De repente, Tatiana deixou de ver as letras do exame de português do 9º ano. Sentiu fortes tonturas. Não contou a ninguém. Controlou-se, respirou fundo, fechou os olhos durante uns instantes e a cegueira acabou por passar. Tem 16 anos, está agora no 11º e vai fazer dois exames nacionais – Geografia e Filosofia. Tatiana González diz que é frequente ter ataques de nervosismo por causa da ansiedade, mas o seu problema é sobretudo com o Português, disciplina em que sente maiores dificuldades e, embora ainda esteja a um ano de fazer essa prova, teme o que possa vir a acontecer nesse dia. Quanto às provas deste ano, confessa-se nervosa. Não é caso para menos: “Afinal, é o resultado de todo o ano e é o que decide, em parte, a minha transição.” Mas até “está à vontade com as diciplinas”. Ainda não tem certezas quanto ao curso que quer tirar. Está entre Direito, Ciências Políticas e Criminologia. Jornalismo é a última das suas opções
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Cristiana Silvestre é bem mais calma. Tem 17 anos e uma média superior à idade (18,5 valores). Nunca teve nenhuma branca, mas não põe as mãos no fogo por si, quando confrontada com essa possibilidade nos dias que se aproximam. “A ansiedade é uma coisa normal, sobretudo porque este ano vai ser tudo novo. O Ministério da Educação acabou com os testes intermédios por falta de orçamento. Estes exames vão ser um tiro no escuro, não sabemos mesmo o que vai sair”, critica, salientando que vai ser a primeira vez em que estas provas vão misturar matérias dos três anos. Na Matemática, por exemplo, “há livros novos com exercícios medonhos”.
Este medo do desconhecido e a certeza da importância dos resultados nos exames, sobretudo para quem quer entrar no ensino superior, é uma combinação que faz subir a pique os níveis de ansiedade e de nervosismo dos alunos. Trata-se do culminar de um percurso de, pelo menos 12 anos de aprendizagem e o início de uma nova etapa que envolve sempre uma grande carga emocional. O psicólogo escolar, Jorge Humberto explica-nos que existem três tipos de alunos, os que já sabem que não têm hipóteses de transitar; os medianos que ainda não sabem o que querem ser, e por essa razão, não têm preocupações com notas nos exames; e os alunos bons e muito bons.
E são precisamente estes últimos os que mais sofrem de ansiedade. “São os que estudam e que se esforçam durante todo o ano. Têm noção do que valem, sabem que curso querem seguir, que médias têm de cumprir para alcançar os objectivos e uma décima pode fazer a diferença”, descreve o professor, notando que estes alunos “querem ver expressas no papel as suas reais potencialidades”.
Por sentirem o peso da excelência nos ombros, estes são também os estudantes que sofrem mais vezes bloqueios na hora da prova, resultado das suas próprias expectativas, das dos professores e dos pais. O psicólogo nota que este ano, muito mais do que em anos anteriores, existem outros factores relacionados com a crise financeira que vão afectar a prestação dos alunos nos exames. “Há miúdos que até têm boas médias e que até querem ir para a universidade, mas que já se estão a aperceber que os pais não vão ter capacidade financeira para isso”, lamenta.
Outro factor importante que influencia o desempenho escolar, refere o especialista em psicologia escolar, é o acompanhamento dos pais. “Os que valorizam e acompanham o estudo durante todo o ano e que promovem o bem-estar emocial dos filhos” diminuem-lhe a carga de ansiedade. Por outro lado, os pais que exigem resultados mas que não acompanham o processo de aprendizagem no seu todo fazem aumentar o nível de stresse dos filhos. Felizmente, realça Humberto, as escolas e os professores estão muito preocupados com os alunos, acompanhando-os mais de perto, nomeadamente depois do período lectivo, com aulas extra para ultimar a preparação para os exames.
Jorge Guerreiro, de 17 anos, também vai prestar contas nos exames nacionais e peomete aproveitar ao máximo as aulas de apoio. Quer seguir Desporto e até já fez os pré-requisitos na Faculdade de Motricidade Humana. Não sabe se vai ter nota para entrar nesta universidade e por isso estas provas vão ser de extrema importância. Até lá pensa “estudar os dias todos desde que termina a escola até a altura dos exames, ir aos apoios e explicação”.
Demasiada pressão? Diminuir a pressão poderia até passar por mudar o actual modelo de avaliação. Quem defende isso é o director das Escolas Ferreira de Castro (Sintra): “Os exames nacionais feitos no final do 11.º e 12.º anos para entrar no ensino superior prejudicam a aprendizagem dos alunos durante o ano lectivo”, diz , António Castel-Branco. E estas provas deveriam servir apenas para avaliar o secundário e não para dar passagem para a universidade: “Os exames nacionais subvertem toda a aprendizagem durante o ano”, defende o director, afirmando que o peso da faculdade e a pressão a que os estudantes são submetidos não faz muito sentido. “As universidades é que deveriam fazer as provas de ingresso”, finaliza.