Todos os anos, os Óscares, organizados pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, celebram a excelência daquela que é considerada a sétima arte. E, as nomeações para esta 97.ª edição, reveladas há duas semanas, refletem bem a diversidade e a criatividade que têm marcado o panorama cinematográfico.
O filme com mais nomeações
Emilia Pérez, de Jacques Audiard, lidera o grupo. O filme francês, em língua espanhola, conta com 13 nomeações, incluindo de Melhor Filme, Melhor Realizador, Melhor Atriz e Melhor Filme Internacional – um recorde nos Óscares de um filme de língua não inglesa. Na sua estreia – no festival de Cannes –, a longa-metragem ganhou duas Palmas (Melhor Atriz e Prémio do Júri). Já nos Globos de Ouro, ganhou o prémio de Melhor Filme (Comédia, Musical).
Emilia Pérez segue a história de Rita, uma advogada ao serviço de uma grande empresa mais propensa a inocentar criminosos do que a servir a justiça, que recebe a tarefa de ajudar um líder fugitivo de um cartel mexicano a se submeter a uma cirurgia de redesignação sexual para escapar das autoridades e afirmar o seu género. O filme, que é protagonizado pela atriz trans espanhola Karla Sofía Gascón, traz Zoë Saldaña como uma advogada que se envolve nos negócios da protagonista, e Selena Gomez na pele da esposa do traficante. Alguns críticos defendem que a obra «funde audaciosamente a ópera pop, o thriller de narcotráfico e o drama de afirmação de género».
Recorde-se que a protagonista, Karla Sofia Gascón, também fez história, tornando-se a primeira artista assumidamente transgénero nomeada para o prémio.
Escreve a Euronews que, até hoje, apenas três pessoas assumidamente transgénero tinham sido nomeadas para qualquer categoria nos Óscares: o músico Anohni, a compositora Angela Morley e o documentarista Yance Ford.
O filme Ainda Estou Aqui, junta-se ao clube de onze filmes nomeados para Melhor Filme e Melhor Filme Internacional no mesmo ano (ver págs. 16-17). Seguem-se O Brutalista e Wicked com dez nomeações cada.
Revisitar o passado em 3 horas e meia
O Brutalista, de Brady Corbet, que tem recebido muitos elogios e que já conquistou vários prémios – foi o Melhor Filme Dramático nos Globos de Ouro e também deu ao realizador o globo de Melhor Realização, com o protagonista Adrien Brody a vencer o prémio de Melhor Ator na categoria de drama – conta a história fictícia de um arquiteto judeu que sobrevive ao Holocausto e procura uma nova vida nos EUA no pós-guerra. Antes dos Globos de Ouro, Brady Corbet já havia vencido o Leão de Prata na categoria de Melhor Realização. O filme demorou mais de sete anos a ser feito, tem a duração de três horas e meia e inclui um intervalo de 15 minutos integrado no próprio filme.
A produção esteve envolta numa polémica depois do seu editor, Dávid Jancsó, ter referido numa entrevista que utilizou ferramentas da Respeecher – um software que usa inteligência artificial – para retocar o diálogo em húngaro de Adrien Brody e Felicity Jones. Ou seja, apesar dos atores terem treinado a pronúncia, as falas foram retocadas digitalmente para sua melhoria. Rapidamente se levantaram várias críticas, tanto nas redes sociais, como na imprensa. A pergunta que colocam é: se vários atores de outras produções se esforçam para aprender línguas e aperfeiçoarem sotaques para as personagens, esta ajuda de inteligência artificial não retira o mérito às prestações em questão?
Além disso, sabe-se que também foi utilizada IA para criar alguns edifícios e maquetes que surgem numa sequência perto do fim do filme.
Em resposta, num comunicado, o cineasta garantiu que «não houve qualquer uso de imagens geradas por este tipo de ferramenta» e que se tratam de «fotografias concebidas intencionalmente para parecerem imagens digitais rudimentares da época dos anos 80». «’O Brutalista’ é um filme sobre a complexidade humana e todos os aspetos da sua criação foram feitos com esforço humano, criatividade e colaboração. Estamos muito orgulhosos da nossa equipa», enfatizou Brady Corbet.
Tal como acima referido, o musical Wicked também é um dos favoritos dos Óscares. A prequela do filme de 1939 Feiticeiro de Oz é a história por contar das bruxas de Oz: Cynthia Erivo como Elphaba, uma jovem incompreendida por causa da sua incomum pele verde que ainda não descobriu o seu verdadeiro poder; e Ariana Grande como Glinda, uma jovem popular, dotada pelo privilégio e pela ambição, que ainda não descobriu o seu verdadeiro coração. Segundo a sinopse, as duas encontram-se como estudantes na Universidade de Shiz, na fantástica Terra de Oz, e envolvem-se numa improvável mas profunda amizade. Depois de um encontro com O Maravilhoso Feiticeiro de Oz, a relação entre as duas chega a uma encruzilhada obrigando-as a seguir caminhos bem diferentes.
Bob Dylan e o Vaticano
A Complete Unknown – história do início da carreira de Bob Dylan – segue com oito nomeações, as mesmas que Conclave.
O primeiro, que foi realizado por James Mangold, tem Timothée Chalamet como protagonista e conta também com as participações de Edward Norton, Elle Fanning e Monica Barbaro. O próprio cantor já falou sobre a obra na rede social X, antigo Twitter. «Há um filme sobre mim que vai estrear em breve, intitulado ‘A Complete Unknown’ (que título!). Timothée Chalamet desempenha o papel principal. Timmy’ é um ator brilhante e por isso tenho a certeza que vai ser muito credível a representar-me. Ou a representar um eu mais jovem. Ou outro eu qualquer. O filme pegou na obra de Elijah Wald’s ‘Dylan Goes Electric’ – um livro editado em 2015. É um fantástico recontar dos eventos que, no início dos anos 60, levaram ao fiasco em Newport. Depois de verem o filme leiam o livro», sugeriu.
Já a longa-metragem Conclave, que tem a assinatura de Edward Berger – responsável por A Oeste Nada de Novo, que, há dois anos, ganhou quatro prémios da Academia, incluindo Melhor Filme Internacional – revela o processo de escolha de um novo Papa com o ator Ralph Fiennes como protagonista. «O Papa morreu e tem de ser encontrado um novo líder. Cabe ao cardeal Thomas Lawrence a responsabilidade de organizar o conclave e supervisionar o processo de seleção dos candidatos o mais tranquilamente possível. Com 118 cardeais de vários países ali reunidos, totalmente isolados durante 72 horas para que possam decidir em quem votar, Lawrence apercebe-se de que tudo aquilo faz parte de uma conspiração que ameaça os princípios basilares da Igreja Católica», revela a sinopse.
Body Horror nos Óscares
A estes segue-se o vencedor da Palma de Ouro do ano passado, Anora, com seis indicações, e Dune: Parte 2 e A Substância com cinco nomeações cada. A realizadora deste último, Coralie Fargeat, é a única mulher nomeada na categoria de Melhor Realizador.
Recorde-se que este foi um dos filmes mais falados do ano passado pelas cenas gráficas. Muitas pessoas relataram terem saído da sala de cinema por não aguentarem ver algumas cenas. Demi Moore interpreta Elisabeth, uma estrela em decadência que usa uma substância ilegal para obter uma versão jovem de si mesma, a partir de um processo de replicação de células. A versão jovem de Moore, Sue, é interpretada por Margaret Qualley e as duas devem coexistir para sobreviverem, mas tudo tem um preço. Entre os géneros de thriller, body horror e ficção científica, ganhou o prémio de melhor argumento no festival de Cannes.
Este ano, Portugal ficou de fora do concurso. Percebes, das realizadoras portuguesas Alexandra Ramires e Laura Gonçalves, ficou de fora das nomeações, na categoria de Melhor Curta-Metragem de Animação. O filme tinha sido incluído, em dezembro, na lista de finalistas no processo de seleção dos nomeados, mas acabou por não chegar às nomeações.