Notáveis! Mas que precários!?


Quando observamos as universidade dos países mais avançados, europeus ou não, constatamos que mantêm duas frentes paralelas de investigação e docência que se alimentam mutuamente


Precários. Designação infeliz dada a um conjunto de investigadores doutorados, uns muito jovens, outros nem tanto, uns intelectualmente notáveis, outros nem tanto, que coabitam as nossas universidades com um vínculo de bolseiros de investigação, que alguns mantêm com persistência já há longos anos na expetativa de conseguirem um merecido lugar no quadro dos docentes ou dos investigadores, onde estes últimos existem. 

Esta situação não é nova e reflete uma incapacidade dos sucessivos governos de refletirem de forma consequente sobre o ensino superior e a investigação em Portugal, por forma a fazer este país evoluir de uma cultura muito avessa à investigação e inovação para a consciência de que, sem estas componentes, não seremos capazes de produzir valor acrescentado e diferenciado nas nossas indústrias e serviços. Uma das bandeiras hasteadas pela própria Comissão Europeia tem sido a afirmação de que o conhecimento deve ser o principal produto de exportação da União Europeia. 

Quando observamos as universidades dos países mais avançados, europeus ou não, constatamos que mantêm duas frentes paralelas de investigação e docência que se alimentam mutuamente e, conjuntamente com outros fatores, promovem que o indivíduo assuma opções estratégicas sobre a evolução da sua carreira, dividindo o seu esforço de forma equilibrada entre estas frentes ou mesmo optando apenas por uma delas. Os resultados desta abordagem são evidentes: maior e melhor produtividade, maior disponibilidade para intensificar a relação entre a academia e a indústria, maior disponibilidade de recursos financeiros e, naturalmente, uma elevada exigência de desempenho para permanecer nestas carreiras. 

Não obstante resultados extraordinários que temos obtido nos rankings internacionais, as nossas universidades públicas debatem-se com sérios problemas de financiamento, um corpo docente com idade média avançada e a carreira de investigador, em muitos casos, inexistente. 

É neste contexto que se enquadra a iniciativa do governo de um regime de contratação destes doutorados (DL57/2016) para estimular o emprego científico e tecnológico. Nobre intenção porventura, mas uma péssima concretização. 

Transformam-se as bolsas de investigação em contratos a termo, sem quaisquer garantias de continuidade e deixando às universidades o ónus de confirmarem essa realidade com os graus de liberdade que detêm na sua gestão, mas sem que os seus orçamentos contemplem este aumento de recursos. As mais responsáveis só promovem contratos que têm condições financeiras de cumprir, sob pena de serem vistas como não colaborantes pelos investigadores visados. As menos responsáveis têm uma leitura mais generosa do diploma e assinam estes contratos sem receios, adiando por mais uns anos o problema, que se vai tornando mais grave à medida que estes investigadores vão sendo menos jovens.

Podendo parecer que se resolveu um problema, na verdade criou-se um clima de tensão e incerteza neste grupo de investigadores, que muito contribuem para a geração de meios próprios, indispensáveis à sobrevivência das nossas universidades, uma vez que o financiamento do Estado não assegura a cobertura dos custos de funcionamento das mesmas. 

O DL 57 e as restantes medidas de criação de emprego científico e tecnológico temporário são, por um lado, insuficientes para resolver o problema das várias centenas de investigadores nesta situação e, por outro lado, inadequados para vencermos o défice de investigação que temos e que foi recentemente apontado como um dos setores de pior desempenho nacional. Se nada for feito para corrigir esta situação, estaremos a desperdiçar o investimento feito no esforço de doutorar estes investigadores e assistiremos passivamente à sua saída para o estrangeiro e/ou colocação profissional menos adequada à preparação que tiveram. 

É imperativo deixar de adiar este problema e assumir a indispensabilidade de uma reflexão estratégica sobre as condições para a evolução da ciência em Portugal, criando estruturas, recursos adequados, e correspondente exigência de desempenho. Empurrar para o baú das universidades públicas mais um problema, a somar aos muitos com que já se debatem, é garantir que daqui a uma década ou mais continuaremos a ter investigadores notáveis, mas precários, o que por si só ameaça a sustentabilidade da evolução da ciência em Portugal. 


Notáveis! Mas que precários!?


Quando observamos as universidade dos países mais avançados, europeus ou não, constatamos que mantêm duas frentes paralelas de investigação e docência que se alimentam mutuamente


Precários. Designação infeliz dada a um conjunto de investigadores doutorados, uns muito jovens, outros nem tanto, uns intelectualmente notáveis, outros nem tanto, que coabitam as nossas universidades com um vínculo de bolseiros de investigação, que alguns mantêm com persistência já há longos anos na expetativa de conseguirem um merecido lugar no quadro dos docentes ou dos investigadores, onde estes últimos existem. 

Esta situação não é nova e reflete uma incapacidade dos sucessivos governos de refletirem de forma consequente sobre o ensino superior e a investigação em Portugal, por forma a fazer este país evoluir de uma cultura muito avessa à investigação e inovação para a consciência de que, sem estas componentes, não seremos capazes de produzir valor acrescentado e diferenciado nas nossas indústrias e serviços. Uma das bandeiras hasteadas pela própria Comissão Europeia tem sido a afirmação de que o conhecimento deve ser o principal produto de exportação da União Europeia. 

Quando observamos as universidades dos países mais avançados, europeus ou não, constatamos que mantêm duas frentes paralelas de investigação e docência que se alimentam mutuamente e, conjuntamente com outros fatores, promovem que o indivíduo assuma opções estratégicas sobre a evolução da sua carreira, dividindo o seu esforço de forma equilibrada entre estas frentes ou mesmo optando apenas por uma delas. Os resultados desta abordagem são evidentes: maior e melhor produtividade, maior disponibilidade para intensificar a relação entre a academia e a indústria, maior disponibilidade de recursos financeiros e, naturalmente, uma elevada exigência de desempenho para permanecer nestas carreiras. 

Não obstante resultados extraordinários que temos obtido nos rankings internacionais, as nossas universidades públicas debatem-se com sérios problemas de financiamento, um corpo docente com idade média avançada e a carreira de investigador, em muitos casos, inexistente. 

É neste contexto que se enquadra a iniciativa do governo de um regime de contratação destes doutorados (DL57/2016) para estimular o emprego científico e tecnológico. Nobre intenção porventura, mas uma péssima concretização. 

Transformam-se as bolsas de investigação em contratos a termo, sem quaisquer garantias de continuidade e deixando às universidades o ónus de confirmarem essa realidade com os graus de liberdade que detêm na sua gestão, mas sem que os seus orçamentos contemplem este aumento de recursos. As mais responsáveis só promovem contratos que têm condições financeiras de cumprir, sob pena de serem vistas como não colaborantes pelos investigadores visados. As menos responsáveis têm uma leitura mais generosa do diploma e assinam estes contratos sem receios, adiando por mais uns anos o problema, que se vai tornando mais grave à medida que estes investigadores vão sendo menos jovens.

Podendo parecer que se resolveu um problema, na verdade criou-se um clima de tensão e incerteza neste grupo de investigadores, que muito contribuem para a geração de meios próprios, indispensáveis à sobrevivência das nossas universidades, uma vez que o financiamento do Estado não assegura a cobertura dos custos de funcionamento das mesmas. 

O DL 57 e as restantes medidas de criação de emprego científico e tecnológico temporário são, por um lado, insuficientes para resolver o problema das várias centenas de investigadores nesta situação e, por outro lado, inadequados para vencermos o défice de investigação que temos e que foi recentemente apontado como um dos setores de pior desempenho nacional. Se nada for feito para corrigir esta situação, estaremos a desperdiçar o investimento feito no esforço de doutorar estes investigadores e assistiremos passivamente à sua saída para o estrangeiro e/ou colocação profissional menos adequada à preparação que tiveram. 

É imperativo deixar de adiar este problema e assumir a indispensabilidade de uma reflexão estratégica sobre as condições para a evolução da ciência em Portugal, criando estruturas, recursos adequados, e correspondente exigência de desempenho. Empurrar para o baú das universidades públicas mais um problema, a somar aos muitos com que já se debatem, é garantir que daqui a uma década ou mais continuaremos a ter investigadores notáveis, mas precários, o que por si só ameaça a sustentabilidade da evolução da ciência em Portugal.