A corrida aos depósitos gerada por uma notícia da TVI de 13 de dezembro, um domingo, foi apontada pela administração do Banif como o golpe final que levou à resolução do banco. Mas na véspera da polémica peça da estação de Queluz, uma carta do Banco de Portugal (BdP) enviada ao Ministério das Finanças já indicava que seria quase impossível escapar a esse cenário.
Segundo essa missiva de sábado, a que o i teve acesso, o governador Carlos Costa alertou o ministro Mário Centeno de que “a medida de resolução é a única solução que salvaguarda a estabilidade financeira”, caso não fosse encontrado comprador para a instituição. Na altura estava em curso um processo de venda do Banif que acabaria por não ser bem sucedido.
Esta carta, escrita em inglês, será central na audição de hoje ao governador Carlos Costa, que terá de explicar aos deputados a evolução da posição do regulador em todo o processo. A possibilidade de resolução já tinha sido admitida em ocasiões anteriores, mas a comunicação assertiva ao ministro Mário Centeno nesse fim de semana é uma viragem decisiva do regulador, que dá como quase certo o passo da resolução.
Sem recapitalização pública Uma semana antes, no dia 4 de dezembro, o BdP tinha escrito a Centeno e indicava a preferência por uma recapitalização do banco com dinheiros públicos. A carta de 12 de dezembro afasta a possibilidade desse cenário, perante as reticências manifestadas por Bruxelas em aprovar novos apoios públicos ao Banif.
E sem capitais públicos, o BdP prevê o que iria ser o desfecho do banco, uma semana mais tarde. Se o processo de venda em curso falhasse, isso implicaria uma decisão da Comissão Europeia de que o banco já não era “viável” e que as ajudas públicas de 1,1 mil milhões de euros atribuídas ao banco em 2013 seriam consideradas “ilegais”.
E o que aconteceria nessa circunstância?“O Banco de Portugal, enquanto Autoridade Portuguesa de Resolução, […] não vê alternativa a não ser aplicar uma medida de resolução ao Banif para salvaguardar a estabilidade financeira e para minimizar os custos para os depositantes”, lê-se na carta.
Os administradores do BdP explicam que a resolução seria também necessária dadas as “circunstâncias específicas” do sistema financeiro português e as “singularidades” do papel do Banif na economia nacional. Além da resolução, a única opção ao dispor do regulador seria a liquidação do banco, mas o caminho da insolvência traria custos demasiado elevados.
“É a única solução” Considerando os impactos de uma “cessação imediata de pagamentos”, a “destruição de valor decorrente de uma liquidação” e o agravamento dos custos de financiamento do sistema financeiro causado pela ativação do Fundo de Garantia de Depósitos, o vaticínio é claro: “O Banco de Portugal considera que a medida de resolução é a única solução que salvaguarda a estabilidade financeira.”
A solução para o Banif é indicada depois de uma longa exposição sobre a delicada situação em que o banco se encontra. Depois de recapitularem o atribulado processo de ajudas públicas ao banco, que recebeu uma injeção de 1,1 mil milhões de euros em janeiro de 2013, o governador e outros dois administradores do BdP – José Ramalho e António Varela – alertam para as dificuldades do banco em cumprir as normas financeiras a que os bancos da zona euro estão sujeitos.
“A posição debilitada do capital do Banif, em conjunto com a incapacidade da gestão do banco em implementar medidas corretivas, causou uma deterioração significativa da posição de solvabilidade do Banif”, referem os administradores do BdP.
Falha de pagamentos à vista De acordo com os reguladores, o banco estava até com restrições de tesouraria, já que estava já a sofrer uma fuga de depósitos e sofria “sérias dificuldades” em obter financiamento. “Estas circunstâncias levam à conclusão de que o Banif enfrenta atualmente restrições de liquidez que, num curto período de tempo, podem pôr em risco o normal fluxo de pagamentos”, lê-se na carta.