A falta de divisas e a instabilidade nos preços do petróleo continuam a complicar a já grave situação em Angola. Para conseguir fazer face às dificuldades, que têm vindo a aumentar, o governo angolano está a estudar medidas que devem passar pela introdução de limites à importação de produtos considerados básicos, como ovos, bebidas ou hortícolas.
De acordo com informação divulgada esta semana, as medidas já começaram a ser discutidas pelos ministérios e pelo Banco Nacional de Angola (BNA). Ao que tudo indica, os limites serão impostos ainda este ano e preveem reduzir a dependência das receitas. Para isto, o governo angolano quer cortar cerca de 3500 milhões nas importações de alimentos básicos.
Estima-se, aliás, que durante o ano de 2015, a importação de produtos alimentares da cesta básica já tenha começado a cair (cerca de 7%). Até porque, de acordo com uma das edições de fevereiro do jornal “Expansão”, a crise financeira e cambial que se faz sentir em Angola já começou a provocar também situações graves no abastecimento de produtos essenciais. A publicação assegurava mesmo que já existiam vários produtos em falta nas superfícies comerciais.
Dependência em números De acordo com um documento a que a Lusa teve acesso, a importação de produtos alimentares básicos por Angola aumentou cerca de 94% entre 2013 e 2014, passando para um total anual de 3,6 mil milhões de euros, sobretudo devido ao crescimento da importação de leite em pó (100%), arroz (96%) e açúcar (96%).
Apesar de há um mês o “Expansão” ter denunciado a falta de alguns produtos, o governo entende que o país tem o poder de produzir internamente a generalidade dos produtos alimentares que são importados.
A ideia é tentar que exista um aumento dos postos de trabalho e também das receitas. Ou seja, ao que tudo indica, o governo angolano quer deixar de investir as poucas divisas do país na compra de produtos ao exterior.
Falta de divisas agrava-se Os bancos angolanos, que há meses se veem a braços com a falta de divisas, viveram esta semana um dos piores cenários dos últimos anos. De acordo com o relatório semanal do banco central sobre a evolução dos mercados monetário e cambial, os bancos deste país não receberam divisas na última semana – isto depois de, no período anterior, o BNA ter vendido apenas euros.
De acordo com os dados divulgados nesta análise, entre 7 e 11 de março não foram feitas vendas, depois de três semanas em que o banco central apenas disponibilizou divisas na moeda europeia – algo que aconteceu pela primeira vez, já que há vários anos que não há registo de uma semana em que não sejam injetados dólares na banca angolana.
A crise financeira, cambial e monetária é, aliás, um dos maiores problemas que Angola enfrenta há mais de um ano. A queda da cotação internacional do barril de crude provocou uma grave queda das receitas fiscais da exportação desta matéria-prima. Em 2015, estas receitas caíram para metade e, com isso, a entrada de divisas (dólares) no país também caiu.
Há pouco mais de um ano, antes do recrudescimento da crise do petróleo, a injeção de divisas em Angola chegava a ultrapassar os dois mil milhões de dólares mensais.
Desespero e alternativas Com os bancos sem dólares e as empresas sem dinheiro para pagar a trabalhadores e fornecedores, o mercado informal apresenta-se como a única solução para quem está verdadeiramente desesperado. Há quem pague metade do ordenado para conseguir trocar o vencimento para dólares e enviar para Portugal. Esta situação afigura-se como uma oportunidade para grupos à margem da lei. Ganha quem consegue viajar e trocar dólares em Portugal, o que faz com que existam já as chamadas “mulas” de dólares, como explicou no final de janeiro ao “SOL” Albano Ribeiro, presidente do Sindicato da Construção Civil.
O fim do Eldorado Com o mercado interno parado, muitas empresas nacionais viraram-se para o mercado externo, mas confrontam-se agora com a instabilidade dos destinos onde durante anos apostaram.
Um destes países é Angola, que foi durante muito tempo o eldorado para setores como o da construção civil, por exemplo. No entanto, a verdade é que os portugueses já viram melhores dias em Angola. Foi para conseguirem uma vida melhor que emigraram, mas é por não a terem conseguido que voltam. As empresas já não conseguem cumprir a promessa de uma vida melhor.
A situação dos empresários portugueses que operam em Angola está cada vez mais difícil. E a perspetiva de uma degradação adicional do ambiente de negócios assusta as empresas que viam o país africano como uma oportunidade de negócio.
Além disso, as dívidas às empresas portuguesas continuam a aumentar. Por isso, uma das maiores preocupações das empresas é a escassez crescente das divisas nos bancos.
sofia.santos@ionline.pt