“Eu consigo, eu consigo!” A palavra de ordem no PS é “eu confio”, mas em Setúbal havia uma senhora que gritava assim à passagem de António Costa. A pressão que as sondagens colocam sobre a caravana socialista vê--se de fora e o “consigo” até parece fazer sentido a quem não anda ali todos os dias. Ontem, o “bombeiro” de outros tempos veio dar uma ajuda e gritar que “é hora do ajuste de contas”.
Jorge Coelho foi o convidado especial do almoço-comício em Setúbal – uma sardinhada no Largo da Fonte Nova –, distrito por onde foi cabeça-de-lista há 16 anos, e trouxe chama ao palanque socialista:“É hora do ajuste de contas. É assim que temos de chamar ao momento que estamos viver em Portugal. Está a acontecer algo muito grave”. Coelho tivera direito a uma abertura inopinada de uma mãe de Setúbal que apareceu em cima do palco a pedir para falar e provocou algum nervosismo na caravana. Havia de ser Coelho a dar sinal que se tratava de fogo amigo, enquanto a senhora, que não quis identificar-se, tentava fazer ouvir a música de Pedro Abrunhosa, “Para os braços da minha mãe”, a partir do seu telemóvel. Não conseguiu, por isso passou à mensagem impressiva:“Não somos piegas, somos mães.” Disse também ver no PS “oportunidade de mudança” e ainda atirou um “deixem para trás a síndrome de Estocolmo! Como é que as pessoas continuam a votar em Passos Coelho e Paulo Portas?!”
Os oradores seguintes aproveitaram a deixa. Primeiro Jorge Coelho, que referiu o testemunho para dizer que também não estava ali para falar de números. E recuou 20 anos para ir buscar o slogan com que António Guterres se apresentou, em 1995. “Falo–vos com a razão e o coração porque não tenho outra forma de estar na política”.
Apelo ao BE e PCP Costa declarou: “Não sei se é por ver aqui Jorge Coelho que me vem à cabeça aquela ideia de que as pessoas estão primeiro. É mesmo para as pessoas que a política existe.” Mas nem por isso o candidato do PS deixou de parte os números e atirou aos “truques” do governo, numa referência à notícia do dia (ver páginas 6 e 7). A mensagem maior foi, no entanto, política.
Num distrito tradicionalmente de esquerda (até mais à esquerda que oPS), Costa queixou-se de o PS estar “sozinho contra a direita toda, a disputar palmo a palmo a vitória nestas eleições”, atirando directo: “O mínimo que se pede às outras forças políticas é que ao menos concentrem forças a atacar a direita e não desperdicem energia a atacar o PS. Depois das eleições podem voltar às manifestações e a dizer ‘Costa para a rua’, mas nestas eleições o que está em causa é o Passos Coelho e o Portas irem para a rua.” Assim mesmo, “o”.
Já no Barreiro, o líder do PS foi abordado por um homem que lhe disse ser aquela “uma grande terra de onde saíram grandes jogadores para o Benfica”. Mas nem por isso os socialistas tiveram uma recepção de relevo. O candidato teve mesmo de entrar lojas adentro para ir ao encontro das pessoas. Bem diferente foi a descida da Morais Soares, em Lisboa, onde Costa teve ao lado o seu sucessor na câmara, Fernando Medina (para quem chegou a chutar uma queixa de um lisboeta, a meio da rua), Ferro Rodrigues (o único ex-líder que tem aparecido), João Soares (que apoiou Seguro), Miranda Calha ou José Sá Fernandes.
A descida até teve de ser feita pelo meio da estrada e não pelos passeios, com a polícia a ser chamada a intervir para controlar o trânsito em plena hora de ponta. No final, Costa foi firme no apelo feito ao megafone: “Até domingo temos de lutar voto a voto porque cada voto conta para a maioria de que o PS precisa. É preciso recordar todos que só o voto no PS permite mudar o governo.”
Ao almoço, Coelho tinha sido mais sugestivo ao somar outra mensagem, quando atirou à coligação que “se esconde” atrás do nome PàF, “para as pessoas se esquecerem que quem está a ir a votos é o PSD e o PP”:“Agora querem que os portugueses se esqueçam que foram PSD e PP que os conduziram até aqui. Acham que os portugueses são PàFs?” E no seu estilo próprio deu logo a resposta. “Não acredito. Nem nós nem o povo português somos PàFs!”