Se há fenómeno curioso na velha Cidade do Santo Nome de Deus, pode dizer–se que ele é o do excesso de comunicação social, que se bate palmo a palmo com o negócio dos casinos. Num território minúsculo de 33 km2 vivem cerca de 670 mil pessoas, das quais cerca de 10 mil falam ou entendem português – números diminutos que não ajudam a entender a oferta excessiva. A TDM – Teledifusão de Macau tem canais de rádio e televisão em português; o Canal Macau (televisão) tem um serviço diário em inglês e uma entrevista semanal na mesma língua. Há três jornais diários: “Jornal Tribuna de Macau”, “Hoje Macau” e “Ponto Final”. Mas não são suficientes nessa voragem comunicativa: acrescentam-se-lhes dois semanários – “O Clarim”, propriedade da diocese de Macau, e o “Plataforma Macau”, bilingue português e chinês. Há ainda três jornais em língua inglesa, dois deles dirigidos por jornalistas portugueses.
Não se atinge o exagero das casas de jogo: neste momento há 36 casinos no território, e na união das que foram as ilhas da Taipa e de Coloane, agora conhecidas por Cotai, erguem-se mostrengos como o Grandview; o Venetian, com a sua Praça de São Marcos e respetivos canais; o Four Seasons, com direito a Torre Eiffel; e mais centenas e centenas de andares no Hard Rock, no Sheraton, no Broadway, no Beijing Imperial Palace e por aí fora, até à exaustão de arranha-céus que explodem em mil cores de néon. Pode dizer-se que os profissionais da comunicação social vivem num pequeno paraíso no delta do rio das Pérolas, contrastando com a crise de trabalho que tem assolado a imprensa em Portugal. Cerca de cem jornalistas portugueses desenvolvem a sua atividade no território. Entre pessoal dos quadros e freelancers, os ordenados variam, como é natural, mas fixam-se numa média de dois a três mil euros mensais, números aceitáveis para uma cidade cujo custo de vida ainda não acompanha o gigantismo das novas cidades da China.
Gilberto Lopes, editor na TDM e correspondente em Macau de vários jornais portugueses, não tem dúvidas em afirmar: “Esta situação vai continuar. O futuro dos jornais macaenses está assegurado. Primeiro é preciso sublinhar que as redações são relativamente pequenas, o que ajuda à sobrevivência. Depois, a publicidade mantém-se estável e o apoio do governo da região também.”
A pergunta salta à vista: quem paga? De onde vêm as verbas que sustentam esta produção claramente exagerada de notícias e artigos da mais variada ordem? Nesse aspeto, não divergem muito dos jornais regionais de Portugal, assentando raízes na publicidade institucional: concursos e campanhas públicas, declarações judiciais. A publicidade privada não é garante de estabilidade. Mas o governo estabelece um subsídio anual de 600 mil patacas (neste momento, o câmbio está a 9,1 patacas por euro) por ano para cada órgão de comunicação social. Já as vendas são tão reduzidas que não têm peso significativo nos balanços finais, não havendo quem ultrapasse os mil exemplares/dia.
Ao contrário do que acontece em Portugal, os jornais de Macau não são artigos diários de ruas e de cafés. A grande maioria da comunidade portuguesa desfolha-os no trabalho, nas empresas ou nos serviços públicos. A tradição da banca não chegou até aqui.
Há lugar para todos: jornalistas, animadores de rádio, técnicos, câmaras, fotógrafos, paginadores. Dificilmente se imagina, para quem não conhece a realidade de Macau, que continue a haver uma porta aberta para a expetativa dos profissionais de um ramo ultimamente tão maltratado nesse lugar a que aqui se chamava Continente. Macau mudou de mãos, mas as autoridades chinesas continuam a manter viva a luz titubeante da língua portuguesa no território. Se depender do governo da região e do seu chefe de executivo, Fernando Chui Sai–on, não há que ter medo do desemprego no que à comunicação social diz respeito. Afinal, ainda há quem saiba perceber a importância da palavra – escrita ou falada.