Os emails de Renato Ladeiro chegam sempre com a mesma nota final: “Titular para marca nacional n.º474548 (TUK TUK)” é a frase que assinala a sua batalha. As dores de cabeça do empresário de Coimbra cresceram na exacta proporção em que, nos últimos três anos, os riquexós (tradução do original em inglês) foram ocupando as ruas de múltiplas cidades do país.
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Todos quiseram lucrar com um negócio cujos lucros poderão andar pelas largas (muito largas) centenas de milhares de euros. Ou milhões.
Dezenas de empresas, câmaras municipais e juntas de freguesia – a todas, Renato Ladeiro já tentou explicar que estão a violar a lei e a roubar-lhe uma marca que lhe pertence. Foi ele o pioneiro nas andanças dos riquexós, depois de uma viagem à Tailândia e de ter percebido que o conceito poderia ser cunhado em Portugal.
Mas muito poucos ouviram e menos ainda foram os que fizeram por mudar a irregularidade. Por isso, a solução foi partir para os tribunais.
A “batalha” começa em 2011. Sensivelmente um ano depois de Renato Ladeiro ter visto o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) atribuir-lhe a propriedade da marca Tuk Tuk (aquela que apresenta nos seus e-mails), o empresário percebeu que começavam a sair da sede do INPI mais “donos” de marcas em tudo semelhantes à sua. A Tuk Tuk Lisboa foi a que se seguiu e que rapidamente dominou a actividade em vários pontos do país.
Os registos no INPI continuaram, até às actuais 41 marcas nacionais, em quase 20 categorias diferentes, mas com um elemento comum: a referência ao “tuk” com que na Tailândia se baptizaram originalmente estes veículos.
O imbróglio jurídico começa a formar-se – sublinha Renato Ladeiro, enquanto cita de cor artigos do código de propriedade industrial – quando essas empresas passam a apresentar nos seus veículos a marca Tuk Tuk ou derivadas. E é aqui que entra o pormenor das categorias em que foi registada cada uma das marcas.
O empresário de Coimbra obteve o registo na categoria 12, que abarca uma lista infindável de “veículos; aparelhos de locomoção por terra, por ar ou por água”. Traduzindo, sem o consentimento do empresário, nenhuma empresa poderia, nos seus veículos, apresentar a marca Tuk Tuk ou semelhantes.
Minha marca, tua marca
O próprio INPI reconhece-o. O instituto recorre à mesma legislação para lembrar que “o titular goza do ‘direito de propriedade e do exclusivo da marca para os produtos (…) a que a mesma se destina’” e que lhe assiste o “direito de impedir terceiros, sem o seu consentimento, de usar, no exercício de actividades económicas, qualquer sinal igual, ou semelhante, em produtos ou serviços idênticos ou afins daqueles para os quais a marca foi registada, e que, em consequência da semelhança entre os sinais e da afinidade dos produtos ou serviços, possa causar um risco de confusão, ou associação, no espírito do consumidor”.
Apenas a Eco Tuk – uma empresa de origem holandesa – registou a marca na mesma categoria. As restantes empresas ficaram distribuídas por outras categorias e é essa a razão para que o INPI justifique não haver qualquer conflito. “Para que se encontre preenchido o conceito jurídico de imitação de marca (…) é necessário que estejam em causa produtos ou serviços idênticos ou afins”, refere o instituto.
E este não será o caso. “Não se verifica um nexo de afinidade, muito menos de identidade, entre os supracitados produtos da classe 12 e, por exemplo, serviços como os insertos na classe 39 da Classificação de Nice”, acrescenta o INPI.
Renato Ladeiro tem uma opinião diferente. “É difícil compreender como é que uma entidade pública permite que se crie um litígio assim tão grande”, desabafa. E ensaia uma explicação, com base na leitura que faz do código de processo industrial. “No final disto tudo, o INPI vai receber dinheiro.
Com as multas [que possam vir a ser aplicadas], uma parte é para o tribunal, outra para o INPI e ainda uma outra para a ASAE, que é quem vai investigar estas situações, se o Ministério Público assim decidir”.
Dezenas de Processos
Depois de muitas chamadas de atenção, o empresário de Coimbra partiu para os tribunais. Já deram entrada mais de 35 participações e apenas uma acabou arquivada. Nesse caso, o magistrado responsável entendeu arrumar o processo, justificando essa decisão com a prescrição de um “crime permanente”.
Noutros casos, como acontece, por exemplo, no Porto, o MP investigou e optou por delegar na ASAE a recolha de mais provas, num processo que está ainda em curso. A ser-lhe dada razão, o empresário poderá vir a ser ressarcido em vários milhares de euros, mas garante que nunca fez contas. “Aquilo que eu quero é que me seja reconhecido o que me pertence por direito, a titularidade de uma marca, além do respeito pelo código de propriedade industrial”, garante.
E esse prevê uma “pena de prisão até três anos” para quem se dedique a copiar, a imitar ou usar abusivamente marcas que não lhe pertencem.







