Vivemos atualmente momentos de mudança e preocupação um pouco por toda a Europa (mas também nos EUA, com a eleição de Trump), com a emergência de movimentos políticos populistas (de esquerda e direita) e com o preocupante “afundamento eleitoral” dos partidos ditos tradicionais, do centro político – partidos que foram o garante da paz, da democracia, do crescimento económico mas, particularmente, das conquistas sociais do pós ii-Guerra Mundial na Europa ocidental.
Como (entre outras) a eleição de Emmanuel Macron em França comprovou, são necessários novos mecanismos de relacionamento entre partidos políticos e cidadãos, novas formas de organização, a acompanhar uma desejável reforma do sistema político e eleitoral que aproxime eleitos de eleitores – reformas estas sucessivamente adiadas por conveniências meramente táticas dos responsáveis partidários nacionais.
A meio da legislatura, e estando remetido a um (injusto, mas muito digno em democracia) papel de maior partido da oposição (independentemente dos méritos da solução, a verdade é que os portugueses interiorizaram esta situação política bem melhor que a direção nacional do PSD), seria o momento ideal para que o partido mais português de Portugal se abrisse à sociedade, seja na sua organização, modernizando o seu funcionamento, seja, fundamentalmente, nas suas práticas, e encontrasse uma forma de contrariar o “otimismo irritante” da atual solução governativa.
Não se compreende, assim, como é que a menos de três meses de umas – fundamentais – eleições autárquicas (eleições em que o PSD soube sempre capitalizar o descontentamento popular com governações socialistas a nível nacional), e depois de todo o conturbado processo de escolha da candidatura à maior autarquia do país – que provocou, inclusivamente, a demissão do presidente da concelhia da capital –, se realizem eleições para a distrital de Lisboa, juntamente com cinco outras concelhias do distrito de Lisboa, não se convocando eleições para a concelhia da capital (demissionária há dois meses).
São estes “golpes palacianos”, infelizmente nada inéditos na vida interna dos partidos em Portugal, mas em particular do PSD/Lisboa nos últimos anos (recorde-se que o último ato eleitoral distrital, em 2015, foi também ardilosamente antecipado para vésperas das legislativas), que provocam o afastamento dos cidadãos, em particular dos mais jovens e mais qualificados, dos partidos políticos e da participação cívica.
Tratar de questões internas, condicionando todos os intervenientes diretos ou indiretos no processo autárquico, a menos de três meses de eleições é precisamente o oposto do que deveria acontecer num partido que se quer livre, plural e democrático, provocando divisões (porque dumas eleições se trata e porque, em democracia, o debate de ideias deverá ser sempre estimulado, e não limitado) e nada acrescentando ao debate de ideias ou à (obrigatória) responsabilização dos titulares de cargos políticos.
Assim, infelizmente, não.
Advogado e ex-deputado do PSD