O Prado Branco e o Atirador Selvagem

O Prado Branco e o Atirador Selvagem


Mergulho na história do Borussia deDortmund, o terrível adversário do Sporting de terça-feira


Ballspielverein Borussia 09 e. V. Dortmund, de nome completo. Um clube que teve um nascimento turbulento. Próximo adversário do Sporting na Liga dos Campeões, já terça-feira, em Alvalade, adversário poderoso que ainda na última época chegou à final da Liga dos Campeões.

O grupo fundador
Recuemos até 1909, claro!, está bem expresso na primeira linha, 2009 seria de menos. Um grupo de 40 rapazes que pertenciam à Catholic Trinity Parish, uma paróquia que se purificava através dos velhos ritos romanos, reuniu-se precisamente às sete da manhã do dia 19 de Dezembro na cervejaria Zum Wildschütz (numa tradução livre, Para o Caçador Selvagem), na Oesterholzstraße, nº 60, irmanados pela frustração de terem sido proibidos de praticar futebol pelo padre Hubert Dewald, o responsável pelo desporto naquela instituição. Recordemos as palavras do porta-voz da maralha e logo a seguir eleito para vice-presidente do clube que acabava de nascer, Franz Jakobi: «Desde 1902 que pertenço ao grupo jovem da Trinity e desde 1906 jogamos futebol no Weiße Wiese (Prado Branco). Desde 1906 o nosso esforço tem sido teimosamente boicotado e temos sistematicamente combatido essa decisão da nossa igreja. Não podemos continuar a aceitar esta tirania. O padre Dewald mostrou-se pessoalmente contra a nossa iniciativa de hoje. Em vão! Foi preciso usar a força física para o impedir de estar aqui agora com o seu grupo de capangas, mas a intervenção deles empurrou para fora desta reunião cerca de vinte dos nossos companheiros rebeldes. Mesmo assim estamos aqui 18 autênticos desportistas para fundar o Borussia».

Origem do nome e crescimento
Borussia é a versão latina de Prússia. O nome veio da Cervejeira Borussia situada na Steiger-Straße. Se o emblema já nasceu amarelo e preto, abrindo portas para os Die Schwarzgelben (os Pretos e Amarelos), o equipamento usado até 1913 tinha cores bem diferentes: riscas brancas, azuis e vermelhas. A alma democrática do clube fez com que houvessem contínuas reuniões na Zum Wildschütz. Tão democrática que, nas reuniões das quintas-feiras, os capitães da equipa escolhiam os onzes para os jogos de domingo, sendo que o quadro de diretores tinha o direito de se pronunciar em caso de desacordo. E assim foi correndo a vida do recém-nascido Borussia…
O Westfalenstadion (erguido em 1976) é, hoje, o maior da Alemanha, com capacidade para mais de 80 mil espectadores. E o Borussia o segundo clube mais titulado do país a seguir ao Bayern de Munique: oito títulos de campeão alemão, cinco vezes vencedor da Taça da Alemanha, seis supertaças que por lá não se sujam calções com Taças da Liga. Junte-se uma Taça dasTaças (1966) e uma Liga dos Campeões (1997), mais duas presenças da final da Liga dos Campeões (2013 e 2024) e outras duas na Taça UEFA/Liga Europa (1993 e 2002).

Anos de guerras
Foi preciso, no entanto esperar por tantos triunfos. O primeiro deles foi o de ter sobrevivido à grande crise de 1929 quando, numa tentativa de impor o profissionalismo, se gastaram milhões de marcos que deixaram o clube à beira da bancarrota. Na senha de se manter nas várias ligas superiores do futebol alemão (um emaranhado complexo mutante que seria fastidioso elencar em tão poucas linhas), os dirigentes não olharam a meios e saíram frustrados. Ao mesmo tempo que o regime nazi implantava a Gauliga, durante o período conhecido por Gleichschaltung (Sincronização), uma prova dividida por dezasseis divisões (!!!), Dortmund, cidade e clube, sofriam pelo facto de a zona ter uma grande fatia da população judia. A direção manteve-se ferozmente anti-Hitler ao ponto de muitos que dela faziam parte terem sido autenticamente corridos de lá para fora e perseguidos nas suas vidas particulares. Mas a moeda tinha duas faces e havia grupos de canalhas nas bancadas prontos a cantar enquanto os jogadores corriam na sua frente: «Arranjem um comboio directo de Gelsenkirchen a Aushwitz», visando o maior rival, o Shalke, e a comunidade semita. Ainda assim, o Borussia aguentou-se. A onda de pessimismo acabou por ser afastada. Em 1937, ano em que os pretos e amarelos se mudaram para o campo de Rote Erde (Terra Vermelha), a sua participação na Tschammer-Pokal, antecessora da Taça da Alemanha, foi capaz de entusiasmar toda a gente: eliminando o Hamburgo (3-1) e o Werder Bremen, em Bremen (4-3), atingiu os quartos-de-final sendo afastado pelo Waldhof Mannheim num jogo histórico (3-4). Havia apenas dois anos da competição e o vencedor desse troféu tinha a mesma honra e glória do que o campeão. Evidentemente que ambos os termos foram banidos a partir de 1945: tanto Gauliga como Tschammer, este referindo-se ao Reichssportführer (Chefe de Desportos do Reich), um cavalo com 124 patas chamado precisamente Hans von Tschammer und Osten, tão medíocre que acabou por ser triturado pela máquina do seu próprio partido.
Seria preciso esperar ainda. Mais dez anos até ao primeiro disco dourado que coroa os campeões da Alemanha – 1956. Já o Sporting tinha vivido a sua fase dourada dos Cinco Violinos. A guerra tem custos elevados demais…