Quando o preconceito fala mais alto


Há estudos bastantes a atestar as desigualdades na Europa com clara desvantagem nos países mediterrânicos


Por definição, num dicionário, preconceito é uma ideia ou conceito formado antecipadamente e sem fundamento sério ou imparcial. É, por assim dizer, filho da ignorância. E mais ainda…

Ora, exatamente por preconceito, quem no Norte vive – no caso vertente, em Braga – era levado a não considerar Santo Tirso como local a visitar. Desde logo porque a própria cidade de Santo Tirso é uma cidadezinha anódina e descaracterizada, como tantas outras que cresceram sem regra à sombra do poder local, tentando a todo o custo galgar o atraso e o esquecimento do antigamente. Hoje, caixotes em altura, desengonçados, marcam a paisagem urbana, e pouco resta da antiga vila com belas fachadas e cércea bem definida. Sobressaem recantos e zonas verdes pontuados de modernas esculturas. Não é à toa que Santo Tirso se orgulha do Museu Internacional de Escultura Contemporânea, um notável museu a céu aberto. Porém, o que impressiona é a variedade de mosteiros de monjas e frades de que o de Singeverga, não pela qualidade da traça, diga-se, será o mais conhecido. Na parte baixa da cidade, na margem esquerda do rio Ave, fica o Mosteiro de São Bento, cuja fundação será anterior à nacionalidade e que foi sendo acrescentado até finais do séc. xviii, classificado como monumento nacional desde 1910. Atualmente conhecido como Mosteiro de Santo Tirso, trata-se de uma esplêndida edificação, bem conservada, a exigir visita. Curiosamente, integrando uma ala do mosteiro, numa solução arquitetónica bem engendrada, encontra-se o Museu Abade Pedrosa, com uma oferta expositiva que surpreendeu pela positiva: exposições temporárias de Júlio Resende, anos 50, e de Jorge Molder, “Jeu de 54 Cartes”, excelente mostra de fotografia.

Ainda a propósito do preconceito, vem à baila um trabalho acutilante e bem humorado do artista búlgaro Yanko Tsvetkov, “Atlas do Preconceito” – “Atlas of Prejudice” –, a residir em Espanha e que escreve em inglês. No livro é-nos dada a cartografia do preconceito na Europa, segundo a apreciação do autor, obviamente, mas que não difere do que é opinião corrente: para os europeus do norte, os do sul são amantes do sol, da pândega, do bom vinho e da boa mesa, preguiçosos, pouco dados a bricolages e… pobres. Dito desta maneira nem parece que haja mal nisso; soa mais a inveja dos outros, os tais do norte. A coisa muda de figura quando se analisam indicadores macroeconómicos, e mesmo sociais. Há estudos bastantes a atestar as desigualdades económicas e sociais na Europa, com clara desvantagem nos países mediterrânicos mas de que os nórdicos não se podem considerar alheados. Também no norte há pobreza e exclusão social, como se pode ver no relatório “Justiça Social na Europa” – “Social Justice in the EU – Index Report 2017” –, da fundação alemã Bertelsmann Stiftung. A diferença, para nosso mal, reside no facto de os ditos países ricos e trabalhadores ocuparem o cimo da tabela, nos dez primeiros lugares no índice de justiça social, enquanto Portugal e os seus mais próximos estão nos dez últimos – isto numa UE de 28 Estados-membros onde a média se situa entre a 14.a e 15.a posições. Não obstante, não será por certo o preconceito a chave da resolução do problema.

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