Heresias


Citando Álvaro de Campos: “Não tenho preocupação intelectual ao escrever. 


Tenho a única preocupação de emitir emoções, deixando à inteligência que se aguente com elas o melhor que puder.” E nesse mesmo escrito, mais adiante: “ Menos que tudo é nada para a alma que não cata piolhos na lógica, nem olha para as unhas na estética.” É impossível dizer mais quando se lê tanto em tão poucas palavras!

É por isto mesmo que, quando ao sábado aqui releio o que escrevi, sinto o peso do mundo a cair-me em cima. Não por razões de auto--estima ou vaidade, mas por uma recorrente sensação de dúvida, de impertinência, ou porque muito provavelmente a mensagem passasse melhor de outro modo, ou com outro engenho. E maior é a agitação quando a crónica se espraia na política, esse fantástico éden de perfeição e bons costumes, tão frágil, tão delicado e tão sensível ao mais ténue suspiro de dúvida ou discordância.

Salvo uma ou outra honrosa excepção, a lógica política lida sempre mal com a imperfeição e, sabe-se lá porquê, tudo deve ser perfeito no raciocínio, sem lugar a epifanias, e muito correctamente alinhado com a gravata que se vista. Há de facto no discurso político uma auto--suficiência que, perdoai-me senhores, só a desvaloriza aos olhos de quem passa, e quando o imperativo ético é, deveria ser, o de a aproximar da vida, da res publica.

Mas hoje estou feliz pelo que acima citei. Agradeçamos sempre e muito às nossas boas leituras, porque é nelas que encontraremos sempre as palavras certas que às vezes nos falecem. E também porque “a alma não cata piolhos na lógica”.

Escreve ao sábado 

Heresias


Citando Álvaro de Campos: “Não tenho preocupação intelectual ao escrever. 


Tenho a única preocupação de emitir emoções, deixando à inteligência que se aguente com elas o melhor que puder.” E nesse mesmo escrito, mais adiante: “ Menos que tudo é nada para a alma que não cata piolhos na lógica, nem olha para as unhas na estética.” É impossível dizer mais quando se lê tanto em tão poucas palavras!

É por isto mesmo que, quando ao sábado aqui releio o que escrevi, sinto o peso do mundo a cair-me em cima. Não por razões de auto--estima ou vaidade, mas por uma recorrente sensação de dúvida, de impertinência, ou porque muito provavelmente a mensagem passasse melhor de outro modo, ou com outro engenho. E maior é a agitação quando a crónica se espraia na política, esse fantástico éden de perfeição e bons costumes, tão frágil, tão delicado e tão sensível ao mais ténue suspiro de dúvida ou discordância.

Salvo uma ou outra honrosa excepção, a lógica política lida sempre mal com a imperfeição e, sabe-se lá porquê, tudo deve ser perfeito no raciocínio, sem lugar a epifanias, e muito correctamente alinhado com a gravata que se vista. Há de facto no discurso político uma auto--suficiência que, perdoai-me senhores, só a desvaloriza aos olhos de quem passa, e quando o imperativo ético é, deveria ser, o de a aproximar da vida, da res publica.

Mas hoje estou feliz pelo que acima citei. Agradeçamos sempre e muito às nossas boas leituras, porque é nelas que encontraremos sempre as palavras certas que às vezes nos falecem. E também porque “a alma não cata piolhos na lógica”.

Escreve ao sábado