Por mais que o avanço da idade me acentue, nesta quadra festiva tão contraditória, a enorme nostalgia de um tempo feliz de infância e juventude, por natais únicos, irrepetíveis, e pela inexorável tristeza da ausência física dos meus essenciais progenitores, de natureza e formação, a verdade é que há sempre novos ciclos de continuidade que acabam por se impor no tempo que passa, nos afectos que se foram construindo junto de quem escolhemos e amamos no dia-a-dia, pelos filhos que entretanto já se fizeram adultos, e agora por um neto de dois palmos que tudo interroga, e que de repente me abriu um novo olhar sobre as coisas da vida. Não há alegria sem que se saiba de tristeza, não há prazer sem que se saiba de sofrimento, não há equilíbrio sem trabalho, não há dádiva sem entrega. Não há luta sem contrários, e não há vida que o seja sem o mundo das contradições. E depois, o que vale sempre e em qualquer situação, é nunca perder a capacidade de olhar e seguir em frente.
Sim, é meu privilégio, e se porventura neste momento algum indesejável acaso pusesse termo à novela da minha vida, asseguro-vos a todos que lá iria eu deste mundo sabe-se lá para onde, mas nada indisposto com o que vivi. “ Je veux qu’on rie, je veux qu’on dance, je veux qu’on s’amuse comme des fous…”, como diria o grande Brel (Le moribond). Enfim, devem ser efeitos deste sol magnífico de inverno que nos veio brindar a todos. Bom ano novo.