Há uns bons anos, a economia familiar de milhões de famílias portuguesas assentava muito nos ‘fiados’. A mercearia do bairro tinha um livro por baixo do balcão onde o merceeiro ia anotando as dívidas dos clientes que eram pagas no final do mês. No mesmo prédio, e com recursos semelhantes, os vizinhos ajudavam-se uns aos outros e era natural alguém bater à porta do lado a pedir algum produto que tivesse em falta. O mais curioso é que algumas das famílias chegavam ao meio do mês e já não tinham um tostão, enquanto outros, com as mesmas despesas e as mesmas receitas, aguentavam-se estoicamente o mês todo. A razão era simples: não gastavam mais do que tinham e ainda conseguiam acudir aos vizinhos mais ‘gastadores’.
Anos depois, os ‘fiados’ da mercearia foram substituídos pelos cartões de crédito e pelas ‘contas ordenado’ dos bancos, que adiantavam um salário – só que estes novos fiadores cobravam e cobram juros à séria. Vem esta conversa a propósito da eleição de Donald trump, que fez abanar por completo a Europa. Independentemente das suas alarvidades – querer conquistar territórios, como se fosse Putin, ou correr com imigrantes com algemas e correntes nos pés –, Trump tem a vantagem de dizer à Europa que os ‘fiados’ acabaram e que se querem proteção, seja no campo militar ou na Saúde, por exemplo, têm de abrir os cordões à bolsa e viverem do que ganham. Por isso, penso que a vitória de Trump foi o melhor que aconteceu ao velho continente, obrigando-o a descer à terra e a saber ‘safar-se’ sozinho.
Durante anos, a Europa andou a brincar às questões de género, às portas abertas para todos, ao desinvestimento na sua indústria, à cultura da subsidiodependência e por aí fora. Quando Trump diz que a Europa tem de gastar mais dinheiro em Defesa, ninguém é obrigado a fazê-lo. Mas, em caso de guerra com a Rússia – não creio que a China queira entrar pela via militar na Europa –, como irá o velho continente, com uma população envelhecida e cheia de tiques parvos, defender-se? O mesmo se passa com a economia, pois, infelizmente, os europeus foram ficando para trás e o raio das tarifas só vem pôr a nu as nossas fragilidades. Tivesse a Europa uma economia pujante e queria ver se Trump cantava de galo, apesar de muitos acharem que as fanfarronices do Presidente americano vão ser prejudiciais para os Estados Unidos. Mas isso é outra história e a nós o que nos deve preocupar é o futuro do modo de vida europeu. Onde a liberdade deve ser uma realidade, as democracias consolidadas e ninguém ser ‘obrigado’ a pensar que uma burka é o mesmo que uma minissaia.