Com a União Europeia (UE) na sala de espera e Volodymyr Zelensky barrado à porta de entrada, a Base Conjunta Elmendorf-Richardson, no limite norte da cidade de Anchorage, no Alasca, EUA, servirá de palco para a conversa entre Donald Trump e Vladimir Putin. Os dois chefes de Estado irão trocar ideias e eventuais pontos em comum, se existirem, para um possível caminho de implementação de um cessar-fogo na guerra da Ucrânia.
«Vamos ter uma reunião com Vladimir Putin e provavelmente nos primeiros dois minutos saberei se um acordo pode ou não ser feito», disse na terça-feira o Presidente dos EUA aos jornalistas.O anúncio do encontro, no início desta semana, pelo líder norte-americano, muito entusiasmado e agora com a mira apontada ao Nobel de Paz, veio com um erro histórico: Donald Trump disse que ia à Rússia: «Vou ver Putin. Vou para a Rússia na sexta-feira». Só que o Alasca não é território russo desde 1867, quando foi vendido aos EUA por 7,2 milhões de dólares. O negócio foi na altura visto como uma extravagância do secretário de Estado de então, William Seward. Mas o tempo viria a dar-lhe razão.
Barrado da mesa dos adultos
De fora da conversa dos crescidos fica o Presidente da Ucrânia. Trump, no seu tom mais vigoroso e impulsivo, chegou a dizer que a ausência do seu homólogo ucraniano é uma realidade porque Zelensky não fez «nada». Foi assim: «Ele não faz parte [da reunião]. Eu diria que ele podia ir, mas já esteve em muitas reuniões. Já está lá há três anos e meio. Não aconteceu nada», disse o líder norte-americano, em declarações que trouxeram à lembrança o encontro desastroso entre Trump e Zelensky na Casa Branca. Entretanto, na terça-feira, a justificação dada para a ausência de Zelensky já foi outra. Nas palavras de Karoline Leavitt, porta-voz da Casa Branca, a reunião de hoje só vai acontecer porque «o Presidente da Rússia pediu ao Presidente dos Estados Unidos para se encontrar com ele». Nada de Volodymyr Zelensky nesta fase.
Por outro lado, o mesmo Trump também já confessou que pretende contactar Volodymyr Zelensky e juntar o trio na mesma sala, no futuro. «O próximo encontro será com Zelensky e Putin, ou Zelensky, Putin e eu. Estarei lá se precisarem de mim», prometeu.
Como seria de esperar, o líder ucraniano não gostou de ficar de fora da conversa. E já fez saber que não irá reconhecer nada do que for acordado sem a presença da Ucrânia. «É impossível falar sobre a Ucrânia sem a Ucrânia, e ninguém reconhecerá isso. Esta conversa pode ser importante para o caminho bilateral [Rússia-EUA], mas não podem decidir nada sobre nós sem nós. Espero que o Presidente dos EUA entenda e leve isto em consideração», disse Zelensky, durante um fórum. Ainda assim, apesar de a reunião ainda não ter acontecido, já produziu efeitos na estratégia ucraniana. De acordo com o The Telegraph, Zelensky terá comunicado aos líderes europeus que a Ucrânia está disposta a ceder territórios – os que já estão ocupados pela Rússia – ou seja, Crimeia, Luhansk e, provavelmente, Donetsk, praticamente dominada, ou ainda Zaporíjia e Kherson. Uma linha vermelha até então recusada. Também aos europeus, o líder ucraniano terá comunicado nove mandamentos cruciais para um eventual cessar-fogo. Ao que se sabe, um desses pontos prende-se com a impossibilidade de a Ucrânia para ceder território que a Rússia não controla.
Mas há vida além da guerra. Donald Trump pretende acima de tudo, com este encontro, ler Vladimir Putin nas entrelinhas e perceber como as relações entre EUA e Rússia podem ser melhoradas. E perceber como pode conter o papel da China não apenas no campo diplomático, mas também do Conselho do Ártico, do qual fazem parte o Canadá, a Dinamarca, a Finlândia, a Islândia, a Noruega e a Suécia, o que também poderá trazer o assunto Gronelândia para a discussão.
UE tenta aparecer
Numa tentativa de mostrar a sua relevância, já que a União Europeia parece não conseguir aguentar o braço de ferro para garantir um lugar à mesa da negociações, foi realizada, na quarta-feira, uma cimeira europeia, em Berlim, na Alemanha, na qual estiveram presentes a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, o chanceler alemão, Friedrich Merz, o primeiro-ministro britânico, Keir Starmer e o Presidente francês, Emmanuel Macron, bem como chefes de Estado e de Governo da Finlândia, Itália e Polónia, o presidente do Conselho Europeu, António Costa, e o secretário-geral da NATO, Mark Rutte. A ideia foi tentar persuadir o líder dos EUA a jogar pelos interesses ucranianos no encontro de hoje.
Entretanto, no plano militar, as tropas russas conseguiram avançar no leste da Ucrânia. O Estado-Maior do exército ucraniano declarou, na terça-feira, que estavam a decorrer combates intensos em Kutcheriv Iar, a nordeste de Pokrovsk. De acordo com o DeepState, num só dia, a Rússia avançou cerca de 10 quilómetros para norte.







