A descentralização de competências do poder central para as autarquias tem-se traduzido em significativas perdas de autonomia dos municípios. Ainda que pareça contraditório, não é difícil de perceber. Estas transferências de competências nunca aparecem com o necessário pacote financeiro que lhe seria devido, os serviços das autarquias não estão dimensionados para as absorver ou gerir e a autarquia, apesar de ganhar áreas de acção, vê limitada a sua capacidade de iniciativa política tendendo a ser um organismo administrativo com pouca capacidade de acção. Mais, os seus eixos políticos são cada vez mais condicionados pelas linhas de financiamento definidas centralmente e conduzidas pelas representações regionais não eleitas do Estado central.
Estou em crer que o Plano Director Municipal (PDM) poderá vir a ser o mais importante instrumento político constituinte de uma resposta progressista municipal. Ainda que reconheça que este instrumento de gestão territorial decidido no seio da autarquia tem um historial de uniformização das políticas locais e padronização, pouco criativa, das respostas de planeamento parece-me que será o documento determinante para que se gerem políticas alternativas e transformadoras a partir dos governos locais.
Para que esta ruptura aconteça, é urgente descolonizar o planeamento das hegemónicas concepções neoliberais, tecnocratas e pouco cultas. Olhar para o que foi feito e perceber que desenhar PDM’s a partir da constituição de territórios de cedência para investimentos privados é uma escolha. Mas não é a única, nem a mais inovadora. É uma opção que acaba por colocar o município a depender de investimentos privados e, caso se concretizem, a produzir riqueza privada que não tem expressão no território nem nas populações.
Uma das formas centrais de produzir estes PDM’s de nova geração, que traduzam finalmente uma concepção de planeamento do séc. XXI, passa por desbloquear as formas de participação, até hoje, demasiado centradas na administração de pequenos interesses e conflitos privados. Lançar a discussão pública a partir do que se quer para o comum é estruturante para que se saia do plano individual para projectar o que é colectivo. Essa capacidade de conceber o território e o planeamento exigirá muito mais dos autarcas e dos técnicos, mas criará um movimento muito mais resiliente e transformador que os pequenos poderes instalados, privados e públicos, terão dificuldade em domesticar.
Escreve à segunda-feira