Era o penúltimo voo do domingo para saltos de paraquedas e nada fazia esperar aquele desfecho. A avioneta descolou do aeródromo de Figueira de Cavaleiros com oito pessoas a bordo: um piloto, três paraquedistas autónomos, dois instrutores e dois passageiros, que iriam saltar agarrados aos profissionais ao jeito das muitas experiências radicais que se têm tornado populares nos últimos anos. A aeronave ainda estava a subir quando começou a desintegrar-se no ar, sob a freguesia de Canhestros, em Ferreira do Alentejo. Estava a 7000 pés de altitude, quando por regra os saltos são feitos nos 15 mil. “Os ocupantes não saltaram, foram cuspidos”, disse ao i Mário Pardo, responsável de uma escola de paraquedas que durante o fim de semana tinha feito voos no Pilatus Porter. “Se não fossem paraquedistas, tinham morrido todos.”
O acidente vitimou o piloto, de nacionalidade belga. Por poucos minutos, a tragédia não foi pior. Por norma, na descolagem os passageiros não vão conectados aos instrutores, algo que só é feito acima dos 1000 pés por razões de segurança. Pardo estima que terão passados uns seis minutos num acidente que está a deixar perplexa a comunidade de paraquedistas: nunca tinha acontecido nada assim.
O acidente, para o qual foram chamados meios de socorros às 19h08 de domingo, está já a ser investigado pelo Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves, que ontem contudo ainda não tinha feito qualquer nota oficial sobre este caso.
A aeronave pertencia à empresa Seven Air e era a este grupo que pertencia a escola de paraquedas que estava, no voo em causa, a servir-se da avioneta. Mas Mário Pardo adianta que, durante o fim de semana, esta aeronave serviu várias escolas e terá feito mais de 20 voos. O i falou mesmo com um paraquedista amador que saltou da nave no sábado. O sentimento é o mesmo: ninguém se apercebeu de que havia algum problema.
A nave tinha regressado de manutenção na semana anterior e era o primeiro fim de semana de trabalho. Dois ocupantes ficaram em estado grave e foram transferidos para S. José. Ontem, ao final do dia, o centro hospitalar informou que os dois homens de 40 e 45 anos, estão clinicamente estáveis e com prognóstico favorável.
Medo já se sente Se o acidente ainda está a ser digerido, o receio já se nota. Na escola de Mário Pardo foram recebidos ontem vários telefonemas com pedidos de cancelamento de saltos. O responsável admite que esta atividade deverá retrair-se, embora o acidente pudesse ter acontecido em qualquer viagem aérea.
Caeiro Martins, presidente da Federação Portuguesa de Paraquedismo, insiste na mesma ideia: o facto de os ocupantes terem sobrevivido, sendo que em dois os paraquedas de reserva ter-se-ão aberto sem que tenham sido acionados pelos saltadores, e que estariam inconscientes, demonstra a segurança dos equipamentos. Quando há uma queda a grande velocidade, se o paraquedas principal não é aberto antes dos 1000 pés, o paraquedas de reserva (obrigatório) abre automaticamente.
O acidente nos céus de Ferreira do Alentejo fez recordar aquele que foi um dia trágico na história do paraquedismo em Portugal: 1 de Maio de 1981. Nesse dia, uma avioneta do grupo de Tancos, Boinas Verdes, que participava numa demonstração de saltos, despenhou-se no aeródromo de Évora perante a assistência. A aeronave tinha acabado de deslocar e dois ocupantes já tinham saltado. O piloto e outros três homens tiveram morte imediata. Uma mulher sobreviveu em estado crítico e morreu dias mais tarde. Neste acidente, apurou-se haver erro humano – uma distração do piloto terá levado a avioneta a perder altitude, o que não foi possível corrigir a tempo. Martins diz que este acidente em Ferreira do Alentejo, em que a nave se desintegrou, é único na história da modalidade do país.