
Há dez anos, o Benfica dá um golpe de autoridade na Liga com um golo limpo (e teimosamente discutido).
O aviso é dado naquela noite de 26 de Janeiro, num emocionante espectáculo de 120-e-tal minutos na Luz. Aos 23’, já há 2-2. Paíto entorta Luisão aos 110’ e Tiago encaixa o 3-3 de Simão aos 117’. Vamos para penáltis. Os 13 primeiros remates traduzem-se em golo, o 14.º esbarra na trave (Miguel Garcia). Passa o Benfica, chora oSporting. A mesma dinâmica manter-se-ia em Maio, mais precisamente na noite de sábado, dia 14.
Benfica e Sporting jogam o título de campeão nacional na penúltima ronda. AoSporting (61 pontos), basta o empate para manter o primeiro lugar antes de receber a final da Taça UEFA e depois o Nacional para um eventual final feliz. Já o Benfica (61 pontos, mas atravessado com a derrota de Alvalade na primeira volta) está obrigado a ganhar para dar a volta ao texto.
Giovanni Trapattoni joga com o onze-tipo desde o estrondoso 4-1 no Restelo, em Dezembro. Assim, é Quim; Miguel, Luisão, Ricardo Rocha e Dos Santos; Petit e Manuel Fernandes; Geovanni, Nuno Assis e Simão; Nuno Gomes. No outro lado, José Peseiro aposta em Ricardo; Miguel Garcia, Polga, Beto e Rui Jorge; Rochemback, Custódio e Moutinho; Douala, Sá Pinto e Barbosa. Ué, e Liedson? Esse está fora. Quando Tello, na jornada anterior, desbloqueia o 0-0 com o Vitória de Guimarães e o Sporting atira-se à liderança da liga, na sequência do surpreendente 1-0 de N’Doye (Penafiel) ao Benfica. Só há um senão: o amarelo de Olegário a Liedson aos 90+2 minutos por pontapear uma bola que já está fora. O cartão acarreta suspensão e o melhor marcador do campeonato não vai à Luz.
À partida, nada de anormal: sem o brasileiro, o Sporting vira a eliminatória com o Newcastle (4-1) e dá espectáculo em Braga (hat-trick de Pinilla, 3-0). Com o Benfica, tudo diferente. E é Luisão, o homem mais sofredor de sempre na marcação individual a Liedson nos dérbis anteriores (e até posteriores), quem assina o 1-0 para desespero do guarda-redes Ricardo. O famoso lance é aos 83’19’’.
Falta de Pinilla sobre Ricardo Rocha, livre de Petit para a molhada e entrada fulgurante de Luisão. O guarda-redes doSporting também se sai e a bola entra. O árbitro Paulo Paraty não hesita em assinalar o meio-campo como ponto de partida sem retorno mas... “Estava bem posicionado e não detectei qualquer irregularidade. No momento subsequente, e quando o Ricardo me deu a palavra de honra de que o Luisão teria marcado o golo com a mão, tive uma ligeira hesitação e confirmei a decisão com o meu assistente José Ramalho. O modo afirmativo como o Ricardo se dirigiu a mim criou-me alguma dúvida quanto à possibilidade de o golo ter sido com a mão.”
Ricardo convive mal com a decisão. Na zona mista, o guarda-redes diz de sua justiça. “Qualquer contacto mínimo que haja com o guarda-redes é sempre falta. E agora até nem foi um contacto mínimo, porque caí de costas.”
Voltamos a Paraty. “Há duas coisas que têm sido ditas: o guarda-redes não pode é ser carregado; e não é proibido que no movimento de corpos – e o Luisão até está pela frente do Ricardo – haja qualquer contacto sem interferência no lance. Importante é dizer-se que, à excepção de dois/três, os jogadores do Sporting deram-me os parabéns.”
O i telefona a Beto, espectador atento a esse lance – e expulso aos 87’. “Xiii, da próxima vez, telefona-me para uma memória boa, está bem ò Rui?” De seguida, cá vai disto. “É daqueles dias em que tu acabas o jogo e queres refugiar-te no teu canto, sabes? Só precisávamos do empate e aquele golo, a dez minutos do fim, deitou-nos abaixo. Não conseguimos reagir nem dar a volta.” De tal maneira que oSporting até acaba em 3.º lugar (4-2 do Nacional em Alvalade), atrás do Porto (1-1 com a Académica no Dragão) e do campeão Benfica (1-1 no Bessa).