A segurança nos transportes foi, desde sempre, uma preocupação fundamental em todos os modos. A segurança na operação propriamente dita, mas também nos processos a montante e a jusante da mesma, e em particular na manutenção de equipamentos, na prevenção do risco e acidentes, etc. Desde então, a preocupação era de safety. Mas, nos últimos anos, novos desafios surgiram no setor dos transportes: a segurança contra atos de terrorismo e ofensas pessoais, que vieram a tornar muito mais complexos os processos de embarque e desembarque, vigia de espaços, de estações, etc. A preocupação, agora, é também de security.
As novas tecnologias de informação e vigia permitem, de forma não invasiva, monitorizar espaços, identificar situações de potencial risco, enviar alertas para ativar sistemas de prevenção. A chamada revolução digital trouxe novos instrumentos, quase todos dependentes da utilização de dados e quase todos ambicionando uma maior automatização de processos para eliminar o erro humano. Mas todos esses novos instrumentos exigem maiores investimentos em infraestruturas, maior complexidade na integração de dados, maior sensibilidade em relação à privacidade de dados e, ainda, maiores riscos no domínio da cibersegurança.
Em 24 de maio p.p., os ministros dos Transportes da OCDE publicaram a sua declaração conjunta sobre as questões de safety e security nos transportes e comprometeram-se a, entre outras ações: – reduzir acidentes rodoviários (ainda há cerca de 3500 mortes diárias em acidentes rodoviários no mundo) e, em particular, proteger o cidadão de mobilidade mais vulnerável: pedestres, ciclistas, crianças, idosos e portadores de deficiência;
– melhorar a análise preventiva de risco através da melhoria da qualidade dos dados que permitem identificar os fatores de risco;
– intensificar cooperação com entidades públicas e privadas no combate a atos de terrorismo, tráfego humano e outros crimes envolvendo as redes de transportes, através de mais sofisticados sistemas de informação e partilha de dados em tempo real.
Portugal tem sido um bom aluno no domínio de safety. A segurança dos nossos sistemas de transportes tem melhorado significativamente ao longo dos anos, com redução acentuada de mortalidade ou acidentes graves. Mas se, do ponto de vista estatístico, isto é muito satisfatório, do ponto de vista político, o objetivo a atingir tem de ser mais ambicioso, pugnando por uma política de zero acidentes. Tudo o que exceder este objetivo é inaceitável.
No domínio da criminalidade (terrorismo, etc.) estamos entre os países menos afetados, e felizmente que assim é. Mas isso não significa menor prioridade para esses aspetos. Muito pelo contrário, esse é um elemento de grande valor para o país.
Necessitamos, por isso, de um esforço concertado de várias entidades para eliminar as duas principais barreiras a estes desafios: capacidade de investimento para acelerar a adoção de novas tecnologias; e regulamentação que nos permita evoluir de um paradigma de propriedade de dados para um paradigma de fornecimento responsável de dados.
A informação qualificada é um instrumento essencial para a promoção da segurança nos sistemas de transporte e para reduzir a sua vulnerabilidade. O impedimento de acesso a dados, com argumentos de privacidade, pode ser um fator crítico para essa mesma vulnerabilidade. É por isso urgente adotar políticas e processos de gestão de dados que permitam aceder à informação necessária de forma responsável e responsabilizadora, assegurando a interoperabilidade desses dados e uma adequada utilização. Sem isso, as pretensões incluídas nas declarações dos ministros dos Transportes da OCDE dificilmente atingirão os objetivos pretendidos.
Professora do Instituto Superior Técnico