Novelas turcas. O novo fascínio dos portugueses

Novelas turcas. O novo fascínio dos portugueses


As novelas e séries turcas têm conquistado cada vez mais portugueses. Além disso, os canais também têm apostado em adaptações. Mas afinal, o que é que estas produções têm de tão especial? Porque é que são tão viciantes?


As adaptações de guiões estrangeiros para fazer novelas ou séries portuguesas não são recentes. Há vários anos que os argumentistas nacionais utilizam guiões brasileiros, espanhóis, mexicanos ou venezuelanos. Mas agora, parece ser a vez da Turquia brilhar. As novelas turcas estão a tornar-se num fenómeno em todo o mundo. Segundo dados da Parrot Analytics, empresa de análise do mercado televisivo, a Turquia é o terceiro país que mais exporta a sua ficção, apenas atrás dos EUA e do Reino Unido. E, em Portugal, já existe um grupo de Facebook com mais de 55 mil membros onde fãs das produções trocam algumas ideias, opiniões e sugestões. Além disso, existem também encontros de aficionadas por este tipo de novelas ou séries.

Love is in the Air na STAR Life; Querida Filha e Pobre Menino Rico na SIC; Pássaro Sonhador e Quarto 309 na AXN White; Amor Viciado na SIC Caras e Redemption, The Light of Hope e Secrets of an Angel na SIC Mulher. Estas são apenas algumas das produções que passaram e passam na televisão nacional.

Novelas ‘sem pressa’

«A Turquia criou um formato bastante interessante, uma fórmula melodramática que tem captado muita a atenção», conta ao Nascer do SOL a escritora e argumentista portuguesa, Patrícia Müller. «É uma coisa até relativamente transversal às novelas e séries deles: grandes dramas melodramáticos identificáveis, cenas familiares muito intensas, por exemplo, e muitas vezes têm pouca consideração com a verossimilhança», continua, explicando que, às vezes, não é preciso nos identificarmos com as histórias em si, «basta identificarmo-nos com os conceitos ou a forma como eles mostram as coisas».

«Uma filha vendida para casamento ou, na série ‘Alfaiate’, que tem como protagonista um rapaz que o pai é deficiente, ou o ‘Sonho de Mulher’, uma rapariga que tem que lutar pelos seus filhos… Há assim coisas que são muito óbvias, muito claras… Não há nenhuma razão muito ulterior ali. E funciona», assegura.

Ao contrário das produções portuguesas, de acordo com a argumentista, os turcos têm, por norma, 40 episódios de duas horas por novela. «Significa que são 80 episódios para nós. E eles fazem ganchos a meio. No fundo, é cortar. São novelas mais lentas, com mais cenas, mais exploradas», detalha. Interrogada sobre o motivo pelo qual muitas vezes essas novelas ou séries estão dobradas em espanhol e não em português, Patrícia Müller não consegue responder: «Se calhar é por ficar mais barato do que traduzir», reflete.

A escritora considera ainda que «há bastantes hipóteses deste tipo de forma de contar as coisas singrar, porque são coisas muito intensas, muito humanas, muito repetitivas». «É uma coisa que já não fazíamos há alguns anos…. Recuperar as novelas de 1980 numa abordagem mais moderna. Funciona super bem», garante.

Além disso, na sua opinião, «há aqui uma imagem de marca muito forte deles que não têm medo de ser cancelados». «Tudo entra e funciona», acrescenta, fazendo referência a uma cena no Alfaiate, onde o «mauzão» tinha a noiva enfiada dentro de um baú. «Eles são arrojados na forma como abordam as coisas. Trabalham muito a minúcia, o pormenor. Isso é muito bom», reforça.

Contenção nas cenas íntimas

Maria Antónia tem 83 anos e, neste momento, assiste a quatro séries turcas «ao mesmo tempo». Gulperi, Queen of Flow, Secret Of an Angel, Love for Rent e Never Let Go, todas na SIC Mulher. Começa às 16h30 e, só saí de frente da televisão já perto da meia noite. «Apaixonei-me pelas novelas turcas há sensivelmente um ano e meio. Antes via as novelas da TVI, mas já estava farta de serem sempre as mesmas histórias e os mesmos atores», conta ao Nascer do SOL. Neste momento, o interesse é tão grande que não sai de casa para poder ver os episódios todos, «sobretudo quando há suspense». «Não me ajeito bem com o comando da televisão e, por isso, não consigo meter para trás se falhar algum dia», lamenta.

Apaixonou-se pelos atores turcos que, segundo a mesma, são «encantadores e extremamente profissionais». «As histórias parecem tão reais. Eles falam com os olhos. Têm um olhar muito expressivo. Gosto da contenção dos amantes, do facto de não existirem cenas mais ousadas, ao contrário do que acontece, cada vez mais, nas produções portuguesas», explica. O que menos gosta é «do drama excessivo». «Põe-me doente. Farto-me de chorar e não consigo dormir com o desgosto quando morre alguma personagem que gosto», admite. «Na internet mostram a cara dos artistas e o que vai acontecer no episódio seguinte. Vejo muita gente a comentar que os argumentistas estão sempre a matar as personagens. Por isso, não sou a única a viver as novelas intensamente. Uma pessoa chora tanto», conta.

Uma forma cativante de contar histórias

Maria Ferreira tem 54 anos e, no ano passado, estava a assistir a um programa qualquer na SIC, quando começou a dar a série Querida Filha. «Já acabou e já vou noutra série que o canal começou depois: ‘Pobre Menino Rico’», conta ao Nascer do SOL, garantindo que se acompanha com «muita facilidade» e que os atores são «muito bons».

O que mais chama à atenção, na sua opinião, é «a forma cativante como os turcos contam as histórias». «Todas as personagens têm um enredo e uma história por trás. Não se focam só na personagem principal. As histórias veem-se com facilidade, sem se enrolarem muito», explica, acrescentando que tudo parece «mais real». «É difícil explicar. Não dizem asneiras, por exemplo», aponta. Segundo Maria, «também é preciso dizer que são todos muito bonitos». «Das crianças aos mais velhos. São todos muito profissionais, parece tudo muito real», frisa.

A beleza dos atores

Já Daniela, de 31 anos, começou há pouco tempo a acompanhar a série Love is in the Air. «Devo dizer que não vai ser a última, de certeza», assegura. Começou por ver vários excertos no Instagram e foi isso que a chamou mais à atenção. «Até andei a procurar em que plataformas podia assistir, mas na altura não consegui e decidi dar oportunidade quando soube que ia passar em Portugal, na Star Life», revela. «A história é o típico cliché. O menino rico e a menina pobre que se apaixonam. Só que no meio deste amor, todos os amigos e famílias deles parecem ter saído de um filme de comédia. Além da história de amor que prende (para quem gosta, claro), é impossível passar um episódio sem muitas gargalhadas», detalha.

A jovem não encontra grandes diferenças entre estas produções e as portuguesas. «Como disse, esta é a minha primeira série turca, talvez não tenha uma grande ‘amostra’ para poder comparar», admite. No entanto, tal como Maria, nota que a «educação» é diferente. Além de não dizerem palavrões, «não dão qualquer destaque a cenas íntimas e, mesmo os beijos na boca, são muito difíceis de acontecer. Mas acho que enrolam demasiado para chegar a uma cena onde se chegaria bem mais rápido», afirma.

Também a beleza dos atores a surpreende. «É incrível a beleza deste povo! Isso é de destacar. Ou são escolhidos a dedo ou os turcos são mesmo muito bonitos! Homens, mulheres e crianças. Em relação ao trabalho, acho que há sempre uma química incrível entre todos e parece mesmo que estamos a assistir a uma história real», garante.

Maria revela que a novela é dobrada em português. «Normalmente prefiro o original, mas assim permite-me ir fazendo outras coisas e ir ouvindo sem ter que estar a ler legendas», afirma. Já Daniela, tem a «sorte» da série ser em turco com legendas em português. «Já sei dizer duas ou três palavras e faz com que esteja mais atenta porque, como não percebo a língua, não posso perder o fio à meada», admite.

Uma lufada de ar fresco

«Vi recentemente duas séries turcas: Uma Nova Mulher e O Segredo do Templo, que estão disponíveis na Netflix», conta, por sua vez, Bárbara Gonçalves. «O que senti foi que ambas me tocaram numa parte mais sensível – numa altura em que o zapping é propício a ver armas, crimes, tiros disparados, sangue, sofrimento. Ver essas séries foi de facto uma lufada de ar fresco», revela.

«Talvez pela presença feminina com a sua característica sensibilidade, fugindo da violência habitual da televisão dos dias de hoje. Foram as duas um conforto e leveza de fim de dia», frisa a jovem de 30 anos. «Uma delas mais misteriosa do que outra, mas cativantes pela personalidade de cada ator e pela história envolvente: uma sobre o poder da cura através da perceção dos traumas familiares, antecedentes; outra pelo mistério simbólico e histórico que me deixou encantada do princípio ao fim», descreve, acrescentando que, desde então, ficou curiosa e tentada a pesquisar por mais séries turcas.

Além das novelas e séries originais, em Portugal temos ainda assistido a algumas adaptações. Na SIC, por exemplo, a novela A Promessa, que conquistou o público em junho de 2024 e que, segundo o canal, tem superado audiências, é uma adaptação de um folhetim turco, chamado Zalim İstanbul.