A redução das contribuições dos trabalhadores para a Segurança Social prevista no Orçamento do Estado para 2016 está a gerar contestação nos trabalhadores do Estado. Caso a medida não se aplique também aos funcionários públicos, a Federação de Sindicatos da Administração Pública (FESAP) promete acionar mecanismos para levar a medida ao Tribunal Constitucional, incluindo o recurso ao provedor de Justiça.
A medida, que resultou das negociações do PS com os partidos de esquerda depois das eleições, prevê a redução da taxa social única (TSU) para trabalhadores com vencimentos inferiores a 600 euros mensais, o que na prática vai levar a um aumento do salário líquido desses trabalhadores. Os descontos passam de 11% para 9,5%, o que dará cerca de nove euros para quem ganhe 600 euros.
Mas a FESAP lamenta as informações “contraditórias” sobre o universo de trabalhadores a que a medida se aplica.
Se abranger apenas os trabalhadores do setor privado e os funcionários públicos mais recentes, que já fazem descontos como no privado, haverá uma situação de “desigualdade” e de “discriminação”, diz ao i José Abraão, dirigente daquela estrutura sindical.
Isto porque o sistema foi alterado em 2006. Nesse ano, os novos funcionários do Estado deixaram de descontar para a Caixa Geral de Aposentações (CGA) e passaram a descontar para a Segurança Social, como no privado.
Mas a maioria dos funcionários do Estado têm mais antiguidade e fazem as contribuições para a CGA. Como tal, podem não ser contemplados com a redução das contribuições. Se a medida avançar deixando de fora estes trabalhadores, a FESAP promete atuar. “Consideramos que há uma violação da Constituição e tomaremos diligências para que a medida seja analisada a esse nível”, adianta, acrescentando que estão em causa os princípios constitucionais da igualdade e da proporcionalidade.
“A administração pública abrange beneficiários de ambos os regimes de proteção social”, justifica a FESAP. No limite, acrescenta, poderia gerar-se uma “situação inaceitável em que, num mesmo local de trabalho, trabalhadores com as mesmas funções e o mesmo salário pudessem vir a ter um tratamento diferenciado”.
Os sindicatos não têm poder para solicitar diretamente ao Tribunal Constitucional a análise da legislação, mas podem fazê-lo indiretamente, recorrendo ao provedor de Justiça, que pode depois fazer esse pedido aos juízes.
É este o caminho que a FESAP admite percorrer se o governo não clarificar a situação. A medida será discutida numa reunião do governo com os sindicatos na próxima quinta-feira, 28 de janeiro. O i solicitou esclarecimentos ao Ministério das Finanças sobre o tema, mas não obteve resposta.
Fitch deixa aviso
Com os trabalhos para o Orçamento do Estado na reta final, a pressão sobre o governo intensifica-se, e não apenas à esquerda. As agências de rating estão também a deixar avisos.
Ontem, a Fitch publicou um relatório onde considera que o OE2016 está baseado em previsões de crescimento e planos de receitas e de despesas que podem “revelar-se irrealistas”.
E deixa um alerta: qualquer alívio orçamental que resulte numa trajetória menos favorável do endividamento público “pode levar a uma ação de rating negativa”, tal como um crescimento mais fraco com um efeito negativo sobre as finanças públicas.