Adeus, África


Aos poucos mas inexoravelmente, os países africanos de língua portuguesa afastam-se de nós


1. À medida que o tempo passa, verifica-se um inexorável afastamento entre Portugal e os países africanos de língua portuguesa. O fenómeno pode escapar a alguns, mas é real e não se limita a temas como o acordo ortográfico. O problema não tem só a ver com os africanos dos PALOP que vivem em Portugal ou com os portugueses que por lá andam e trabalham. É mais fundo e, portanto, mais preocupante. Há um distanciamento político, económico e cultural que não cessa de crescer. A circunstância de haver emigrantes e imigrantes de um lado e de outro não impede um esfriamento das relações e um distanciamento. Há não muito tempo havia mais atenção e preocupação com o que se passava em cada um dos países. Agora não. Há indiferença e não propriamente afeto, para usar uma palavra da moda. Os Estados passaram a intitular-se parceiros estratégicos. Os donos das empresas têm-nas para fazer dinheiro e não por gosto, orgulho e função social. Esse desapego instalou-se também nos cidadãos, que já pouco se interessam por saber as circunstâncias próprias e os problemas por que passam ou deixam de passar as pessoas em concreto. É uma situação triste porque contraria a proximidade que, apesar da História e do colonialismo, conseguiu manter-se entre muita gente. Hoje, tanto faz para um português que um africano seja daqui ou dali, desde que ele consiga comunicar na mesma língua. Inversamente, o problema deve existir. Há xenofobia antiportuguesa nos PALOP e antiangolana por cá. Podem dizer que há a CPLP, que há cooperação e que há um conjunto de acordos, além de haver milhares de estudantes dos PALOP (e do Brasil) em Portugal. Há isso tudo, mas não há compreensão, sentimento e uma partilha de coisas e causas comuns. Aos poucos, ficamos alheios, o que não significa hostis. No mundo do trabalho, estão a reformar-se cá e em África os homens e as mulheres que tinham mais ou menos 20 anos no 25 de Abril. Por muitas diferenças ideológicas que tenham tido, são eles o cimento de relações que se foram mantendo exatamente por causa de laços identitários que agora se vão dissolvendo. Apesar do mérito que têm instituições como a RTP e a sua notável RDP/África, os países lusófonos africanos e Portugal estão a caminhar de costas voltadas. As viagens de Estado e as convenções nada resolverão se as sociedades civis luso-africanas não reverterem a situação. E pode–se apostar que isso se confirmará, passada a espuma das viagens oficiais de António Costa a Angola e de João Lourenço a Portugal. Se não houver um movimento de aproximação genuíno e civil, teremos com os PALOP um panorama semelhante ao que se passa com o Brasil, cujos imigrantes não querem saber nada do que aqui acontece, enquanto as sociedades portuguesa e brasileira só param pontualmente uns minutos para ver nas televisões escândalos, casos pitorescos ou de violência que tenham ocorrido num dos países. Além de turistas que descobriram que Portugal é das nações mais importantes da história dos últimos 500 anos, chegam do Brasil pobres e ricos. Paradoxalmente, vêm pelos mesmos motivos: fugir da pobreza e da violência. Uns vêm para ganhar a vida, outros para gastar o que têm num país onde há calma e onde os entendem. Pode ser importante, mas é pouco. Amanhã, não pode acontecer o mesmo com os PALOP.

 

2. Que a EMEL é uma organização que procede como quer, atuando como uma verdadeira polícia de um Estado totalitário, não é surpresa para os lisboetas e forasteiros. E é também um notável centro de tachos. Um deles é o de provedor da coisa, onde se acoitou Luísa Folque. A criatura está num galho onde alguém a colocou, sabe-se lá por que bula. Manda-se um email e não responde nem acusa receção. Tenta-se falar para o gabinete e nos serviços de atendimento geral da EMEL dizem que não há contacto telefónico. Insiste-se longamente e lá aparece ao aparelho um anónimo que diz ser assessor jurídico, mas não aceita declinar o nome. Enfim, um regabofe daqueles que a política partidária mais primitiva permite. Cria-se um grupo de funcionários e quadros intocáveis que não prestam serviço aos utentes que pagam a EMEL a peso de ouro. Um escândalo! Na EMEL só funcionam os parquímetros, os fiscais, os esbirros bloqueadores e, por arrastamento, a polícia municipal, que recebe indiretamente receitas das multas e reboques. E, já agora, porque será que essa polícia municipal tem na zona da José Malhoa dezenas e dezenas de lugares reservados para os seus funcionários e para os da Proteção Civil? Então não são cidadãos como os outros que têm de pagar parquímetros para ir trabalhar?

 

Jornalista