Tubarões. Os predadores das bilheteiras

Tubarões. Os predadores das bilheteiras


Ter um tubarão como protagonista é meio caminho andado para o sucesso – de bilheteiras. Que o diga o tubarão jurássico que se pode ver por aí nas salas de cinema: 43 anos depois, será um ainda eco do efeito “Jaws”?


Não podíamos acabar o verão sem ter um filmezinho de tubarões, certo? Há quatro dias, estrearam em Portugal dois filmes que têm o temido animal como protagonista: nas salas de cinema, “Meg: Tubarão Gigante”; e, no canal Syfy, o último capítulo da saga “Sharknado”.

O filme do Syfy é o sexto de uma série de produções concebidas para a televisão. Resumindo, conta a história de um tornado de proporções inéditas que arrasta tubarões para terra onde, à medida que vão aterrando, provocam o caos e… comem pessoas. Quanto estreou, em 2013, nem a produção estava à espera de que um filme da série Z – cujo argumento é uma paródia pegada – e feito com um mini orçamento tivesse mais pernas para andar. “É uma história que podia ter sido escrita por um miúdo de seis anos. A diferença é que alguns adultos se apaixonaram por ela. E depois as redes sociais trataram do resto”, disse o realizador Anthony C. ao canal ABC, citado há uma semana pelo DN. A saga conquistou uma legião de fãs suficiente para repetir a fórmula por seis vezes, a última das quais estreada precisamente na passada quinta-feira.

Também “Meg: Tubarão Gigante”, que não convenceu a crítica em parte nenhuma do mundo, estreou-se em Portugal com uma bilheteira considerável: nos primeiros quatro dias, foi visto por mais de 57 mil pessoas. O filme, assinado por Jon Turteltaub, vai buscar um megalodonte, um tubarão pré-histórico que tinha sobrevivido num nível submarino ainda abaixo da Fossa das Marianas, e que, depois de um submarino ter aberto uma passagem, consegue esgueirar-se até ao oceano Pacífico. E pronto, a partir daí é imaginar o que irá fazer este verdadeiro monstro de 18 toneladas.

Como os dois exemplos mostram, parece não haver predador que garanta: a) resultados nas bilheteiras, b) atenção mediática ou c) ambos como o tubarão. Por pior que seja o produto em si, e ao longo da história dos blockbusters – género inventado nada mais, nada medos, do que pelo tubarão original: o “Jaws”, de Spielberg (1975) –, o bicho tubarão continua a ser meio caminho andado para atrair espetadores e faturar.

Os programas televisivos também foram beber deste aparentemente insuperável magnetismo. Desde 1988 que o Discovery Channel lhes dedica, anualmente, uma semana: “a “Shark Week”.

Depois de “Jaws”, alguns realizadores voltaram-se para o oceano em busca do novo monstro aquático (o “it monstro”, portanto) mas, até à data, nenhum conseguiu. Em 1977, dois anos depois de “Jaws”, Michael Anderson ainda tentou que uma orca fizesse o trabalho em “Orca, a Fúria dos Mares” – a história de vingança de uma baleia assassina que persegue um pescador irlandês depois de este ter morto a sua companheira orca grávida (curiosamente, um engano, visto que o dito pescador tentava apanhar um tubarão branco). A moda não pegou e, desde “Libertem o Willy” (1994), as baleias assassinas não só não metem medo a ninguém como até transmitem algum aconchego.

 

Um impacto real Foi mesmo o filme de Spielberg a conferir o estatuto de grande predador dos oceanos – e de bilheteiras – ao tubarão que, quanto mais branco, melhor (ou pior). “Jaws” estreou-se em junho de 1975 (chegou a Portugal em março de 1977) e aquele tubarão mecânico – ou melhor, o que ele representa – e que mal aparece continua a inspirar, 43 anos depois, um medo quase inexplicável. Spielberg conta no documentário “Jaws, the Inside Story”, realizado por ocasião dos 35 anos do filme, que dos três tubarões mecânicos que tinha disponíveis, apenas um funcionava, pelo que optou muitas vezes por cenas em que apenas uma barbatana aflora à superfície ou outras em que, sem qualquer avistamento, a música – e a nossa cabeça – faz o trabalho. E faz de tal forma que o pior é mesmo o que não se vê.

O êxito de “Jaws” foi imediato e, nesse verão, os avistamentos de tubarões não deram descanso às autoridades. O impacto social manteve-se nos anos seguintes e teve até repercussões no turismo. Joanne Cantor, antiga professora da Universidade de Wisconsin-Madison, estudou esses fenómenos e concluiu que o filme tinha construído uma aura de terror em redor do tubarão semelhante à que “Poltergeist” (1982), também de Spielberg, trouxe aos palhaços. E mais: segundo a investigadora, 43% das crianças que viram o filme antes dos 13 anos experienciaram dificuldades em nadar. Mas o impacto mais duradouro e preocupante, segundo Joanne, foi mesmo para as próprias populações de tubarões. Após a estreia de “Jaws”, multiplicaram-se os torneios de caça ao tubarão que resultaram num decréscimo dramático do número destes animais – os biólogos estimaram que, junto à costa este dos EUA, 90% dos tubarões foram caçados.

Hoje essa luta em forma pesca intensiva – pelo menos, como símbolo contra o mal – já não se verifica. Mas convenhamos que, com os filmes de tubarões que por aí andam, se torna difícil ter semelhante ideia… Megalodontes?