passado mas não fazemos ideia do futuro”

Beach House. “Não queremos ficar agarrados ao passado mas não fazemos ideia do futuro”


Em vésperas dos dois maiores concertos em Portugal, a vocalista conversou sobre a relação entre o particular e o universal 


Quando Victoria Legrand atendeu o telefone, o vídeo de “Drunk In L.A” ainda não tinha sido estreado. Numa era de hipervisualização, seria só mais um vídeo de uma banda mas dá-se o caso de ter sido filmado em Lisboa por Nuno Jardim com produção, direção e edição de Peter Kember, o Sonic Boom dos Spacemen 3 e produtor de Panda Bear, a residir na capital onde se tem apresentado ao vivo com alguma regularidade, e cúmplice sonoro dos Beach House em “7”. “Quando [o Sonic Boom] nos enviou o vídeo, nós elogiámo-lo e comentámos a sua ambiência janada e onírica, e ele escreveu que aquilo era basicamente um dia na vida dele”, descrevem os Beach House. O vídeo insiste em imagens de cavalos em fuga mas também tem imagens menos abstratas como um vislumbre do Pavilhão Chinês. 

Não muito longe, o Coliseu dos Recreios consagra o concerto mais ambicioso de vários que os Beach House já deram em Portugal desde 2009. Amanhã, regressam ao Porto para subir ao palco do Teatro Sá da Bandeira. Bilhetes a 28 euros em cada uma das salas. 

Uma música tão privada como a dos Beach House encaixa melhor em sala, perante o vosso público, ou em festival, quando se apresentam para milhares de pessoas com gostos aleatórios?

Sentimo-nos confortáveis em ambos os registos. Acabámos agora uma digressão na América em que tocámos, em média, para quatro e cinco mil pessoas. Chegámos a dar um concerto em sala para vinte mil pessoas. Já fizemos de tudo: festivais, salas grandes e pequenas. Sabemos adaptar-nos.

Mas reconhece que essa relação parte do pessoal para o universal?

A nossa música é pessoal mas não é calma. Tem tensão. Somos bastante ruidosos, até. Não é íntima no sentido aborrecido do termo. Percebo a questão porque se relaciona muito com histórias pessoais e memórias privadas de cada um mas acho que até somos bastantes físicos. Em palco nota-se bastante. 

No novo álbum “7” procuraram reinventar-se?

Não diria reinvenção. Foi mais uma evolução. Não houve um desafio imposto. É como uma longa viagem. Vamos adquirindo experiência com o tempo que levamos de banda. Este disco foi muito rápido. A forma de trabalhar mudou-nos. Montámos o nosso estúdio, o que nos permitiu ganhar liberdade e controlo sobre o processo. Este disco aconteceu no momento certo e só foi possível por termos pessoas novas à nossa volta. O “7” é um momento muito importante para nós. Termos a nossa noção de liberdade e controlo era um sonho para cada um de nós. Trouxe-nos abertura para experimentar. Quando eu falo em controlo, não é no sentido de sermos control freak. É na parte de sermos nós a decidir o que queremos. O Sonic Boom (Peter Kember, produtor de Panda Bear e músico fulcral dos Spacemen 3, atualmente a viver em Lisboa) foi muito importante. Ele pôs-nos a ouvir a novos sons e ritmos. Essa abertura para nos desafiarmos passou muito por ele. 

Terem um estúdio pessoal foi a peça decisiva na construção do “7?

Quando se pensa num estúdio, há aquela ideia romântica de um vidro, com o produtor de um lado à frente da consola e os músicos do outro a gravar. Neste caso, é mais um setup. Gravámos quase tudo em Baltimore [de onde os Beach House não naturais]. Quando fomos ter com o Sonic Boom já tínhamos ganho esse tempo. Não perdemos ideias durante o processo. 

O 7 pode conter diversos significados. Qual é o vosso?

É esse mesmo. Não ter uma interpretação fechada. O 7 pode remeter para múltiplos sentidos. É astrológico, gráfico e espiritual. É místico. O 7 pode ser um facto. É simbólico. É um chamamento. O 7 envolve uma multitude de interpretações. É muito aberto. Pode ser punk.

Após mais de uma década de carreira, conseguem ver a vossa vida através dos álbuns? 

Absolutamente! Já conseguimos perceber porque razão aconteceu o disco seguinte. Por exemplo, o primeiro disco é o mais inocente e é impossível voltar ali. Já conseguimos ver o que aprendemos com cada um. Beach House é um conceito abstrato. Não temos barreiras. É onde a nossa imaginação está. Somos crianças excitadas com o desconhecido. Não sabemos onde os nossos sonhos levam. Fazer o “Bloom” [álbum de 2012] foi fundamental para não ficarmos estagnados. Não queremos ficar agarrados ao passado mas não fazemos ideia do futuro. Este disco é sobre isso.

O que vos define é a inocência?

Não. Não é a inocência. Acho que é o amor. A inocência é uma parte importante do ser humano mas todos a perdemos ao longo do caminho. O amor traz vida. O que nos alimenta na vida e na arte é o amor. É o amor com que se faz. Quando não se ama, não se é muito amado. Há negritude e caos no amor em todas as suas formas. Há muita imaginação no amor. O amor é inspirador. O amor é complicado mas pode ser também muito simples. A inocência perde-se sempre algures. Claro que estou a falar no sentido abstrato. 

Encontraram o amor em Portugal?

Claro! Portugal deu-nos amor e energia antes de outros países. Lembro-me perfeitamente do primeiro concerto. Acho que foi no Cabaret Maxime [integrado na edição 2009 do Super Bock em Stock] Sentimos um magnetismo raro. É um país lindíssimo onde nos sentimos bem.