O problema de Passos e o estado de graça de Cristas


Passos Coelho não pode deixar que o confundam com o Velho do Restelo. Cristas ganha espaço e é, para já, uma espécie de miss simpatia da política.


1) PSD. O problema de Passos Coelho é que, para que as coisas lhe corram bem politicamente, é preciso que saiam mal a todos os outros partidos, a Marcelo e aos portugueses em geral. Como é coisa que ninguém deseja, Passos terá de evitar tornar-se uma espécie de Velho do Restelo. 

No congresso do fim-de-semana, o líder do PSD apresenta-se com uma legitimidade nunca vista (recebeu 95% dos votos dos militantes que foram às urnas).

Com os seus putativos rivais ausentes (Rui fugiu outra vez e Sarmento deixou o seu recado na Antena 1), as notas dissonantes que pontualmente aparecerem servirão para alguns marcarem ou reafirmarem posições para o futuro, caso Passos Coelho não dure mais do que até ao Orçamento do Estado de 2017 ou às autárquicas de setembro desse ano. Diga–se, aliás, que muitas das manobras deste congresso terão já a ver com ambições e estratégias de poder local.
Tendo escolhido o isolacionismo e demarcação total dos outros políticos, Passos tem, mesmo assim, hipóteses de ser um vencedor nacional a prazo, pois nada indica que a situação económica do país melhore, a não ser através do turismo, que beneficia do mal de outros mercados.

Resolvida a questão do Orçamento com a promulgação descomprometida do tipo “a ver vamos” de Marcelo, o mês de abril abre com o congresso do PSD e segue com um conjunto de temas políticos relevantíssimos que mexem com muita coisa. Desde logo, a discussão do Plano Nacional de Reformas, ontem genericamente explicado por António Costa. A ele se seguirá o Programa de Estabilidade que o governo tem de elaborar e aprovar e que carece, teoricamente, do apoio do BE, PCP e PEV, que não será fácil de obter. A isto se seguirá a reunião inédita do Conselho de Estado (com a presença parcial de Draghi e Carlos Costa), não esquecendo a aproximação do 25 de abril e a aceleração que essa data e o 1.o de maio sempre trazem. 

Isto enquanto haverá que acompanhar a novela de terror Novo Banco, o caos Banif, que segue agora na Assembleia, e o imbróglio BPI/CaixaBank/BCP, e apreciar a forma como os indicadores económicos evoluem, nomeadamente em termos de emprego. Como é bom de ver por este enunciado, o campo político promete momentos palpitantes, mesmo sem contar com eventuais tempestades pontuais que a nau de António Costa irá enfrentando, embora sem provavelmente correr o risco de naufragar.

Além de estar atento a toda esta envolvência e de intervir sobre ela tentando não ser salpicado, Passos terá de manter o partido politicamente motivado para o quotidiano e prepará-lo para as autárquicas sem, no entanto, fazer passar para a opinião pública a ideia de um político ressabiado e amargurado. Ora esse é um equilíbrio que não é fácil de encontrar, mas sem o qual terá dificuldade em manter uma boa quota de popularidade. O congresso de Espinho será importante para isso e para ter uma ideia de quem está empenhado no apoio ao líder, quem espera para ver e quem se demarca por razões políticas substanciais ou mero taticismo. As votações para os órgãos do partido, designadamente o conselho nacional, darão indicadores preciosos sobre isso.

2) CDS. Ao contrário do que alguns teimam em pensar, Assunção Cristas tem boas hipóteses de não ser um hífen político entre Paulo Portas e Nuno Melo. Além de se ter autonomizado totalmente em relação ao PSD, ao ponto de se posicionar para uma candidatura pessoal à Câmara de Lisboa, a nova líder tem aceitação popular, suscita simpatia dentro e fora do partido, distribui afetos (também ela), apresenta uma família modelo, não tem preconceitos de classe ou de doutrina em excesso e federou praticamente todas as tendências do partido, que volta a ser mais CDS do que PP. Mesmo que Cristas dependa ainda da tutela de Portas e do beneplácito de Melo, que optou pelo regaço confortável de Bruxelas, a verdade é que a nova líder centrista vai fazendo o seu caminho, criando espaços de entendimento potencial com o PS, com o governo e com o Presidente, por via de uma faceta dialogante adequada ao momento do país. Para o PS e seus aliados, Cristas é bem-vinda. Por isso mesmo, também não sofre ataques e, pelo menos até ver, não se recordam decisões que outrora tomou e que estão agora a ter repercussões sociais. É o caso da lei das rendas, que tem esvaziado lojas e permitido alguns despejos de inquilinos. Será que alguém se lembra de quem prometeu que, ao fim de cinco anos, quando certas rendas fossem liberalizadas, haveria um esquema de financiamento pela Segurança Social para os mais desprotegidos? 

Jornalista


O problema de Passos e o estado de graça de Cristas


Passos Coelho não pode deixar que o confundam com o Velho do Restelo. Cristas ganha espaço e é, para já, uma espécie de miss simpatia da política.


1) PSD. O problema de Passos Coelho é que, para que as coisas lhe corram bem politicamente, é preciso que saiam mal a todos os outros partidos, a Marcelo e aos portugueses em geral. Como é coisa que ninguém deseja, Passos terá de evitar tornar-se uma espécie de Velho do Restelo. 

No congresso do fim-de-semana, o líder do PSD apresenta-se com uma legitimidade nunca vista (recebeu 95% dos votos dos militantes que foram às urnas).

Com os seus putativos rivais ausentes (Rui fugiu outra vez e Sarmento deixou o seu recado na Antena 1), as notas dissonantes que pontualmente aparecerem servirão para alguns marcarem ou reafirmarem posições para o futuro, caso Passos Coelho não dure mais do que até ao Orçamento do Estado de 2017 ou às autárquicas de setembro desse ano. Diga–se, aliás, que muitas das manobras deste congresso terão já a ver com ambições e estratégias de poder local.
Tendo escolhido o isolacionismo e demarcação total dos outros políticos, Passos tem, mesmo assim, hipóteses de ser um vencedor nacional a prazo, pois nada indica que a situação económica do país melhore, a não ser através do turismo, que beneficia do mal de outros mercados.

Resolvida a questão do Orçamento com a promulgação descomprometida do tipo “a ver vamos” de Marcelo, o mês de abril abre com o congresso do PSD e segue com um conjunto de temas políticos relevantíssimos que mexem com muita coisa. Desde logo, a discussão do Plano Nacional de Reformas, ontem genericamente explicado por António Costa. A ele se seguirá o Programa de Estabilidade que o governo tem de elaborar e aprovar e que carece, teoricamente, do apoio do BE, PCP e PEV, que não será fácil de obter. A isto se seguirá a reunião inédita do Conselho de Estado (com a presença parcial de Draghi e Carlos Costa), não esquecendo a aproximação do 25 de abril e a aceleração que essa data e o 1.o de maio sempre trazem. 

Isto enquanto haverá que acompanhar a novela de terror Novo Banco, o caos Banif, que segue agora na Assembleia, e o imbróglio BPI/CaixaBank/BCP, e apreciar a forma como os indicadores económicos evoluem, nomeadamente em termos de emprego. Como é bom de ver por este enunciado, o campo político promete momentos palpitantes, mesmo sem contar com eventuais tempestades pontuais que a nau de António Costa irá enfrentando, embora sem provavelmente correr o risco de naufragar.

Além de estar atento a toda esta envolvência e de intervir sobre ela tentando não ser salpicado, Passos terá de manter o partido politicamente motivado para o quotidiano e prepará-lo para as autárquicas sem, no entanto, fazer passar para a opinião pública a ideia de um político ressabiado e amargurado. Ora esse é um equilíbrio que não é fácil de encontrar, mas sem o qual terá dificuldade em manter uma boa quota de popularidade. O congresso de Espinho será importante para isso e para ter uma ideia de quem está empenhado no apoio ao líder, quem espera para ver e quem se demarca por razões políticas substanciais ou mero taticismo. As votações para os órgãos do partido, designadamente o conselho nacional, darão indicadores preciosos sobre isso.

2) CDS. Ao contrário do que alguns teimam em pensar, Assunção Cristas tem boas hipóteses de não ser um hífen político entre Paulo Portas e Nuno Melo. Além de se ter autonomizado totalmente em relação ao PSD, ao ponto de se posicionar para uma candidatura pessoal à Câmara de Lisboa, a nova líder tem aceitação popular, suscita simpatia dentro e fora do partido, distribui afetos (também ela), apresenta uma família modelo, não tem preconceitos de classe ou de doutrina em excesso e federou praticamente todas as tendências do partido, que volta a ser mais CDS do que PP. Mesmo que Cristas dependa ainda da tutela de Portas e do beneplácito de Melo, que optou pelo regaço confortável de Bruxelas, a verdade é que a nova líder centrista vai fazendo o seu caminho, criando espaços de entendimento potencial com o PS, com o governo e com o Presidente, por via de uma faceta dialogante adequada ao momento do país. Para o PS e seus aliados, Cristas é bem-vinda. Por isso mesmo, também não sofre ataques e, pelo menos até ver, não se recordam decisões que outrora tomou e que estão agora a ter repercussões sociais. É o caso da lei das rendas, que tem esvaziado lojas e permitido alguns despejos de inquilinos. Será que alguém se lembra de quem prometeu que, ao fim de cinco anos, quando certas rendas fossem liberalizadas, haveria um esquema de financiamento pela Segurança Social para os mais desprotegidos? 

Jornalista