Offshores of course e coisas cá da terra


Objetivamente, o que é novo no caso dos papéis do Panamá é apontarem nomes concretos, porque a dimensão das offshores era conhecida e acarinhada.


1) A lavandaria Panamá. Retomando o título notável do i de ontem, o que se sabe até agora é uma parte ínfima do fenómeno do offshore que a moral e a ética reprovam mas que se multiplica e acarinha em todo mundo. O escândalo actual diz respeito apenas a uma das milhares de empresas que tratam de um negócio que serve para esconder património, fugir a impostos, lavar dinheiro, financiar o crime e residualmente para um ou outro cidadão honesto que desconfie dos bancos do seu país. O dinheiro em offshore conta-se em triliões e não está só em destinos meio exóticos. Está no Luxemburgo de Junker, na asséptica Suiça, nos glamorosos Liechtenstein e Mónaco e por aí fora. Foi através de movimentos feitos por muitas destas vias que o BES e não só floresceram e se transformaram numa bolha que todos pagamos. Para já, os papéis do Panamá não trazem grandes surpresas em termos de clientes. Gente com má fama, criminosos, ditadores, artistas, desportistas, empresas de fachada. Tudo expectável. A novidade são os nomes concretos. Esperam-se novos desenvolvimentos, interessando-nos espacialmente o que se souber do complexo mundo lusófono. Mais uma vez, os jornalistas fizeram a parte deles, como já tinha acontecido aquando do Wikileakes e das revelações de Edward Snowden. Veremos agora se o poder político, o judicial e a supervisão dão seguimento. Convenhamos, todavia, que a probabilidade disso acontecer é infima.

2) Espinho sem espinhas. Passos Coelho saiu-se bem do congresso. Fez o que quis e sobrou-lhe tempo. Analistas, jornalistas e comentadores (que não os militantes e dirigentes batidos) engoliram a história de que o PSD não tem pressa. Foi manchete em todo o lado. Na realidade para não ficar na postura de Velho do Restelo, Passos fez o que tinha a fazer e assumiu-se como oposição, sem deixar de sublinhar que ganhou as eleições. Deu mostras de abertura ao diálogo sobre questões importantes, nomeadamente a segurança social e leis eleitorais, sabendo que esses são exactamente temas em que o PS está amarrado de pés e mãos. Para o líder do PSD, o problema é que Costa entrou em modo de campanha permanente com grande eficácia e tem evitado estampar-se politicamente, preparando-se para essa probabilidade. Passos não renovou quase nada na equipa, nem deu aberturas. Limitou-se a alargar o seu núcleo duro, acentuando a componente feminina. Como esperado, apontou para as autárquicas, referindo-as como um marco importante, pois sabe que delas depende a sua liderança. Mas o que lhe daria jeito seria o colapso rápido do governo, agora que já pode haver dissolução da Assembleia. No discurso final não teve uma palavra de gratidão para Cavaco Silva, Durão Barroso e Marcelo Rebelo de Sousa. Quanto à oposição interna, confirmou-se que só existe em surdina, ao ponto de Maria Luís Albuquerque ter passado sem reparos discursivos a integrar uma vice-presidência. Espinho foi Passos Coelho igual a si próprio.

3) DBRS. Lá para o fim do mês a agência canadiana dirá se mantém ou desce o rating português. A coisa é importante porque se nos faz cair deixamos de ter o acesso actual aos mercados. Uma descida seria dramática. Há quem entenda que não há razões para uma apreciação negativa. Mas há. As contas que se esperam do primeiro trimestre não são brilhantes. A execução orçamental foi apertada pela circunstância de termos funcionado em duodécimos. Como nota de optimismo há a circunstância da DBRS ser tradicionalmente mais simpática do que as suas congéneres americanas, tendo ajudado a Itália e a Espanha.

4) SEF viaja. 34 inspectores do SEF foram para a Grécia  apoiar a devolução de refugiados supostamente económicos à Turquia. Depois, o contingente será substituído por outro igual. A notícia espanta quando se sabe que cá, os estrangeiros passam martírios para serem atendidos, para obterem respostas, para, enfim, serem tratados com dignidade. E sabe-se também que por detrás de certas frutarias de bairro (aliás úteis) há suspeitas de procedimentos ilegais de emigração, que se estendem a outras áreas e a um conjunto de esquemas, alguns dos quais envolveram quadros do Estado, empresas imobiliárias e advogados sem escrúpulos. Se não fosse isso, tudo bem à ida dos inspectores. Mas assim não faz sentido, a menos que esta seja mais uma oportunidade para colocar empresas de segurança privada a fazer o trabalho que compete ao Estado. 

5) As crateras lusitanas. Na A14 e na A41, duas das muitas auto-estradas que passaram a cobrir o país, o piso abateu escandalosamente. Fizeram-se dezenas de horas de emissão de televisão, rádio e centenas de notícias sobre o assunto, dando-se as explicações. Mas seria bom investigar, se na base de tudo isto não estará a celebre renegociação das PPP que o governo anterior tanto propagandeou. Esses cortes tiveram muito a ver com a redução das obrigações de manutenção por parte dos concessionários, passando-se esse encargo para o Estado através da empresa que detém para o efeito. Lá diz o povo “poupa-se no farelo, gasta-se na farinha”.


Offshores of course e coisas cá da terra


Objetivamente, o que é novo no caso dos papéis do Panamá é apontarem nomes concretos, porque a dimensão das offshores era conhecida e acarinhada.


1) A lavandaria Panamá. Retomando o título notável do i de ontem, o que se sabe até agora é uma parte ínfima do fenómeno do offshore que a moral e a ética reprovam mas que se multiplica e acarinha em todo mundo. O escândalo actual diz respeito apenas a uma das milhares de empresas que tratam de um negócio que serve para esconder património, fugir a impostos, lavar dinheiro, financiar o crime e residualmente para um ou outro cidadão honesto que desconfie dos bancos do seu país. O dinheiro em offshore conta-se em triliões e não está só em destinos meio exóticos. Está no Luxemburgo de Junker, na asséptica Suiça, nos glamorosos Liechtenstein e Mónaco e por aí fora. Foi através de movimentos feitos por muitas destas vias que o BES e não só floresceram e se transformaram numa bolha que todos pagamos. Para já, os papéis do Panamá não trazem grandes surpresas em termos de clientes. Gente com má fama, criminosos, ditadores, artistas, desportistas, empresas de fachada. Tudo expectável. A novidade são os nomes concretos. Esperam-se novos desenvolvimentos, interessando-nos espacialmente o que se souber do complexo mundo lusófono. Mais uma vez, os jornalistas fizeram a parte deles, como já tinha acontecido aquando do Wikileakes e das revelações de Edward Snowden. Veremos agora se o poder político, o judicial e a supervisão dão seguimento. Convenhamos, todavia, que a probabilidade disso acontecer é infima.

2) Espinho sem espinhas. Passos Coelho saiu-se bem do congresso. Fez o que quis e sobrou-lhe tempo. Analistas, jornalistas e comentadores (que não os militantes e dirigentes batidos) engoliram a história de que o PSD não tem pressa. Foi manchete em todo o lado. Na realidade para não ficar na postura de Velho do Restelo, Passos fez o que tinha a fazer e assumiu-se como oposição, sem deixar de sublinhar que ganhou as eleições. Deu mostras de abertura ao diálogo sobre questões importantes, nomeadamente a segurança social e leis eleitorais, sabendo que esses são exactamente temas em que o PS está amarrado de pés e mãos. Para o líder do PSD, o problema é que Costa entrou em modo de campanha permanente com grande eficácia e tem evitado estampar-se politicamente, preparando-se para essa probabilidade. Passos não renovou quase nada na equipa, nem deu aberturas. Limitou-se a alargar o seu núcleo duro, acentuando a componente feminina. Como esperado, apontou para as autárquicas, referindo-as como um marco importante, pois sabe que delas depende a sua liderança. Mas o que lhe daria jeito seria o colapso rápido do governo, agora que já pode haver dissolução da Assembleia. No discurso final não teve uma palavra de gratidão para Cavaco Silva, Durão Barroso e Marcelo Rebelo de Sousa. Quanto à oposição interna, confirmou-se que só existe em surdina, ao ponto de Maria Luís Albuquerque ter passado sem reparos discursivos a integrar uma vice-presidência. Espinho foi Passos Coelho igual a si próprio.

3) DBRS. Lá para o fim do mês a agência canadiana dirá se mantém ou desce o rating português. A coisa é importante porque se nos faz cair deixamos de ter o acesso actual aos mercados. Uma descida seria dramática. Há quem entenda que não há razões para uma apreciação negativa. Mas há. As contas que se esperam do primeiro trimestre não são brilhantes. A execução orçamental foi apertada pela circunstância de termos funcionado em duodécimos. Como nota de optimismo há a circunstância da DBRS ser tradicionalmente mais simpática do que as suas congéneres americanas, tendo ajudado a Itália e a Espanha.

4) SEF viaja. 34 inspectores do SEF foram para a Grécia  apoiar a devolução de refugiados supostamente económicos à Turquia. Depois, o contingente será substituído por outro igual. A notícia espanta quando se sabe que cá, os estrangeiros passam martírios para serem atendidos, para obterem respostas, para, enfim, serem tratados com dignidade. E sabe-se também que por detrás de certas frutarias de bairro (aliás úteis) há suspeitas de procedimentos ilegais de emigração, que se estendem a outras áreas e a um conjunto de esquemas, alguns dos quais envolveram quadros do Estado, empresas imobiliárias e advogados sem escrúpulos. Se não fosse isso, tudo bem à ida dos inspectores. Mas assim não faz sentido, a menos que esta seja mais uma oportunidade para colocar empresas de segurança privada a fazer o trabalho que compete ao Estado. 

5) As crateras lusitanas. Na A14 e na A41, duas das muitas auto-estradas que passaram a cobrir o país, o piso abateu escandalosamente. Fizeram-se dezenas de horas de emissão de televisão, rádio e centenas de notícias sobre o assunto, dando-se as explicações. Mas seria bom investigar, se na base de tudo isto não estará a celebre renegociação das PPP que o governo anterior tanto propagandeou. Esses cortes tiveram muito a ver com a redução das obrigações de manutenção por parte dos concessionários, passando-se esse encargo para o Estado através da empresa que detém para o efeito. Lá diz o povo “poupa-se no farelo, gasta-se na farinha”.