Nunca foi particularmente clara a razão pela qual o actual governo (para além dos arranjinhos que transformaram os antigos enfants terribles, como Mário Nogueira ou os outros agitadores do chefe Arménio Carlos, até ver, em figuras ausentes) revogou e tudo fez para resolver o acordo da TAP.
É, do ponto de vista do observador externo minimamente experiente, um sinal preocupante que, depois de seguido todo um processo que culminou com a venda da maioria do capital da TAP ao consórcio privado, o Estado reassuma, sem grande – se alguma mesmo – oposição, descontentamento ou protesto dos mesmos.
Para além de algum tacticismo político que interessará mais ao governo e ao PM que certamente aos portugueses, não pode deixar de questionar–se por que razão o Estado prescindiu da hipótese de deixar de assumir a dívida avalizada da TAP que os privados tentariam assumir, voltando com o acordo atrás.
Aliás, o governo recomprou 11% das acções da TAP, gastando aí adicionais 2 milhões de euros, para deixar a gestão corrente da TAP ao consórcio, à data, referindo inclusivamente a comunicação do PM que “o governo não pretende intervir na gestão do dia-a-dia da TAP, por isso, a gestão fica com a Gateway. O que cabe ao Estado é garantir a perenidade da visão estratégica e que a TAP garantirá sempre a ligação dos portugueses ao mundo”.
É, pois, neste enquadramento que (infelizmente sem surpresa e provavelmente sem vergonha, como vem referido) acontece a nomeação do dr. Lacerda Machado, a quem, ao que se saiba, nenhumas especiais competências de visão estratégica na aviação ou na deslocação de portugueses no mundo são conhecidas ou sequer palpáveis.
Aliás, se olharmos cruamente para os factos que se conhecem deste negócio, a única serventia que teve até esta data, além da concretização de uma promessa eleitoral de utilidade discutível (e o contributo para o apaziguamento dos entretanto mudos sindicatos), foi o de ter-se arranjado um lugar para o dr. Lacerda Machado que custou ao Estado quase dois milhões de euros.
Dificilmente se consegue conceber caso mais rotundamente flagrante de nepotismo.
E a resposta ensaiada pelos alinhados com a nomeação para justificar o injustificável, de trazer à colação o caso da EDP e das nomeações para o conselho geral e de supervisão (também de transparência e lisura discutíveis, sobretudo para quem os aceitou), não tem comparação final.
Os accionistas privados que compraram a EDP são livres de decidir quem querem, ou não, eleger para os órgãos sociais das suas empresas e quanto lhes querem pagar.
Este rationale já não é o mesmo se o Estado revoga todo um negócio (onde prescinde de vantagens futuras possíveis e várias, para nada gerir) e depois paga quase dois milhões de euros numa negociação no fim da qual o negociador, advogado, que fecha este negócio é o beneficiário final de um dos lugares de administração que o próprio negociou.
Em qualquer dos casos, de Catroga ou de Lacerda Machado, a forma como chegaram aos cargos sociais parece à partida, pelo menos, indiciar manifesto conflito de interesses com as posições ou o mandato anteriores.
No entanto, só Lacerda Machado criou o lugar onde se sentou, e gastou dinheiro público para criá-lo!
Costa usou, assim, a coisa pública e seu dinheiro com a elevação ética que se expôs.
Não concordamos, porém, com Passos Coelho. Isto só seria um caso de pouca-vergonha se ainda houvesse alguma, o que manifestamente não parece ser o caso…
Advogado na norma8advogados
pf@norma8.pt
Escreve à quinta-feira,
sem adopção das regras
do acordo ortográfico de 1990