Muitos consideram-no uma espécie de Anticristo que quis vingar-se cruelmente dos Gregos impondo condições draconianas para o terceiro resgate. Mas na Alemanha Wolfgang Schäuble tem uma reputação diferente. E uma base de apoio impressionante – mais concretamente de 73%, dizem as sondagens. Em entrevista recente à Spiegel (publicada em Portugal pelo DN), revelou: «[Após o anúncio do acordo] a minha caixa de e-mail ficou completamente cheia e 90% das mensagens eram expressões de opinião que me apoiavam. Nunca tinha experimentado uma tal onda de concordância».
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Aos 72 anos, o ministro das Finanças alemão é um dos homens mais poderosos da Europa, chegando por vezes a fazer prevalecer as suas ideias sobre as de Angela Merkel. A história da relação com a chanceler não é, de resto, linear: Merkel chegou a ser sua vice, depois o equilíbrio de forças viria a inverter-se.
O mais incrível, porém, é que Schäuble conseguiu construir todo este poder a partir de uma cadeira de rodas. É dela que depende para se deslocar desde 1990. A 12 de Outubro, apenas nove dias após a cerimónia da reunificação das duas Alemanhas, foi atingido durante um comício por um dos três tiros disparados por um homem mentalmente perturbado. Esteve entre a vida e a morte, mas os médicos conseguiram evitar o pior. O episódio tornou-o “um homem amargo”, acusou Hans Jochel Vogel, líder do rival SPD. Schäuble, habitualmente contido, não gostou do comentário: “Dizer que sou obstinado, ou amargo, ou mau é uma palermice”, reagiu ao Die Zeit.
Membro do Parlamento alemão há mais de 40 anos, subiu na carreira à sombra do líder conservador Helmut Köhl, chanceler entre 1982 e 1998, que curiosamente também se encontra numa cadeira de rodas – em 2008 foi encontrado inconsciente no chão da cozinha de sua casa, com uma poça de sangue à volta da cabeça e não mais recuperou. Schaüble, que foi chefe de gabinete de Köhl e líder parlamentar dos democratas cristãos, chegou a perfilar-se como seu sucessor à frente do governo. Na altura, a revista Stern perguntava: “Um aleijado como chanceler?” O visado responde com fair play: “É perfeitamente legítimo colocar a questão. Se assumimos um cargo público temos de estar dispostos a aceitar o debate sobre nós. Eu próprio me perguntei se um homem numa cadeira de rodas poderia liderar o país”. Mas a CDU perdeu as eleições de 98 e no final de 1999 o homem da cadeira de rodas viu-se envolvido num escândalo relativo ao financiamento do partido que minou o seu prestígio e credibilidade. Kohl não o defendeu.
Ainda assim, o antigo braço-direito do chanceler conseguiria regressar aos lugares cimeiros do poder. Em 2004 viu Merkel negar-lhe o apoio para se tornar presidente, mas logo no ano seguinte foi convidado para assumir a Pasta do Interior.
Schäuble não se furta a falar sobre a sua deficiência. Numa entrevista concedida ao Spiegel em Dezembro de 2011 explicou como lida com as limitações: “Não posso movimentar-me livremente. É a única coisa que me aborrece um bocadinho. Quando estou no eurogrupo em Bruxelas, os colegas que me queiram falar têm de vir ter comigo. Mas espero que saibam que isto nada tem que ver com arrogância». Os interlocutores normalmente optam por curvar-se para lhe dirigir a palavra.
Frequentemente, Schäuble convida-os a puxar de uma cadeira e a sentar-se, o que permite uma conversa mais tranquila. De resto, o ministro das Finanças considera-se “livre” e diz que a cadeira de rodas nunca foi um entrave. “Até viajar é relativamente fácil, uma vez que sou simplesmente levado para dentro ou para fora do avião. Há sempre pessoas à volta para me ajudar”. Na mesma entrevista revelou que chega a fazer piadas sobre a sua situação e que sonha poder andar. Literalmente. “Otto Graf Lambsdorf, que infelizmente já morreu, um dia perguntou-me se nos meus sonhos eu ando ou se estou numa cadeira de rodas. Nunca tinha pensado nisso. Então pensei um pouco e disse-lhe: “Sou um peão nos meus sonhos””.
