Nunca tive dúvidas de que o valor facial de Rui Rio era muito superior ao valor real. Uma coisa são circunstâncias regionais em que se controlam boa parte das variantes, outra diversa é ter de estruturar intervenção pública sem dominar todos os fatores, desde logo um grupo parlamentar de revoltados e indignados com um exercício de poder em que a relativização de poderes instalados é parte integrante da estratégia política de pseudoafirmação.
Defeito ou feitio, Rui Rio revela uma confrangedora incapacidade de gerar respostas para a atualidade e sinalizar a proposta política alternativa ao PS e à atual solução de governo.
No estilo, no tom e no conteúdo, sucedem-se as divergências, as desistências, os casos e uma ausência de sentido sustentado de afirmação de uma proposta alternativa, ainda enleada no passado recente da governação – já lá vão três anos – e na insuficiência da intervenção pública em relação ao quotidiano e às opções de futuro.
Evidente a insuficiência da alternativa, só mesmo a capacidade dos partidos que apoiam a solução governativa para gerar incómodos ao governo, a existência de situação de atualidade que fustigue a “credibilidade” da governação ou a superveniência de fatores externos que modelam as condições para o exercício do poder.
Converge assim uma espécie de esvair dos serviços públicos, de degradação do ambiente político, de fragilização da euforia económica e de alguma agitação sociossindical com uma deriva que, no suporte ao poder, defende a ampliação dos fatores de risco, pelo aumento da despesa, e na oposição inexiste no presente com a esperança vã de um resultado futuro que a integre na equação de governo, sempre sem maiorias absolutas de um homem só.
Sem coesão nas equipas, sem iniciativa política e com uma reiterada crença no poder cicatrizante de almoços após as divergências de posições entre a liderança e o grupo parlamentar, só mesmo o poder pulverizador de quem tem apoiado a solução de governo para fazer o que Rui Rio e o PSD não querem ou não conseguem fazer: infligir dificuldades políticas ao governo. Foi o que aconteceu com a coligação parlamentar negativa que aprovou o fim do adicional ao imposto sobre os combustíveis (ISP).
Esta espécie de aposta de todas as fichas nas falhas alheias, que sempre está presente na tese de que o poder não se conquista, mas é perdido por razões próprias dos seus detentores, sublinha a fragilidade de mais um dos Dons Sebastiões da política portuguesa.
Se, a cada falta de cimento na alternativa, Rui Rio responder com a indiferença de “o respeitinho é muito bonito” e refeições de realinhamento político, não chegarão os pequenos-almoços, os almoços e os jantares do horizonte. E nem mesmo com lanches e ceias conseguirá ser mais do que uma muleta política ou um parceiro alternativo de quem está no exercício do poder. Pode servir para fazer ciúmes, mas nunca casará ou liderará a relação política.
Sem resolver a relação com o passado da governação de Pedro Passos Coelho, sem acertar no registo e na iniciativa para o presente, o futuro só poderá ser mais radioso por razões que lhe são alheias. Definitivamente, depois da última governação, as lideranças do PSD têm um problema de registo político na sua intervenção.
Negrão e Rio almoçaram na segunda, garantia de que esta é uma semana de acerto, sintonia e convergência. Com a vichyssoise de novo em Belém e o pato escondido em São Bento, só restará a Rui Rio a sucessiva repetição de manjares de conforto dos estômagos com azia.
É claro que, com o Mundial como pano de fundo e com as férias no horizonte, tudo é relativizado, até ao dia em que se constitui em beco sem saída.
NOTAS FINAIS
A bota e a perdigota. Não fez sentido Portugal não estar presente na reunião informal sobre migrações e asilo convocada por Jean-Claude Juncker no passado domingo. Nem se compreende o silêncio de tantos que verbalizaram invetivas contra Trump e os Salvinis sobre as migrações em diferentes latitudes do planeta. Mas percebe-se que na ausência de Portugal, o novo primeiro-ministro de Espanha assuma liderança em questões que podem marcar a diferença da resposta europeia. Quando, por razões caseiras ou de outros focos, Portugal não está no coração do pulsar europeu, fica à margem da definição das opções políticas. Acolher mais refugiados é uma atitude no sentido correto que não desculpa as ausências políticas a favor das presenças no futebol.
A insuportável realidade em construção. O caso Fizz e as condenações internacionais de Portugal deveriam justificar uma reflexão profunda dos agentes judiciais, sobretudo dos que têm poder de investigar e acusar. Por dá cá aquela palha destroem-se relações e vidas sem que exista rigor, solidez e sustentação de muitas das acusações e dos procedimentos judiciais. A comunidade deita-se nas camas que faz, desde logo nas do poder sem escrutínio e responsabilização.
As insuportáveis contradições em existência. Na cidade que subiu 44 lugares no estudo sobre o custo de vida, o Marquês de Pombal parece cada vez mais um território de terceiro mundo. Impulsionadas pelos acordos locais e nacionais, as estruturas de propaganda crescem que nem cogumelos: PAN, PCP e afins são os protagonistas. Lisboa é uma das 100 cidades mais caras do mundo.
Escreve à quinta-feira