Caça-cabeças. O segredo de contratar a melhor pessoa para o cargo

Caça-cabeças. O segredo de contratar a melhor pessoa para o cargo


As empresas que actuam neste mercado admitem que o processo é demorado e “investigam” tanto os trabalhadores no activo como aqueles que poderão estar desempregados.


Encontrar a pessoa certa para determinada função parece uma tarefa simples, mas nem sempre é. Em muitos casos, uma má contratação pode gerar elevados prejuízos para uma empresa. E é aí que entram as empresas de head hunting – em português são conhecidas por caça-cabeças –, destinadas a contratar essencialmente para altos cargos. 

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E o que fazem estas empresas? É simples: “Perante uma necessidade específica de um cliente em matéria de recrutamento, estuda de modo profundo a empresa, a sua cultura e a sua necessidade específica, de modo a encontrar candidatos com as competências requeridas, com vista a encontrar a relação o mais perfeita possível entre executivo e empregador”, revela ao i o partner da Boyden Luís Melo.

As empresas que actuam neste mercado garantem que a sua actividade acaba por funcionar como uma espécie de barómetro da economia portuguesa. Ou seja, quando o produto interno bruto (PIB) sobe, a actividade de head hunting também cresce. E porquê? Porque assistimos ao aumento do índice de confiança dos investidores e dos gestores e, como tal, as empresas começam a pensar em investir mais, a terem necessidade de expandir a sua actividade e surge a oportunidade de contratar mais, e daí até recorrerem às empresas caça-cabeças é um passo.
Mas nem sempre é assim. Em alturas de contracção económica também é natural assistirmos a uma procura de altos cargos, mas para controlo de custos. 

Ao mesmo tempo, este tipo de actividade acaba por ser afectada por acontecimentos internacionais que, apesar de não incidirem directamente nas empresas, influenciam as suas decisões de investimento. “Em 2007 tivemos o melhor ano de sempre. A partir de 2008 começou a sentir-se um ligeiro retrocesso e foi caindo até ao final de 2013. Em 2014 tivemos uma evolução maravilhosa e que foi bem superior ao crescimento económico, porque os decisores estavam tão contidos a fazer investimentos que assim que tiveram oportunidade de recrutar começaram a fazê-lo. Mas em 2015 e, ao contrário do que se previa, a recuperação económica não foi assim tão visível na nossa actividade”, salienta ao i a managing partner da Amrop, Maria da Glória Ribeiro. 

De acordo com a mesma, “a crise na China, a crise do petróleo, as duas eleições na Grécia provocaram incerteza nas empresas e isso acabou por ter muito impacto nas suas possíveis contratações porque se viram obrigadas a adiar decisões”. No entanto, reconhece que o aumento da confiança a que temos vindo a assistir desde o início do ano vai inevitavelmente contribuir para voltar a dinamizar este mercado. “Mais um ano e estamos a atingir os níveis de 2008”, confessa. 

Casamentos perfeitos A verdade é que as empresas vão sentindo cada vez mais necessidade de contratar este tipo de serviços para evitar más decisões. “As empresas nacionais entendem uma boa contratação como um factor crítico de sucesso nos seus negócios, razão pela qual procuram cada vez mais estes serviços. As empresas estrangeiras, por norma, já estavam mais evangelizadas para esta necessidade, e são as portuguesas que mais estão a mudar a visão que tinham do passado, incluindo empresas PME”, salienta Luís Melo.

O partner da Boyden chama a atenção para o facto de um mau recrutamento poder gerar grandes prejuízos. “E não falo de melhores ou piores profissionais nem de empresas com maior ou menor sucesso. Falo de ‘casamentos errados’. De profissionais que até podem ser óptimos, mas cujas características não são as certas para a cultura organizacional da empresa em causa e para o desafio proposto”, acrescentando ainda que “se estivermos a falar de executivos de topo, são eles que conduzem os destinos das empresas. Logo, um recrutamento errado pode trazer prejuízos muito consideráveis aos detentores do capital da empresa, e um recrutamento ‘menos bom’ pode impedir esses mesmos detentores de capital de ganharem mais dinheiro”, diz. 

 E esta questão acabou por ganhar maior importância em alturas de crise porque trouxe uma maior exigência por parte dos empresários. E se em tempos de economia favorável uma menor competência do que o desejável de alguns dos gestores de topo de uma organização levaria provavelmente a que os detentores do capital das empresas ganhassem menos dinheiro, quando estamos em crise isso pode levar a perdas significativas. 

Perfil As empresas contactadas pelo i admitem que não há nenhum tipo de perfil nem candidatos ideais. “O perfil certo será aquele que encaixar nas necessidades do cliente para uma determinada função e, muito importante, que se insira na cultura da empresa em questão. Muitas vezes, é neste ponto que está o maior grau de dificuldade na selecção de candidatos adequados, e não em temas de competência técnica”, salienta Luís Melo.

Uma opinião partilhada por Maria da Glória Ribeiro ao acrescentar que só depois de um grande trabalho de investigação é que chegam a uma short-list de candidatos e, mesmo nessa altura, é possível entrevistá-los e perceber que, afinal, não são as pessoas mais adequadas. “Todo o processo de recrutamento demora muito tempo e exige muita análise. Temos de estudar os mercados, não só o português, como também o estrangeiro, tanto que há muitos portugueses que estão emigrados e podem estar interessados em voltar ao seu país. Se correr tudo bem, podemos chegar a um candidato ao final de quatro semanas, mas há casos em que pode demorar o dobro”, salienta.

Já para a Boyden, até apresentar a tal short-list pode demorar 45 dias, mas a partir daí essa função passa para o lado do cliente, e também a responsabilidade pela maior ou menor celeridade em concluir o processo. No entanto, reconhece que é necessário entre dois meses e dois meses e meio desde o início do processo até ao fecho do acordo entre o candidato e o cliente. 

Luís Melo garante que nesse momento de procura tem em conta tanto trabalhadores no activo como no desemprego, e admite que “nos tempos actuais esbateu-se a crença, muitas vezes infundada, de que desemprego é sinónimo de incompetência”. Desta forma, considera que é natural “colocar executivos que estejam no activo como os que estejam em busca de um novo desafio profissional por motivos de desemprego . O importante é a qualidade profissional do executivo e a sua adequação ao cargo e à empresa-cliente”.

Já Maria da Glória Ribeiro admite que, ao contrário do que acontece em Espanha, não há muitos desempregados em quadros médios e superiores e, como tal, “procura-se essencialmente junto dos trabalhadores que estão no activo”. “Os que estão desempregados, com estas características, geralmente perderam a sua empregabilidade ou porque não evoluíram e não se adaptaram às novas necessidades das empresas, ou porque estão muito próximos da idade da reforma”, acrescenta. 

Por regra, os candidatos contactados mostram receptividade e interesse em querer saber mais sobre os projectos, o que não significa que aceitem sempre o desafio. “Há casos em que na entrevista dizem que não estão interessados ou por questões pessoais ou até mesmo profissionais, porque têm um projecto em mãos ou mudaram recentemente de departamento e não querem mudar”, revela a managing partner da Amrop. De acordo com a Boyden, a indústria, consultoria, healthcare & pharmaceutical, e retail & FMCG são os seus principais clientes. Já a Amrop revela que a maior procura se verifica na área do grande consumo e sector tecnológico. 

O i contactou outra empresa concorrente, a Egon Zehnder, que não quis prestar declarações, dizendo apenas que tem uma política corporativa de não prestar este tipo de informações.