Há cerca de um mês, num dos seus editoriais, Luís Osório referiu uma história que lhe contei, passada há quase 30 anos com o meu sábio e saudoso professor António José Saraiva, que eu visitava regularmente. Indignava-me então a maioria absoluta obtida pelo “Poço” (de Boliqueime), e perguntava como seria possível, a tão poucos anos da madrugada de Abril, que o voto popular desse tal resultado. O mestre sorriu, e questionou-me sobre os provérbios populares. Fiquei perplexo, e veio logo uma catadupa deles, “Quem tudo quer tudo perde”, “Ao alto se sobe, do alto se cai”, “Mais vale prevenir que remediar”, “Cautela e caldos de galinha”, etc. E enfim, depois de 300 anos de Santo Ofício e 48 da secreta, consciencializei então, pela metáfora do mestre, que há uma dominante proverbial conservadora, senão mesmo reaccionária.
Na muche: eis que, esta quarta-feira, Paulo Portas lança aos mediáticos bytes o famoso dito “Mais vale um pássaro na mão do que dois a voar”! Mais do que importar marketing dos Brasis ou inventar a roda, nada existe agora de melhor para a esgotada coligação do que excitar o temor reverencial de tantos portugueses, martirizados por uma “culpa” que não é originalmente sua, supostamente vergados ao simples agitar do chicote penitencial. A jogada não é de risco: ressuscita-se o mito pelo apelo lancinante ao voto de uma “classe média” insípida e historicamente muito pouco consolidada. Assim se faz o circo do medo, triste e obscuro. Oxalá se enganem, porque há, de facto, outro caminho para 4 de Outubro. E sem botifarras.
Escreve ao sábado