Alemanha planeia resgate para atacar crise de refugiados em África

Alemanha planeia resgate para atacar crise de refugiados em África


França acusa a Hungria de não respeitar os valores da UE ao construir muro na sua fronteira.


O mais evidente na crise de refugiados que marcou o Verão europeu foi ter deixado clara a diferença entre os problemas de um “continente rico” e a verdadeira tragédia dos países no Médio Oriente e África onde se ergueu a maior onda de imigração desde a II Guerra Mundial. A chanceler alemã, Angela Merkel, reconheceu que a Europa “está em condições” de fazer frente ao problema e a revista alemã “Der Spiegel” citava fontes governamentais ao cifrar em um milhar de milhões de euros o fundo que sustentará um plano de acção para atacar o problema na raiz, procurando reduzir o fluxo de refugiados. O objectivo será ajudar financeiramente os países africanos, contribuindo para os estabilizar e pôr fim aos conflitos e perseguições. Em troca será exigido que facilitem as condições de retorno e restabelecimento dos seus cidadãos.

A maioria dos refugiados e migrantes que tentam chegar à Europa através do Mediterrâneo partem da Líbia, no norte de África, país onde se instalaram as redes de tráfico humano, explorando a instabilidade e o conflito que se seguiu a outra aventura desastrosa da política externa norte-americana, uma vez mais com a conivência das potências europeias. Aproveitando o balanço da Primavera Árabe, o Ocidente resolveu livrar-se de um ditador incómodo, Muammar Kadhafi, e hoje o país é disputado entre facções rivais sedentas de poder, com o território fragmentado entre bandos armados e milícias islamistas, algumas com ligações ao Estado Islâmico.

A concessão de fundos será, portanto, orientada por um esforço de colaboração, tendo como fim a repatriação dos refugiados. Os termos concretos deste plano de resgate europeu para a África serão discutidos na cimeira UE-África que se realizará em Malta, a 11 e 12 de Novembro.

O fracasso da gestão europeia da crise foi por várias vezes apontado, nomeadamente por Itália. Até ao momento, os planos ficaram-se por medidas de contenção, com 2,400 milhões disponibilizados para socorrer ao longo dos próximos seis anos os países mais afectados pela vaga de imigrantes, apoiando a criação de centros de refugiados. A nova estratégia passa a concentrar o foco nos países emissores, em vez dos receptores.

A cambalear na incerteza e divisão interna face à falta de vontade política e de uma liderança capaz de pôr um travão à crise das dívidas soberanas, a confusão no seio da UE promoveu um ambiente de salve-se quem puder perante a vaga de refugiados. Alguns países, como a Hungria – que concluiu a construção de um muro com quatro metros de altura e 175 quilómetros de comprimento, para impedir a entrada de uma média de 3 mil refugiados por dia –, assumiram as suas próprias iniciativas para se isolarem do problema.

Entretanto, o governo francês colocou-se no papel de autoridade moral, com o seu ministro dos Negócios Estrangeiros, Laurent Fabius, a classificar como “escandaloso” este tipo de atitudes e acusando a Hungria de “não respeitar os valores comuns da UE”. Mas o primeiro-ministro italiano, Matteo Renzi, em entrevista ao “Corriere della Sera”, fazia notar como foi o fracasso da própria UE em estabelecer uma política comum que levou a que a resposta ao problema tenha sido ineficaz, muitas vezes com medidas “míopes e fragmentadas”. 

Renzi apelou, como noutras ocasiões, à “internacionalização desta crise”, para que não seja apenas um problema da Itália ou da Grécia. “Este é o momento para lançar uma ofensiva política e diplomática. A Europa tem de deixar de se comover e começar a mover-se. Acabou-se o tempo dos minutos de silêncio. (…) Não basta tapar a emergência, é preciso ter um papel maior em África e no Médio Oriente.”